sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Fidel Castro

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Morre o líder cubano. Para compreender Fidel Castro é forçoso compreender as circunstâncias que predominavam quando empreendeu sua notável aventura. Tempos que começaram quando ainda existia uma pletora de ditadores sanguinários numa América Central e Caribe, onde o leit motif era a subserviência das ditaduras aos Estados Unidos. Para manter seu poder, estes tiranos não hesitavam em matar e torturar. Triste é a memória de Batista, Trujillo, Somoza e outros chefetes, todos implacáveis e gratos pelo poder recebido de Washington.

Este cenário, lido hoje, parece texto de propaganda anti-americana, saíidos dos subterrâneos da Guerra Fria; contudo, um estudo mais aprofundado dirá que esta é uma descrição imparcial e objetiva da realidade política que imperava naquele rincão do planeta.

Ao brasileiro, filho cultural de uma nação continental, historicamente soberana, resguardada pelas suas dimensões física e demográfica, difícil será compreender o sentimento constrito e restrito da realidade política imposta à juventude cubana, contida no estreito corredor centro americano e nas ilhas caribenhas. Dentre estes jovens estava Fidel Castro.

Talvez justo será avaliar sua trajetória dividindo-a em três partes: a cubana, a latino americana e a internacional.


A dimensão cubana.

Nos anos '50, Cuba estava plenamente inserida neste contexto neo-colonial. O embaixador norte americano preservava sua condiçao de arbiter maximus, recebendo em seu gabinete os principais contenciosos e dele despachando suas decisões. O fato de Cuba somente ter obtido sua efetiva independência em 1940 (e não quando da derrota da Espanha), graças à revogação do Platt Agreement(1), mediante o qual os Estados Unidos reservava para si o direito de intervir política e militarmente em Cuba (2), este não veio alterar a realidade de poder, onde Washington mantinha seu poder de decisão e veto.

Em contrapartida os Estados Unidos absorviam toda a produção de açúcar da ilha a preços especialmente favoráveis e injetavam importantes capitais na industria açucareira e no turismo.

Fidel, não diferente dos demais estudantes de sua época, era ferrenho opositor da ditadura de Batista, esta incapaz de melhorar as condições da grande maioria da população, cúmplice na prostituição da política e dos costumes na capital . O diferenciava sua notável energia e disposição à ação, não se intimidando com o alto risco de seus projetos. O assalto ao quartel de Moncada o designava como líder nato. Anos depois, desembarca no oriente da ilha e embrenha-se na Serra Maestra. Em 1 de janeiro, 1959 derrota o exército de Batista e assume o poder.

Seguiu-se a etapa da vingança tão ao gosto de culturas hispânicas, quando os “esbirros” de Batistas foram levados ao “paredon”. A seguir iniciou-se o processo de ajuste econômico aos moldes crescentemente socializantes. Dá-se o grande êxodo da classe média cubana em direção à Miami, espoliada pelas determinações leoninas de um estado cada vez mais totalitário e anti-capitalista. Enfrenta o repudio e o resultante cerco econômico norte-americano. Inicia-se o embargo.

Recorrendo à força Washington determina e dá à CIA a missão de executar a invasão da Praia dos Porcos, onde o contingente de exilados cubanos são facilmente derrotados pelas forças de Fidel. Longe de estimular uma concomitante rebelião na ilha, sua retaguarda permaneceu defendida por uma população que surpreendeu pela fidelidade.

Reforma e populariza a estrutura educacional e da saúde. Estatiza a economia e a produção agrícola. Torna Cuba comunista. Em 2014 Cuba se coloca no 5 lugar no IDH na America Latina, significativamente acima dos gigantes Brasil e México. Contudo suprime as liberdades, tanto políticas quanto econômicas, manietando o cidadão com as algemas de uma unanimidade imposta.

Morto Fidel Castro, não será ele esquecido pelos cubanos, nem seus inimigos nem seus seguidores. Manteve a independência do país apesar de enormes desafios, inclusive contra sua vida. Para um jovem nascido em 1926, numa Cuba ainda sob o manto colonial norte-americano deu um enorme passo na efetivação da independência da ilha caribenha, assegurando seu nome na história da nação.


A dimensão Latino Americana

Em sua política para a América Latina, Fidel Castro revelou a incontinência de seu egocentrismo. Ignorando as idiossincrasias do continente Latino Americano, as diferenças culturais e sociais naqueles países. Pecou por uma generalização fundada no desconhecimento geo-político da região.

Vencedor, pensou poder alastrar sua rebelião por entre países com características históricas, políticas, sócio-econômicas muito distintas das de Cuba. À sua mensagem revolucionária opôs-se uma classe média poderosa na qual as forças armadas se inseriam.

Ainda assim, a mensagem esquerdista criou raízes nas grandes nações sul-americanas; Goulart no Brasil, Allende no Chile, Illia na Argentina, os Tupamaros no Uruguay emergiram ou fortaleceram-se. Foram, porém, prontamente neutralizados, seguindo-se ditaduras militares de variada intensidade, cabendo ao Brasil a mais tênue delas. Todas com o apoio de Washington. Dentre elas, a mais emblemática e desastrada, foi a aventura mal sucedida de Che Guevara na Bolívia.

Terminada esta fase, iniciou-se, décadas depois, já não mais sob influência direta cubana, nova etapa de radicalização ideológica, onde sob a preponderância de Chávez seguiram-se países como a Argentina, o Equador, Bolívia e Nicarágua e, por pouco, o próprio Brasil.

Na América Latina a imagem de Fidel Castro, execrada nas elites, tem fervoroso apoio na juventude estudantil. Nem a passagem do tempo nem a perene penúria das classes desfavorecidas permitiram que seu nome fosse esquecido. Seu símbolo ainda é capaz de influir no universo político das Américas.

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Dimensão Internacional

Fidel se projetou muito além das fronteiras Caribenhas. Inicialmente levou sua pequena ilha à uma independência que nunca dantes teve. Ao escolher o socialismo radical não soube evitar a punição dos Estados Unidos. Porém soube evitar o fim que coube o chileno Allende em sua malfadada tentativa.

Sua relutância a curvar-se às determinações de Washington deram início a uma sequência de retaliações comerciais, econômicas, jurídicas e, por fim militares. Sobreveio, então o embargo norte-americano que, indiretamente, tolhia as opções comerciais com os demais países.

Este contencioso, ao cortar os meios de sobrevivência econômica de Cuba, levou-a à opção comunista e a aliança com a União Soviética. Por momentos, Cuba tornou-se a mais valiosa peça no xadrez disputado com Washington. Moscou, ao colocar seus mísseis em Cuba pôde barganhar a retirada dos misseis norte-americanos na Turquia, posicionamento que lhe ameaçava diretamente. Ainda, como preço pela retirada de seus mísseis, Nikita Krushev impôs à John Kennedy o compromisso de não intervir militarmente na ilha caribenha.

Do ângulo econômico, o relacionamento com a União Soviética desatou as amarras que continham a sobrevivência cubana, sobressaindo o fornecimento de petróleo russo em troca de açúcar cubano. Já nos anos '90, a derrubada do império Soviético e o estancamento da ajuda à Cuba trouxe novas e relevantes dificuldades ao governo Castro até a superveniência do governo venezuelano e o fornecimento favorecido de petróleo.

Já, quanto a sua imagem internacional, Fidel despontou sobre dois ângulos distintos mas intrelaçados. Esta, pelo imaginário que prevaleceu, superou, abafou e quase anulou a outra imagem que precedeu às demais, aquela de um líder cruel e absolutista.

A eliminação da miséria, a implantação da educação universal, e o provimento de saúde a todos os níveis sociais, ainda que contidos dentro de um quadro de pobreza endêmica, capturou a imaginação da elite intelectual e da juventude nos mais distantes rincões do planeta.

Ainda, Fidel vestido em frágil armadura quixotesca enfrentando o colossal adversário, gerou solidariedade em todos que observaram, ao longo da história, as muitas ações impositivas e, por vezes mal pensadas que emanaram de Washington.

Digno de nota foi a incursão do exército cubano em Angola, em torno de 1975, onde seus efetivos chegaram a 25.000 soldados equipados com armas modernas de proveniência soviética. Em apoio ao governo de Luanda, as forças cubanas contiveram a ofensiva CIA-Sul Africana (3) chegando esta às portas da capital para em seguida derrotarem-nas em contra ofensiva. Tal feito d'armas deu à Fidel e seu exército a pátina de heroísmo que ainda persiste em muitas mentes.

No ocaso de seu governo Fidel Castro ainda mereceu solidariedade de governos e respeito, quando não admiração, dos mais diversos quadrantes. Contudo não conseguiu apagar, em muitos meios relevantes, o grande ódio criado pelo sangue friamente derramado ao despertar da revolução de 26 de Julho e o autoritarismo implacável que se seguiu.

1) Concedia ainda, ad perpetuum, a base naval de Guantânamo
2) Exercido em 1906
3) Cuban Intervention in Angola


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