Seguindo uma política de valorização deste Blog, publicamos, a seguir, importante mensagem do cientista Joaquim Francisco de Carvalho
A Terra é um raro (talvez único) objeto existente no cosmos, que abriga milhões de organismos vivos, que interferem significativamente nos fluxos superficiais de matéria e energia e promovem uma regulação fina da delgada camada (a biosfera) que há cerca de 540 milhões de anos se mantém em condições climáticas relativamente estáveis, que sustentam a vida.
Entretanto, já há algumas décadas, ficou claro que o clima mundial está mudando rapidamente, na direção de um aquecimento
global.
Segundo o Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em 2015, as concentrações atmosféricas de
gases de efeito estufa alcançaram o nível mais elevado dos últimos 800 mil
anos. A temperatura média na superfície da Terra e sobre os oceanos aumentou
0,85ºC entre 1880 e 2012.
Com um aquecimento dessa rapidez, a
humanidade tem pouco tempo para evitar que o aumento global da temperatura
ultrapasse o limite de 2ºC, como ficou acertado na COP-21, em Paris, em
dezembro passado, mesmo que este já
seja um limite arriscado para
estancar-se o aquecimento global.
Diante da gravidade desses problemas,
torna-se urgente planejar e pôr em prática medidas destinadas a limitar os
impactos das atividades humanas sobre a biosfera.
O primeiro obstáculo para pôr em prática
as medidas sugeridas na COP-21 está na própria ambição universal inerente à
condição humana, de maximizar a utilidade presente, ou seja, a voracidade do homem por ganhos imediatos. De fato, em última análise,
as mudanças climáticas são provocadas pela exploração e uso de combustíveis
fósseis que, por serem lucrativos em curto prazo, são mais empregados, embora agravem
o efeito estufa.
Outro grande obstáculo é de caráter
cultural, resultante dos muitos milhares de anos em que a humanidade vem
subjugando a natureza, à procura de fontes de energia que lhe tragam mais
conforto material.
As primeiras
civilizações só apareceram de fato com a cultura irrigada de cereais, há cerca
de 6.000 anos, na Mesopotâmia, tendo como fonte de energia a força muscular,
complementada pela energia cinética dos cursos de água, além da tração animal e
da lenha. O fogo já era usado, de forma controlada.
Na
Ucrânia, há mais de 4.000 anos, o emprego de cavalos para tração e montaria
viabilizou o transporte de alimentos e madeira de regiões distantes, permitindo
que a lenha pudesse ser usada como fonte regular de energia para olarias e
fundições primordiais, acarretando profundas transformações econômicas e
sociais, que – durante a Idade do Cobre – estenderam-se na direção da Europa
Ocidental.
Depois,
ao longo dos séculos ,
a madeira (lenha) foi sendo complementada por outras fontes
de energia , tais
como os ventos
(barcos a vela, moinhos de vento, etc.), o óleo de baleia ,
a turfa etc.
A silvicultura como atividade econômica
p1anejada teve suas bases científicas formuladas e desenvolvidas na Alemanha,
nos séculos dezoito e dezenove.
Toda a tecnologia industrial alemã do século
dezoito baseava-se na madeira, a começar pelos processos de mineração e refino
de metais, que dependiam de troncos, para suporte das galerias, e de carvão
vegetal, para a redução dos minérios e geração de calor.
Na Inglaterra, no século
XVIII, as florestas estavam sendo
devastadas pela extração
de lenha e madeiras, especialmente para a construção de navios
para a armada.
Na medida em que ficavam mais problemáticas, as velhas
fontes iam sendo complementadas – ou, em alguns casos, substituídas – por novas
fontes, mais eficientes, ou mais lucrativas. Assim, a força muscular foi
complementada pela lenha e pela tração animal, que foi complementada pela
energia das águas e dos ventos, etc.
Em seguida veio o carvão, que foi complementado pelo
petróleo, na indústria, nos transportes e nos modernos sistemas
agroindustriais.
Concomitantemente, as matrizes
energéticas iam-se ajustando a essas fontes.
No século XIX, ainda nos primórdios da Primeira Revolução
Industrial, o carvão era abundante
e barato. Por isto, em pouco tempo,
passou à frente da madeira como fonte de energia.
Com isso, as jazidas carboníferas mais acessíveis foram-se esgotando e a exploração passou ao subsolo ,
em poços
e minas frequentemente inundadas, que tornavam
indispensável o bombeamento. Esta
necessidade está na origem da tentativa de empreendedores ingleses e escoceses,
de empregar a máquina
a vapor para o acionamento de bombas em minas de carvão. Posteriormente, a
máquina a vapor foi aperfeiçoada por
James Watt e passou a ser empregada em fábricas, locomotivas, navios, etc. Sem esta máquina, a Primeira Revolução Industrial
não teria tomado o rumo que tomou.
* * *
No século XIX, entre
os anos de 1.830 e 1.840, o emprego da eletricidade
nas comunicações (telégrafo )
e na metalurgia (galvanoplastia )
despertou o interesse dos empresários industriais. Os grandes impulsos vieram em 1.878, quando
Thomas Edison criou a lâmpada incandescente de filamento
e Werner Siemens apresentou a primeira locomotiva elétrica .
* * *
Na virada
dos séculos XIX para XX começava a “idade do petróleo”.
Foi o petróleo que consolidou o
modelo industrial moderno, caracterizado pela produção em massa, com setores
dinâmicos –
como o automobilístico, o naval, o ferroviário, o de máquinas e
equipamentos, etc. – forçando o desenvolvimento tecnológico de
indústrias satélites, ligadas às respectivas linhas de produção.
Além de o petróleo não ser renovável, sua combustão responde pela maior parcela
das emissões de gases de estufa. Isto significa que todo o desenvolvimento subsequente
à Primeira Revolução Industrial tem-se apoiado em bases ambientalmente
deletérias – e fisicamente insustentáveis.
O petróleo
abundante e barato ofereceu as condições básicas
para o vertiginoso desenvolvimento da indústria automobilística, com seus fornecedores
e sub-fornecedores; e uma poderosa estrutura de comercialização, que se estende
por todo o mundo em paralelo à rede de distribuição de combustíveis.
Desde as
primeiras décadas do século passado, a indústria automobilística vem exercendo um
papel de paradigma para a moderna civilização humana. Transformado em suprema
aspiração de posse das famílias, o automóvel condicionou a evolução da
sociedade, consagrando o transporte individual, que influencia fortemente a
ocupação do território, o urbanismo e a arquitetura das cidades modernas e acarreta importantes mudanças no modo de vida
das pessoas.
Por dependerem diretamente do
automóvel, os atuais modelos de ocupação do território e urbanização constituem mesmo a imagem da
“idade do petróleo”.
Entretanto, como foi dito acima, a biosfera vem se aquecendo rapidamente, por força da combustão de petróleo, gás natural e
carvão.
Medidas drásticas, destinadas a limitar o uso desses combustíveis, tornam-se urgentes. Parece muito
difícil que a civilização humana possa reeducar-se, ou
"recivilizar-se" para isto, no escasso tempo disponível para evitar
que a biosfera se torne imprópria para a vida.
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