Os blocos percorrem as cidades, bumbo, trombone e multidão
em coro. Serpenteiam pelas ruas em alegria ébria fazendo crer que a tristeza
foi espantada.
Será? Será ela passageira? Por mais que o bumbo marque o
ritmo e o trombone a melodia uma crescente angustia se infiltra entre os
compassos, entre os passos, entre os traços histriônicos de foliões que abraçam
a realidade fantasiada. A coisa é agora, hora de pular, gritar, hora de agarrar
uma alegria que logo pode fugir.
É o Brasil histriônico, em imensa epidemia alegre, tudo
esquece, tudo troca pelo presente, pelo amor à Baco, tudo abandona o que dele
não faz parte. Amanhã? só daqui a cem
anos. Hoje, hoje, agora, tudo mais vai embora. Xô crise.
E aquele desgarrado, afastado do ethos febril, que ainda
submisso à realidade vê desmoronar o chão que ora serve de palco... A que ritmos e acordes obedecer ao constatar
a epidemia que grassa, trazendo perigos incontáveis, ameaçando vidas nascidas e
por nascer? Ameaçando aquele escolhido pelo implacável acaso um destino de
indizível sofrimento causado pelo Guilliam-Barré. Aquele abandonado por um
Estado falido onde um Ministro da Saúde recorre ao humor para esconder sua
abissal ignorância e incomparável incompetência.
E que marchinha cantará chegando à casa com o pouco dinheiro
que lhe resta, carcomido por uma inflação que lhe tira o justo sustento. E
quais os refrões, senão aqueles repetidos pelos magos que cercam a fada da
“justiça social” que traiu seus seguidores? E aquela estrofe que prometia o emprego
já perdido pelo folião? E o sincopado imposto que teve que subir para que os
apaniguados mantenham seus cargos de
fantasia e seus conselhos enganadores? E que melodiosa modinha lhe compensará pelas fortunas
roubadas, pelas empresas destruídas graças à imensa quadrilha que se apossou da
república?
Melhor seria que este povo, face ao descalabro
nunca antes visto, buscasse no mais difícil dos protestos, sua indignação: greve
de Carnaval.
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