Há anos, escrevi um artigo intitulado “Ou o Rio acaba com a favela ou a favela
acaba com o Rio”. Ou seja, transformar a favela, dar-lhe dignidade, cidadania. Não creio que a situação tenha melhorado muito desde aqueles
tempos.
O artigo propugnava a invasão paulatina das maiores favelas.
O objetivo: expulsar ou, se necessário for, eliminar a bandidagem lá inserida.
Em seguida, instalar-se-ia a tropa para
garantir a liberdade dos habitantes e impedir o retorno dos criminosos. Mas
grande erro seria se a intervenção
cessasse com a ocupação. Até esta primeira etapa, o Secretário Beltrame
tem sido exemplar. Porém, bem mais terá que ser feito para co-optar o morador recém
libertado e tornar perene a tranqüilidade da comunidade resgatada.
Torna-se essencial entender o ambiente do morador de favela
conflagrada pelo banditismo. Além da opressão que sofrem, há que se compreender
que são muitos os moradores que se beneficiam com o fluxo de dinheiro gerado
pelo comércio da droga. Não apenas os
jovens “aviões”, mas também os adultos
prestadores de serviços e pequenos empresários, além dos “soldados” recrutados
lucram. Esta realidade microeconômica tem que ser substituída por vantagens
diferentes e superiores, para que a comunidade, ao perder certos benefícios ganhem outros como a proteção da lei, a
eliminação da violência que também fere os moradores, seus filhos, suas jovens
mulheres. Ganham também o direito do livre ir e vir bem como o desenvolvimento econômico,
facilitado por um comercio mais amplo, interativo, com o resto da cidade.
Em complemento aos benefícios acima, a construção de postos
de saúde, escolas e aprimoramento da coleta de lixo são providências essenciais
à fixação de cidadania no ambiente UPP. Uma
campanha de conscientização de higiene e comportamento deve seguir-se à ação militar. Sem uma clara visão
dos benefícios do novo formato de comunidade, tanto mais difícil será a adesão
dos seus moradores. Vias de acesso para viaturas, desde autos até carros
blindados, deveriam ser abertas, de
forma a permitir a chegada de socorro ou reforços em tempo hábil. No campo da
comunicação o Disque Denuncia deve merecer a mais completa confidencialidade
(colocada em dúvida na Rocinha) e confiança.
Concomitantemente, para o sucesso das UPPs, parece relevante o
aperfeiçoamento da Polícia Militar. O
tíbio comando, a falta de disciplina, treinamento, e a prepotência e desrespeito para com a
população, por vezes observado, dificulta ou impossibilita a harmonia
essencial entre os fatores que sustentam
o modelo.
Ainda, a corrupção que
contamina uma parte dos policiais, quebra o elo de confiança entre o cidadão e
a autoridade militar. Aí cessa a colaboração do favelado com a policia, aumentando
exponencialmente a dificuldade no cumprimento de sua missão. Esta minoria de
maus soldados não só prejudica, mas traz perigo mortal para os colegas de farda
no enfrentamento armado. O policial
corrupto na zona da UPP é, em última
análise, cúmplice do bandido, levando o perigo de morte a seus colegas.
Até que a desonestidade disseminada seja extirpada da
corporação, somente um sistema de intensa rotatividade da tropa poderá quebrar
os “acertos” que se criam durante a liberação da favela. Este revezamento
deveria incluir tropa do Exército e Fuzileiros Navais, de forma aleatória e
inesperada. Ainda, a responsabilzação
administrativa por desvios de conduta ou
crimes da tropa deve pesar sobre os ombros dos oficias em comando direto. Tal atribuição
seria forte estímulo para que os escalões intermediários e superiores tomem medidas corretivas imediatas. Unidades
com desempenho insuficiente devem ser retiradas do programa, atribuindo-lhes
missões de “castigo” e de menor importância. Finalmente, a tropa alocada à
missão UPP deverá receber “nota” de eficiência e comportamento, recebendo bônus
correspondente, alem do seu soldo regulamentar.
Difícil é ignorar que o
nível de contestação às UPP vem aumentando , seja por genuína decepção,
seja por mais eficaz reação do tráfico.
Hoje, o subcomandante de uma UPP
foi morto. Muitos outros soldados foram assassinados. À PM não falta coragem; a
corporação precisa ser oxigenada por novas idéias e protegida por severa
disciplina militar.
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