domingo, 27 de novembro de 2016

Donald Trump e Wladimir Putin

Resultado de imagem para fotos trump e putin

São inúmeras as variáveis que desafiam o presidente eleito Donald Trump. Prevalecerá a lei da inércia? Talvez mais do mesmo, com variações? Porém, o novo presidente terá por prioridade redefinir quais as políticas necessárias para com a Rússia e a China. Tal se impõe uma vez que nestes dois contenciosos residem as ameaças à segurança dos Estados Unidos.

É provável que os aliados continuarão os mesmos. Já os “inimigos” talvez sim, talvez não. China, Rússia, em que posição estarão no tabuleiro da geo política? E porque seriam inimigos?

Anteriormente, a Rússia post soviética mantinha relações cordiais e construtivas, tanto com os Estados Unidos quanto com a Europa. Diversos acordos comerciais permitiram o abastecimento de petróleo russo para as nações europeias. Estas relações, no entanto, foram gradativamente esgarçadas na medida que Washington determinava a expansão da OTAN a aproximar-se das fronteiras russas. Foram diversas e infrutíferas as negociações para a contenção de tal envolvimento uma vez que Moscou sentia-se cercada por uma aliança que originara para proteger o continente da ameaça Soviética. O desmantelamento da OTAN, prometido por James Baker, seria a contrapartida do, há muito extinto, Pacto de Varsóvia.

Seguiu-se, em 2008, a tentativa de cooptação da Georgia para ingresso na OTAN pelo governo Bush, assim comprovando as preocupações russas. Como reflexo a estímulos norte-americanos no aparelhamento do exército da ex república soviética banhada pelo Mar Negro, decidiu o presidente Miguel Saakashvili atacar a república de Ossetia, apesar da força de paz formada por soldados georgianos e russos. Constatando o iminente perigo à república de Ossetia, Moscou reagiu, derrotando prontamente o exército da Georgia.

Quando da instauração do governo Obama em 2009, em implícito reconhecimento da desastrada empreitada georgiana, estimulada pelo governo Bush, o novo presidente instruiu Hillary Clinton a restabelecer boas relações com Moscou (1).

Em 2014, o Departamento de Estado sob Hillary Clinton, enviou a Under Secretary of State, Vitória Nuland a Kiev, capital da Ucrânia (2), já no auge dos distúrbios, para colocar-se em sintonia com o movimento pro UE que resultaria no golpe de estado que deporia o presidente recém eleito Viktor Ianukovitch. Este, apesar de inicicialmente apoiar a integração com a União Européia, retrocedeu, ao considerar a proposta do Kremlin mais apropriada para fazer face às dificuldades financeiras do país. Deposto Ianukovitch, sem que houvesse quorum parlamentar para tal, assumiu a presidência Petro Poroshenko, alinhado aos interesses de Washington. Seguindo o roteiro, o novo governo anunciou pretender integrar-se à OTAN e proibir o uso da língua russa, até então a segunda língua oficial do país. Cessara, assim, de existir o “estado tampão” ou um “filtro” entre dois blocos militarizados.

Face ao que considerou perigo real à segurança da nação russa, esta incorporou a Crimeia, outrora sua província, mediante plebiscito, e apoiou, com armas e “voluntários”, o movimento separatista no leste da Ucrânia.

O impasse resultou no Protocolo de Minsk, assinado em 2014 pela Rússia, Ucrânia, pelas repúblicas separatistas do Leste (Donbass) e pela OSCE (3). O tratado foi aprovado pelos Estados Unidos e Alemanha. Determina a cessação das hostilidades e acorda-se concessão de limitada autonomia para a região rebelde de Donbass. Até o momento Kiev tem sido incapaz de cumprir sua parte, ainda que os combates tenham cessado. Apesar de Washington exercer indiscutível influência sobre o governo da Ucrânia, este tem se recusado a atender os termos do tratado (4).

Mapa de Rússia


Uma análise perfunctória dos elementos pertinentes parece validar a tese de que a Rússia não abriga pretensões expansionistas (5). Não possui o poderio para tal. Contrariamente à outrora União Soviética, a Rússia não mais tem o poder militar para fazê-lo. Demonstrou só militarmente quando provocada, retaliando de forma a garantir sua segurança.

Hoje a Rússia se encontra em módulo defensivo, ameaçada pela expansão da OTAN à Oeste e pelo leviatã demográfico chinês à Leste. Sua atuação na Síria se insere neste quadro tendo o duplo objetivo de garantir sua base naval no Mediterrâneo e como diversão de energias militares contrarias.

Os Estados Unidos devem avaliar a conveniência de cooptar a Rússia uma vez que esta tem a conformação de um “swing state” geo-político. O bloco que receber a Rússia terá ganhos substanciais. Por outro lado, uma Rússia neutra concentrada na sua prosperidade econômica traria consigo uma forte queda de tensões internacionais. Por outro lado, se acuada por política agressiva sua inclinação para China trará perigos até hoje insuspeitos para a paz mundial.

Retirada a ameaça à Rússia não será difícil restabelecer um dialogo construtivo com Moscou ainda que uma aliança parece fora e questão. Contudo, os interesses comuns são consideráveis;
  • A presença de uma Rússia amiga ao norte da China oferece consideráveis vantagens estratégicas aos Estados Unidos
  • Aos Estados Unidos não interessaria movimentos chineses na direção da Sibéria
  • A Rússia é natural aliada no combate ao terrorismo, sendo ela vulnerável, interna e externamente, às consideráveis populações islâmicas ao seu redor.
  • A Rússia pode suprir a Europa de suas necessidades de petróleo bem como de outras matérias primas
  • A Rússia oferece um generoso mercado de consumo para produtos europeus e norte-americanos
  • Oferece, ainda, extensa e variável oportunidades de investimento visto a imensidão de seu território.
Inversamente, o alto risco de ter tanto Moscou como Pequim como potenciais inimigos, podendo ultrapassar os limites da mera desavença politico-comercial, deve ser cuidadosamente pesado. Tanto um quanto o outro possuem devastador arsenal nuclear e a capacidade de colocá-lo no alvo desejado. Ambos tem moderníssima capacidade digital e cibernética, exércitos altamente treinados, armamento moderno ainda que inferior ao norte-americano. Ambos tem um longa história de conflito em suas próprias terras; seus povos aguerridos e resilientes. Não são inimigos quaisquer.

A persistir o atual cenário, identificada a Rússia como principal adversário, cumpre examinar-se as opções defensivas que restam à Moscou. À qualquer ação em suas fronteiras tida por atentatória à sua segurança deve-se esperar robusto contra-ataque, ainda que localizado. Tal reação poderá resultar em incontrolável escalada de sucessivas retaliações.

Hoje Rússia e China compartilham diversos programas de interesse mútuo, tanto a área comercial, científica, como na militar. Contudo não são politicamente aliadas, cada qual seguindo seus interesses de forma autônoma. Qual a probabilidade de virem a Rússia e a China aliarem-se contra o inimigo comum? Este cenário traria de volta uma guerra fria em proporções gigantescas, certamente indesejado pelo Ocidente.

Em caso extremo, possível porém improvável, qual a consequência de vir a China ter preferência no acesso preferencial à maior produção de petróleo do mundo, e às mais variadas matérias-primas que a Sibéria oferece? Qual seria a vulnerabilidade da Europa caso as divisões russas mesclassem-se com as hordas chinesas?

Partindo da hipótese que a China, com seu inigualável peso específico, habitado por bilhão e meio de cidadãos, dono de enorme e crescente poder comercial e militar, não abandonará sua opção de expansão comercial e extrativa de matérias primas (o que não ocorre com a Rússia) e não conterá a expansão de seu poder militar garantidor de tal expansão.

O tratado comercial ASEAN, instituído por Pequim como resposta ao Trans Pacific Partnership TPP norte-americano, vem recebendo crescente adesão de países banhados pelo Pacífico, apesar da oposição ativa dos Estados Unidos. Tal tendência deverá acentuar-se caso a TPP seja desativada por Donald Trump.

Estas condições estão prenhas de crescente tensão que poderá tornar provável o curso de colisão entre as duas maiores economias do planeta. Ainda que não signifique conflito armado, a consequência de tal fricção será um ambiente internacional sujeito à latente volatilidade. Aliados, Russia e China tornar-se-iam um pesadelo para Washington.

Já, a cooptação da Rússia pelo Ocidente é factível, graças à sua extrema vulnerabilidade geográfica e demográfica, desde que dentro de um quadro de respeito mútuo e inviolabilidade de suas fronteiras. O primeiro, e talvez o único passo necessário para atingir-se este objetivo será o de manter a OTAN afastada das fronteiras russas assim como não caberia à Rússia estabelecer bases nas Américas (6)

Cumpre aos Estados Unidos repensar quais das duas hipóteses é mais favorável. Ter a Rússia por inimiga ou encontrar o caminho de convergência?




(1) Reset with Russia, em 2009. Restabelecimento de boas relações.
(2) “On the 11th December, when we had US Assistant Secretary of State Victoria Nuland and EU diplomat Catherine Ashton in Kiev, during the night they stormed the Maidan.” (entrevista concedida pelo presidente Petro Poroshenko sobre a rebelião)
(3) OSCE Organization for Security and Cooperation in Europe.
(4) O parlamento ucraniano revogou, unilateralmente, medidas contempladas pelo Protocolo.
(5)Vide no Blog do Pedro da Cunha, coluna intitulada “Hillary, Putin e as eleições” de 11 de setembro de 2016
(6) Vide reação às bases Soviéticas em Cuba.

Nenhum comentário: