sexta-feira, 22 de setembro de 2017

A República da Rocinha


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Apesar de intervenção corajosa das UPPs de Beltrâme, o que se seguiu foi a falência do programa pela incúria do governo do Rio de Janeiro. As medidas preconizadas de valorização da cidadania de seus habitantes, através da instalação de creches, postos de saúde, escolas e, ainda, mediante o ordenamento da vida civil foram adiadas e, em seguida, esquecidas. Os policiais mal supervisionados por seus oficiais, mal instalados e mal protegidos em terra que ao cair do sol tornava-se hostil, aos poucos se deixaram ir na direção do facilitário, talvez do suborno, e, por vezes, da cumplicidade. O projeto faliu graças ao maior defeito brasileiro, o desprezo pela manutenção, seja de ideias, seja de construções.

Hoje, a Rocinha não faz parte do estado brasileiro. Tornou-se a Republica da Rocinha, a RdR. Seus líderes declararam sua independência. São hábeis; com o Brasil seguem uma relação comercial aberta, uma união aduaneira total. Adotam uma versão própria do espaço Shengen onde sua fronteira com o Brasil é porosa e tolerante. Contudo a minúscula nação decreta seus impostos, sobre o transporte, sobre a energia do gaz, sobre as transações imobiliárias, sobre o comércio, sobre o uso da internet. Impõe suas próprias leis. Seu judiciário é constituído pelo núcleo do poder executivo, onde prevalece a pena de morte, por tortura se necessário for. Sua prefeitura a chamam de Associação. Seu governo obedece a meritocracia, onde o mérito obedece sua própria definição, pautada pelos interesses do comando. É responsável por sua própria segurança, formado por exército eficiente de viés guerrilheiro. À sua fronteira esgotam-se as leis do Brasil.

Porém, a secessão gera uma guerra permanente entre a FADAR (forças armadas da rocinha) e a polícia e o exercito brasileiros. Os últimos combates desta semana vem revelando a maestria dos combatentes da FADAR face às polícias do Estado. Em movimentos dispersos, porém coordenados, tem mantido à distância as pseudo forças de repressão. E isto no meio de uma guerra civil dentro da própria Republica da Rocinha!

Pouco autores teriam a imaginação de construir tamanho cenário do absurdo. Já do lado de cá da fronteira, observa-se, ao longo da semana, uma notável demonstração de descoordenação entre a polícia do Estado do Rio de Janeiro e o Exército Brasileiro. Já, ao findar-se a semana de conflitos, as duas entidades parecem ter chegado ao entendimento. Porém, para não desagradar os oponentes na Rocinha, tiveram o cuidado de revelar, pela televisão, seus planos de ataque. Informam o inimigo, com cortesia admirável, quando e onde vão atacar, identificado data para o cerco e a quantidade de tropa envolvida.

Contudo, quando da vitória, esta será passageira. Ao retirarem-se as ditas forças da ordem tudo voltará ao “que era antes no quartel de Abrantes”. Sem uma ampla reforma social, urbanística e administrativa, que conquiste a confiança e o apoio de seus habitantes, a República da Rocinha perdurará.



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