Deve ter sido na calada da noite quando o Político se encontrou com o Jurista. Tão solerte traição, por eles engendrada, não mereceria a luz do Sol.
Conscientes de que o
impeachment da Presidente era inevitável , buscariam os dois homens
públicos alguma maneira que lhes permitisse atenuar as suas
consequências? O Senador, conhecedor da vulnerabilidade penal de
seus correligionários e de sua própria e o Ministro, movido pela
sua lealdade ao ex-presidente e à Presidente Rousseff, teriam
engendrado a manobra?
Perdida a questão do
impeachment, dar-se-ia sustentação legal à votação em separado
da perda dos direitos políticos. O Jurista legitimaria o
fatiamento, enquanto o Político garantiria os votos para a vitória.
Assim teria sido feito,
e ao fazê-lo revelou-se a magnitude da malicia do ato. Ao permitir,
na prática, a divisão de uma só lei, a do Impeachment, em duas o
Jurista de forma imprópria e monocrática, atropelou o que
determina a Constituição. Ou seja, dividir o que era uno. Assim
decidiu, levado por impulso de interesse próprio, senão material,
certamente de cunho pessoal e ideológico. Despiu-se da reflexão
proba e imparcial.
Criou, assim, uma
proto-anistia. Apoiada no precedente criado e no principio de
isonomia, abriu-se a porta aos políticos já cassados e por cassar
para o retorno à vida pública, liberados que estariam da punição
anteriormente imposta. Surge uma nova realidade, com relevante
impacto no equilíbrio de forças no quadro político do país.
Mas, nem só de malicia
prosperou a fraude legal. Contribuiu o inescapável sentimento
nacional, o do coitadinho. Sim, afinal já destituída do
cargo, que maldade, pensariam alguns, impedi-la de ser, sequer, uma
doce professora de escola pública! E assim teriam votado, dentre
eles o Senador Christovam Buarque cuja evidente probidade o teria
afastado da trama. Talvez, por não fazerem parte do núcleo
conspiratório, viram-se, estes senadores, surpreendidos pela
escolha, esqueceram-se dos desdobramentos nocivos.
Esqueceram,
talvez, que amanhã, Da. Dilma, e outros, cassados e indesejáveis,
poderão, de pronto, assumir cargos estaduais que lhes ofereçam
blindagem legal, o “pique” para estrepolias futuras.
O episódio revelou,
ainda, a disfunção política que decorre da indisciplina partidária.
Distancia ela a capacidade de um partido político adotar e executar
sua plataforma; por sua vez, tal inabilidade se reflete na tibieza
das alianças partidárias, todas ao sabor dos interesses divergentes
de seus quadros. Mais de dez senadores comandados, nada mais nada
menos, pelo presidente da casa trilharam caminho oposto àquele
determinado por Michel Temer, líder do partido.
E até que ponto esta liderança, de fato, desconhecia a trama? Teria sido a garantia de impeachment, e portanto sua ascensão à presidência, a moeda de troca oferecida para a leniência partidária no voto do fatiamento?
Para o restabelecimento
do que poderia ser chamado de segurança jurídica espera-se do
Supremo Tribunal Federal o julgamento urgente dos recursos impetrados
quanto à constitucionalidade de tão aberrante iniciativa aprovada
pelo Senado.
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