O recém Relatório Chilcot, publicado na Grã Bretanha, na realidade
não trouxe muita novidade. Confirmou aquilo que o público interessado e analistas
possuidores de um grau de objetividade já haviam concluído: a
guerra do Iraq foi um monumental engôdo além de um erro trágico.
Decorreu
um monumental erro. O que se viu foi uma tragédia, não só pelas
mortes e destruição ocorridas mas, tão importante quanto, as
sequelas que até hoje sacodem o mundo, dentre as quais a exponencial
expansão do terrorismo. Às bombas e rajadas que por todo canto
explodem somam-se as maciças ondas de refugiados que alagam uma
Europa intimidada. Aquilo que, aos falcões que dominavam Washington
parecia uma aventura de custo contido e alto beneficio, transformou-se
em incontrolável tempestade cujo enorme custo ainda está por pagar.
Porém, um
dos pontos que mais surpreendeu foi a adesão incondicional da
“imprensa livre” ao projeto bélico, sem que deixasse à
contestação um lugar, à indagação, à dúvida. Numa revivida
experiência do Yellow Journalism na virada do Século XIX
para XX, a imprensa norte americana aliou-se à uma guerra cujo pretexto fora "fabricado" pelo governo
norte americano para expandir seu império às custas da Espanha.
Já, os grandes jornais,como a New York Times e Washington Post abraçaram a guerra contra o Iraque, para depois constatar-se que faltaram-lhe razões
lícitas para iniciá-la.
“Fast
forward” para os dias de hoje. Observamos que algo semelhante
ocorre com relação à Rússia. As declarações oficiais e
oficiosas sobre, seja o país, seja seu presidente Wladimir Putin,
são continuas e negativas. Até mesmo comentários depreciativos, cunho pessoal, alcançam as folhas. Avaliações de experts
e Institutos diversos insistindo sobre as intenções belicosas de
Moscou aparecem na imprensa quase que diariamente. O clima criado por
esta convergência de declarações vem ciando um animus bélico
cujo desdobramento poderá redundar, por incidente inesperado, em
conflito.
A recente
reunião da OTAN, realizada em Varsóvia sob o comando de Barack Obama, concluiu, obedecendo o
roteiro elaborado no Pentágono, pela mobilização de 4000 homens, a
serem estacionados na Polônia, para “fazer frente à ameaça
russa”. Falou-se também em disponibilidade de armamento nuclear
como reforço. Aumenta-se, assim, a temperatura. Cria-se um
quadro de latente e crescente hostilidade, cuja eclosão depende,
cada vez mais, de circunstancias alheias ao contôle.
Contudo,
uma análise objetiva da relação Rússia / Ocidente não prece
validar o clima de hostilidade observado. Inicialmente, vale lembrar
que ao término da União Soviética ocorreu o seu desmembramento.
Por iniciativa de Moscou, a independência foi concedida à uma
dezena de países que até então pertenciam, há séculos, à
Rússia tsarista. Tal iniciativa parece contradizer avaliações ligando a Rússia à uma politica expansionista. Caso tal ânimo
existisse, seria bem mais realista e prático iniciar-se esta
expansão pela reabsorção destas repúblicas anteriormente
descartadas. No entanto, nenhum movimento nesta direção vem sendo
observado.
Por outro
lado, desde o desmonte do Pacto de Varsóvia e a democratização do
Leste Europeu, vem a OTAN arregimentando associados. Desde a Estônia,
a Noroeste da Rússia, progredindo pelo centro da região, onde se
destaca a Polônia, até atingir a Turquia no Leste europeu
completa-se aquilo que a Rússia, não sem alguma razão, reputa ser
um cerco militar.
Contudo,
afim de resguardar a sua segurança vital, Moscou não tolera a
cooptação pela aliança militar Ocidental dos estados tampão que
lhe são vizinhos. Dentre estes estão a Bielo Rússia, a Georgia e a
Ucrânia. Conforme sugere a história da Rússia, parece razoável
antevê-la disposta até mesmo à guerra nuclear para preservar sua
integridade.
Por outro
lado, Moscou entende que qualquer iniciativa sua contra qualquer
nação membro da OTAN redundará em retaliação devastadora dos
Estados Unidos e seus aliados, cujo poder militar excede, por larga
margem, o de qualquer nação. Uma análise, por perfunctória que
seja, rejeita, assim, qualquer aventura Russa em direção à Europa.
No
entanto, apesar de inteiramente cientes da “linha vermelha”
estabelecida pela Rússia quanto a estes “estados tampão”,
Washington não parece conter sua ambição, desprezando as
necessidades tidas como vitais à segurança daquela Nação. O faz a
grande risco, risco este que será acentuado após as eleiçoes
presidenciais nos Estados Unidos. Observando-se o discurso de Donald
Trump e a “tough foreign policy” defendida por Hillary Clinton,
lícito presumir-se o aumento das tensões internacionais.
Espera-se
que, no cenário político que se avizinha, a imprensa mantenha-se
livre e imparcial, e recuse acumpliciar-se às agendas políticas que
tem a guerra como instrumento para a ampliação de poder.
Nenhum comentário:
Postar um comentário