sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Pedido de vista e desvio de finalidade


Esta coluna tem o prazer de publicar matéria de autoria do 
Dr. Juiz de Direito,  Brenno Mascarenhas  que versa sobre 
assunto da maior relevância nestes tempos em que a 
redenção do Brasil depende do imprescindível suporte da Justiça.


Dr. Brenno Mascarenhas












O pedido de vista nos julgamentos de competência dos órgãos jurisdicionais colegiados se justifica se o julgador (juiz, desembargador ou ministro) é acometido de dúvida que possa 
ser sanada com o exame dos autos sem a mediação do relator.

Trata-se de faculdade que decorre da inarredável obrigação do
juiz de julgar com conhecimento de causa.

Bastante comum no cotidiano dos tribunais, a providência é de inegável interesse dos próprios jurisdicionados e da 
sociedade, pois com ela evitam-se injustiças que de outro modo seriam difíceis ou impossíveis de corrigir.

Ainda que muitas vezes fundamental para o bom andamento do processo, o exercício da vista não se dá por prazo 
indeterminado.

No âmbito do STF, de acordo com o art. 134 do seu Regimento Interno, o prazo da vista se estende até a “segunda sessão ordinária subsequente”. Assim, normalmente, desconsideradas 
as situações excepcionais de recesso do Tribunal e de sessões extraordinárias de julgamento, o ministro que exerce o 
direito de vista dos autos deve devolvê-los em até 14 dias 
para prosseguimento da votação.

O dispositivo regimental se alinha aos louváveis objetivos do art. 5º, LXXVIII, da Constituição, que introduziu em nosso 
direito positivo o princípio da “razoável duração do 
processo” e a garantia da “celeridade de sua tramitação”.

No passado, o presidente do STF podia ordenar a restituição 
dos autos em caso de esgotamento do prazo de vista. Mas a 
regra que autorizava a requisição foi revogada, talvez por 
falta de uso durante anos. Pelo regimento atualmente em vigor,
o máximo que se pode fazer é informar ao julgador 
recalcitrante que o prazo de que dispunha para a vista se encerrou.

Várias são as causas que podem levar ao desrespeito ao prazo 
em pauta, entre elas a falta de empenho do magistrado e o 
volume excessivo de trabalho.

O que tem incomodado, entretanto, nada tem a ver com a falta 
de disposição do julgador para o trabalho ou o tamanho do seu estoque de processos.

Refiro-me à sensação generalizada de que o direito à vista vem sendo utilizado para atrasar ou até, no limite, tornar inútil o julgamento pelo perecimento do objeto.

Ora, qualquer movimento no sentido desse desvio de finalidade configura inequívoca afronta ao princípio da moralidade que orienta a atuação dos agentes do Estado e é completamente incompatível com a norma constitucional que exige reputação ilibada do ministro do STF.

Um único e voluntarioso integrante do tribunal, arbitrária e isoladamente, não pode inviabilizar um julgamento em que, 
suponha-se, todos os demais julgadores já tenham se 
manifestado de maneira uniforme sobre determinada matéria.

A utilização política e viciada desse valioso instrumento da 
boa jurisdição colegiada não é e jamais será tolerada pela sociedade.

    Brenno Mascarenhas é juiz de direito aposentado
    e mestre em direito constitucional


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