No ocaso do Estado
Islâmico estruturado, cercado de todos os lados por contingentes
turcos, sírios, iraquianos, com o
apoio aéreo de americanos e
russos, resta aos seguidores de Al Baghdadi dispersarem-se
mundo afora, de preferência na Europa, para levar o terrorismo
avante. Contudo, seria injusto ignorar a contribuição dos
Peshmergas, braço armado do movimento Curdo, na derrota que se
aproxima, de tão cruel inimigo da civilização.
Porém, de forma para
muitos surpreendente, o que será o término de uma guerra poderá
ser o início de outra. Exaltados pela vitória, sob
o comando de Mazoud Barzani, buscam os Curdos iraquianos,
em plebiscito, o primeira etapa para sua
independência. Mas, na realidade, os primeiros passos que ora
desaguam neste novo cenário, foram dados quando da invasão do Iraque
por George W. Bush. Na luta pela derrubada
de Saddam Hussein os Estados Unidos identificaram nos Curdos e nos
Xiitas, ambos vítimas do ditador deposto, seus naturais aliados.
No
passar do tempo, desencantado com o governo Xiita de Bagdá,
obediente “ma non tropo”, também sensível à indesejada
influência Iraniana, Washington preferiu buscar outras peças para
seu xadrez. Ao longo da campanha iraquiana, tanto os
interesses táticos de Washington envolvendo forças Curdas do seu
lado da trincheira, quanto seus objetivos
estratégicos e econômicos convergiam com a autonomia política do
Curdistão. Assim, armou-se o exército curdo, os Peshmerga e,
simultaneamente, ainda que violando as leis do país, companhias
americanas com o beneplácito do Pentágono iniciaram sua exploração
de petróleo (ainda o petróleo) em região
tecnicamente sob a soberania Iraquiana. Desta forma foi criado o
ambiente econômico-militar favorável à
iniciativa separatista através do plebiscito recém realizado. Este
acaba de receber 92% de aprovação.
Em
pronta resposta, o governo em Bagdá determinou a ilegalidade do
plebiscito, bem como a anulação dos efeitos legais que dele
decorreriam. Por resultado tem-se a gênese de um novo enfrentamento.
Apesar do não reconhecimento, a “nação curda” iraquiana poderá
tomar as providência práticas na implementação da decisão
popular. Difícil será a desmontagem da estrutura erguida em sua
capital Arbil sem que haja forte resistência, possivelmente armada.
Nesta ambígua situação ambos os lados estarão procurando apoio dentre os “players” no Oriente Médio. Bagdá terá a solidariedade de Damasco, Ancara e Teerã, onde os governos centrais compartilham sérias preocupações com o separatismo latente de suas regiões Curdas. Face à esta ameaça, e os desdobramentos desestabilizadores que decorreriam do temido movimento separatista, os Estados Unidos vêm-se premidos a apoiar a integridade nacional de seus aliados, o Iraque e a Turquia. Assim, Washington, promotor do imbróglio, retira a proverbial escada, deixando Barzani pendurado no pincel.
Já, o
lado oposto, premido pelo ódio que separa Sunitas e Xiitas, forma
esperada aliança em prol de um independente Curdistão, É ela
composta pelos países Sunitas da região, comandados pela Arábia
Saudita, seguida pelos reinos do Golfo Pérsico, a Jordânia e o
Egito. Porém, surpreendente, é a inclusão de um estado, nem
Xiita nem Sunita, mas sim Judeu, nesta conspiração.
Em
ofensiva deslanchada pela imprensa internacional, com artigos
publicados por seus embaixadores no Globo, no New York Times e
outros, Israel proclama a justas pretensões Curdas. Bem sabe seu
Primeiro Ministro, Benjamim Netanyahu, que a desestruturação da
região a partir deste movimento curdo, atende seus interesses
geopolíticos, uma vez que a desordem endêmica e a fragmentação do
Oriente Médio traduz-se por maior segurança de Israel. Repete Tel
Aviv, neste caso e em escala mais disseminada, a anterior influência
que exerceu sobre George W. Bush quando ofereceu “provas” ao
ingenuo e despreparado presidente americano sobre a existência de
armas de destruição em massa no Iraque. Contudo, como fato irônico,
se não fosse patético, defende um povo que clama por independência
desprezando que, ao seu lado e por ele dominado há sessenta anos,
está o Palestino, que, em situação muito mais cruel, sofre sob
sua implacável espada.
Fica assim armado
novo cenário de potencial conflito,
estimulado por dois estados; um, Israel, profundo conhecedor das
realidades da região, e outro, os Estados
Unidos, impelido por interesses estruturados sobre
uma obscura base de incompreensões.
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