Em recente artigo no Washington Post, importante articulista norte americano defende a retomada de relações
diplomáticas construtivas com Moscou.
Parece uma voz no deserto, uma vez que
os Estados Unidos estão mergulhados numa febre anti rússa. Há
pouco, na primeira página do New York Times, dentre dez matérias
oito tratavam de Rússia. E não em termos cordiais. Ainda, o ódio
dedicado por Hillary Clinton a Vladimir Putin (segundo algumas fontes
seria decorrência de uma longa espera que lhe foi imposta pelo
presidente quando em Moscou) já evidente no governo Obama, e o
revide do russo com claro apoio à Donald Trump quando das eleições
americanas serviram para emudecer o diálogo entre as duas
superpotências. Silêncio perigoso e contrário à paz mundial.
O casus electoralis tornou-se
viral e bipartidário. A “descoberta” da intervenção eleitoral moscovita, causada por 13 indivíduos russos e doze milhões de dólares, parece anêmica quando comparado aos milhares de ativistas locais e os bilhões de dólares despejados por ambos os partidos durante a liça. Assim, a denuncia de Mr Mueller, investigador contratado pelo Congresso norte-americano, confere um duvidoso poder
aos estrangeiros. De qualquer forma, havendo conspiração, esta revelou-se totalmente incompetente: afinal os russos fracassaram pois Hillary Clinton foi a grande vencedora no voto popular.(¹)
O Congresso
norte-americano, no altar da honestidade ultrajada, prefere esquecer que os Estados Unidos
interferem contínua e ostensivamente nas eleições soviéticas-russa através a
Radio Free Europe, há décadas. Ainda, seus serviços de
inteligência certamente participam em missão semelhante, como fizeram
quando da eleição e durante o governo de Boris Yeltsin. (²)
Na realidade, os Estados Unidos não aceitam uma Rússia autônoma, face ao arsenal nuclear que detêm e a influência que sua configuração geo-política lhe confere. Ainda, manter viva a ameaça de inimigo de grande grandeza, como dizia Robert Gates, Secretário de Defesa de Bush II e Obama, é um reflexo inescapável do crescente estamento militar industrial norte-americano(³). Fácil entender-se como tal viés contaminaria o corpo político da nação. Como reflexo desta visão, o general Philip Breedlove, anterior comandante da OTAN, em artigo publicado advogava o cerco da Rússia pela aliança Ocidental.
Assim, tem-se a repetição de uma Guerra Fria de segunda categoria, sem que nenhuma
das condições que alimentavam a original prevaleçam.(4) Conforme recente
declaração do presidente russo, o enfraquecimento da Rússia após
o colapso Soviético é abissal. A Rússia perdeu 23.8% do seu território,
48,5% de sua população, 41% do seu PIB e 44,6% de sua força
militar. Presumir-se que, com esta amputação do poderio nacional, a
Rússia persistiria em retomar a aventura expansionista não encontra lógica.
Reforça, isso sim,
a avaliação de que tal é a fraqueza da Rússia que qualquer ato
que ameace sua integridade seja respondido com extrema violência. Nesta violência reside sua única defesa. O fustigamento que provém da OTAN tem sido, após análise isenta, o
maior fator de desestabilização na região chegando a casus belli.
À Rússia lhe
falta o poderio expansionista mas seu ferrão é poderoso. Sua
retaliação, tornar-se-ia catastrófica. Por outro lado, o passado recente valida a percepção que Moscou não apenas aceita, mas necessita a retomada
dos fluxos comerciais e de investimentos que já ocorria em crescente
ritmo antes da tentativa de “Otanização” da Georgia e da
Ucrânia.
Quanto à posição
russa no conflito Sírio esta parece ser o corolário da estratégica defensiva russa no leste do Mediterrâneo. Bashar al Assad
assegura à Moscou a base naval de Tartus. Conquanto a frota russa la fundeada esteja longe de ameaçar as esquadras americanas e europeias, sua
presença próxima à entrada dos Dardanelos tem objetivo defensivo,
não ofensivo. Lhe assegura o essencial aviso prévio de movimento
hostil em direção ao vital Mar Negro.
Tendo-se o quadro geopolítico mais
amplo em mente, haveria interesse para Estados Unidos repensarem suas relações com a Rússia. Contudo, boas relações não implicam em subserviência.
Washington, graças à suas vitórias na Segunda Guerra Mundial,
habituou-se à aquiescência de seus parceiros no campo Ocidental. Washington parece esquecer que a experiência histórica da Rússia é, militarmente vitoriosa, sobre o Nazismo e outros inimigos. Portanto, seu "ethos" é isento de gratidões e submissões, pelo contrário, é orgulhoso. Em certo sentido, lembra os Estados Unidos, construído em cima de conquistas sequenciais, até atingir sua maturidade.
Assim, para prosperar, impõe-se um diálogo paritário, de respeito mútuo. Estaria na
hora de fazê-lo face ao grande desafio que traz a meteórica ascensão da
China, dona de imenso poderio militar, demográfico, econômico e
tecnológico.
Diante do Dragão.
a Águia precisará do Urso.
(1) manipular a Colégio Eleitoral estaria fora de suas possibilidades.
(2) vide o colapso econômico da Rússia e o apoio de Bill Clinton).
(3) alerta proferido pelo Presidente Dwight Eisenhower em seu discurso de despedida.
(4) ambos países são capitalistas.
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