domingo, 8 de janeiro de 2017

Guerra nas sombras

U.S. officials declined to say whether the intercepted communications were cited in the classified version of the report commissioned by Obama, and they emphasized that although the messages were seen as strong indicators of Moscow’s intent and clear preference for Trump, they were not regarded as conclusive evidence of Russian intelligence agencies’ efforts to achieve that outcome.

The Washington Post, 6 de janeiro, 2017

But the report also attributed Russia’s efforts to Putin’s hostility toward Clinton, a former senator and secretary of state whom he blamed for inciting mass protests against his government in 2011 and 2012.

The Washington Post, 7 de janeiro, 2017

industrial espionage - concept

A Guerra Fria II bat son plein, chega ao climax. Enfurecido, o governo Obama eleva o tom e temperatura contra a espionagem cibernética russa, responsável, segundo seus arautos, pela derrota de Hillary Clinton nas últimas eleições. Esquecem a traição do diretor do FBI¹ e preferem aguçar o clima de nacionalidade ultrajada.

A conclusão do estamento “Intelligence” norte americano lastreia-se na indisfarçável alegria provocada em circulos importantes em Moscou com a vitória de Donald Trump. Ora, tal reação não poderia ser outra, haja vista a animosidade, em nível formal e pessoal, que ainda hoje rege as relações entre Hillary Clinton e Wladimr Putin. Para Moscou, a vitória democratica colocaria as relações entre os dois países próximas ao confronto, portanto contraria aos seus interesses.

Porém, haverá “smoking gun”, a prova irrefutável da ação dos orgão de espionagem russos, ou trata-se se avaliações e probabilidades? Não parece haver o primeiro, ainda que, sem dúvida, ações deste teor tenham sido empreendidas. Assim como iniciativas da inteligência norte americanas regularmente ocorrem quando das eleições realizadas na Rússia em apoio ao candidato contrario à Putin, conforme atesta a publicação Stratfor, especializada na matéria.

O contencioso que ora se observa nada mais é do que parte da guerra surda que se trava nos bastidores entre as super potencias. São vários os campos de batalha, dentre eles

  • a divulgação de notícias contaminadas atavés da midia pública,
  • a coleta de informação sócio-política-militar, em território adversário
  • a propagação da desinformação
  • a formulação de opções estratégicas
  • a mensuração das necessidades orçamentárias
  • a ação militar atraves de prepostos
Porém um fato preponderante diferencia os dois adversários; os Estados Unidos detêm o poderio suficiente para esmagar a Rússia, enquanto esta não domina os meios para vencer os Estados Unidos. Esta diferença fundamental confere a cada um dos adversários nucleares diferente responsabilidade; ao mais poderoso cabe a iniciativa pacificadora.

Conforme já comentado neste blog e alhures, a probabilidade de Moscou agir militarmente contra Washington é remota, sómente ocorrendo caso sinta ameaçada a integridade da nação Rússa. A relação de forças lhe impede a iniciativa. Já, as provocações em torno da “otanização”² da Georgia e da Ucrânia ja demonstraram os limites e perigos desta opção politico-militar. Se para Washington a cooptação destes países nada acrescentaria à segurança de seu território, para a Rússia o adversário em suas fronteiras torna-se questão de vida ou morte.

Justamente para evitar-se a criação de situações pro-bélicas nas fronteiras das nações, criou-se o conceito do “estado tampão”, onde a sua neutralidade elimina as tensões geo-políticas.

Presumir que Moscou, conforme continuamente sucitado pela imprensa ocidental, ameace a integridade da Europa em geral e dos Estados Bálticos em particular não encontra justificativa política nem militar. Contudo, e já observado, a qualquer ameaça percebida, o Kremlin inicia operações militares de cunho diversionista com o fito de confundir os planos adversários que ameacem o território russo.

Segundo Thomas Barnett, em seu livro “The Pentagon Maps”³, o renomado estrategista enfatiza o desafio que ora confronta o Ocidente em geral e os Estados Unidos em particular. Em sua cartografia identifica os páises inclusos no interesse comum da globalização como solidários e, portanto, não representando ameaça bélica. Esta se concentra no que denomina os países “não incluidos” ou não conectados na onda globalizante, onde prepondera a ameaça terrorista. A seu ver, aí reside a nova e premente ameaça, conclusão que parece refletir tanto conhecimento como, também, indispensável bom senso.

O que Washington parece desprezar é a natural convergência estratégica que une os Estados Unidos à Rússia: o combate ao terrorismo. Levando-se em conta o fato de ter uma pleiade de paises vizinhos de confissão muçulmana fácil será estimar-se a resultante independência de regiões islamitas e a expansão do terrorismo sobre uma Rússia enfraquecida. Uma vez contaminada, as portas da Europa estariam abertas. Um entendimento entre Washington e o Kremlin daria ao combate ao terrorismo nova eficácia, como demonstrou a derrota da Al Qaeda na batalha de Alepo.

Ainda, uma Rússia neutra constitue peça de enorme valor no xadrez que ora disputam Washington e Peking, jogo este que promete estender-se no tempo e na intensidade.

Contudo, no momento prevalece a estratégia do “Big One” 4, ou seja o esforço militar norte americano se concentra na probabilidade da Grande Guerra contra a grande potência, a Rússia. Tal opção redunda, essencialmente, do fosso cultural que separa as duas potências. Contrariamente à détente iniciada entre Alemanha e Rússia, interrompida pelo embroglio ucraniano 5, onde a compreensão cultural reduz as áreas de desconfiança, tal não ocorre com o colosso americano. Este enfrenta conhecida dificuldade em compreender culturas alheias, fruto do auto centrismo educacional, das distâncias geográficas e do acumulo de poder onde a imposiçao torna-se mais fácil do que a compreensão.

Como nota de rodapé, porém de relevância, prudente será avaliar o peso dos interesses do complexo industrial militar norte americano em estreita sintonia com o alto comando militar. Ambos relutam atribuir à guerra contra o terrorismo a primazia, onde os embates assimétricos favorecem estruturas mais leves e ágeis e de menor custo. A prevalecer a estratégia atual manter-se-a, não apenas a corrida armamentista mas, também, a existência do “grande inimigo” onde a Rússia desponta. De tanto fustigá-la, a profecia poderá tornar-se autorealizável para prejuizo da humanidade.


  1. James Comey e os e-mails de Hillary Clinton
  2. General Breedlove, ex-comandante militar da OTAN, Foreign Affairs, August 2016 edition
  3. G P Putnam and Sons, NY Copyright 2004
  4. Big One” - Ver The Pentagon Map
  5. Enérgica participação do State Department e da CIA na deposição do então presidente.


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