A
Turquia, ainda que Europeia, é um
poderoso player no Oriente Médio. Do ponto
de vista histórico, demográfico, de sua extensão territorial, e do poder de
seu exercito. Ainda, a antiga sede do Império Otomano, outrora
inimigo, tornou-se importante aliado do Ocidente.
Esta
aliança foi construída, sob liderança dos Estados Unidos, nos idos
da Guerra Fria, tendo em vista a excepcional posição geográfica da
Turquia. Seu domínio dos estreitos do Bósforo e dos Dardanelos lhe
concede-lhe a chave das portas que se abrem sobre o Leste do Mediterrâneo.
Ainda, sua soberania sobre a margem Sul do Mar Negro submete a Rússia à
fragilidade estratégica. Por estas razões a Turquia hoje participa
da OTAN.
Estas
condições dariam a qualquer líder condições excepcionais e
suficientes de poder; porém, para Recep
Erdogan parece não
bastar. Para entender este presidente torna-se necessário
compreender a história moderna daquela nação. A partir da
laicidade imposta por Kemal Ataturk à Turquia, derrotada na primeira
Guerra Mundial, o país despiu-se da
influência religiosa na condução dos negócios de Estado. Seguiu-se quase um Século Ocidentalização e modernização, aproximando
o país dos patamares europeus.
Concedendo-lhe justo crédito,
Erdogan, ao longo de seu extenso mandato validado pelas urnas desde 2003,
promoveu notável melhoria dos fundamentos econômicos do país. Por outro lado, apesar de
revindicar participar da União Européia, não teve sucesso graças à rejeição de uma Europa Cristã ao Islã. Embora Ancara tenha se disposto, para tal, seguir a cartilha exigida por Bruxelas, alterando leis, ajustando-se
ao FMI, não conseguiu seu intuito. Terminou por sofrer sério revés. Viu-se frustrada pela
rejeição implícita, ainda que não formalizada. Perdeu seu projeto
Europeu.
No campo
político, voltou-se, então, para o teatro ao qual foi relegado; o Oriente Médio. Não mais sendo a laicidade elemento impositivo
volta-se o líder Turco para sua natural inclinação pela Islamização.
Rejeitado pela Europa, prepara-se para enfrentar os desafios
impostos pela região em que se insere.
Complementando
este quadro, a participação da Turquia na Organização
do Tratado do Atlântico Norte (OTAN)* torna irretorquível sua intima
relação com o Ocidente no que tange prioridades militares.
Sobretudo, permite-lhe uma proteção incomparável contra qualquer
agressor, ainda que não lhe favoreça iniciativas autônomas.
Contudo, fora desta “bolha” de proteção encontram-se as
organizações terroristas. Hoje, seu
principal objetivo político-militar parece ser a neutralização do
PKK, partido político onde se insere a insurgência Curda. Precaver-se, ainda, das incursões do Estado Islâmico torna-se essencial ainda que observadores vejam, neste assunto, comportamento dúbio.
Já, extra-fronteiras, parece ser o
intuito de Ancara influir na reconstrução de uma Síria pós-Assad. Tal desiderato acentuaria sua influência junto aos demais Estados Árabes. Ainda, sua ligação com a Irmandade Muçulmana, disperso por toda a região, traz a tona novo fator a ser avaliado.
Contudo, o
presidente Turco está longe de conquistar plena estabilidade
interna, essencial à implementação de objetivos externos. Seria imprudente descartar-se a resiliência de forte
corrente anti-governo no exército, tradicionalmente laico. Em
manobras ousadas e bem sucedidas, Erdogan reduziu a influência dos generais, porém as condições que permitiram a recente
tentativa de um golpe de estado, ainda que debelado, revelam relevante corrente de descontentamento no oficialato.
A pergunta
parece pervasiva nas ruas de Istambul e Ancara: a esta insatisfação
somar-se-ia uma presumida cumplicidade do Pentágono? Estaria
Washington preocupada, a ponto de intervir no destino político deste
aliado que se torna, progressivamente, mais desconfortável? Até que
ponto o evidente amálgama politico-teológico constatado em Ancara
poderá romper a confiança do estamento politico-militar
norte-americano? Neste momento e nesta região tudo é possível.
*Apesar
da incogruência geográfica
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