quinta-feira, 30 de junho de 2016

O Silver Lining

Parece difícil encontrar algo de bom nesta tempestade iniciada pela Inglaterra. Sim, Inglaterra, mas não o Reino Unido, pois a Escócia dele se distancia.

Se houvessem dúvidas quanto às consequências politicas e econômicas do Brexit, se os debates intermináveis sobre vantagens e perdas deixassem as respostas em aberto, tal não mais ocorre. A reconquista do espírito de Rule Britannia, aliado às avaliações econômicas incompletas se apossaram dos 16 milhões de Britânicos vitoriosos em seu canhestro projeto. E com ele veio a desilusão confirmada pela reação dos mercados.

Por resultado imediato de tão impensada decisão tivemos a queda precipitosa da Libra , desorganizando a economia, prometendo pressões inflacionarias. As Bolsas seguiram a mesma direção, ignorando fronteiras, afetando o Ocidente. À este debâcle assistem os asiáticos, perguntando-se em que pensariam aqueles dos “olhos redondos”.

A City, esteio e motor propulsor da economia britânica, acordou em pesadelo, vendo, não apenas a precipitosa queda dos ativos mas, também, a imperiosa necessidade de rever a viabilidade das instituições bancárias que lhe da substância. Para onde ir, perguntam-se os banqueiros, em busca de resposta fugidia.

Constatando a queda dos índices fundamentais, as agências de risco apressaram-se a reduzir a nota de risco, antes inexpugnável Agora, a Grã Bretanha perdeu o “Triple A” e começou uma descendente cuja intensidade ainda é desconhecida.

O ouro, sempre à espreita das loucuras humanas, sentiu-se cortejado, adulado e comprado. Montado nas angustias alheias, sobe continuamente, desprezando títulos e ações que perdem favor.

Porém, mesmo assim, existe o “silver lining”, o raio de luz que por vezes surge nos momentos de nuvens escuras. Pois, de dois quadrantes chega a luz:
  1. As agruras que enfrenta a Grã Bretanha servirão de alerta para aqueles países que hoje contemplam deixar a União Européia. Não passarão desapercebidas à Marine Le Pen e aos seus companheiros as dificuldades que acompanharão o abandono.
  2. Que o episodio sirva à União Europeia como potente estímulo para seu aperfeiçoamento, revisão de de sua crescente burocracia e os privilégios que a acompanha, redução de seus altíssimos custos e transparência de seu processo decisório.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Aconteceu


brexit Great Britain EU exit - stock vector

Aconteceu. Contrariando as pesquisas e o bom senso, o Brexit tornou-se realidade. Confirmando seu desprezo pelo Continente, a Inglaterra, arrastando a relutante Escócia, decidiu abandonar a União Européia à própria sorte.

Com base em campanha de terror, desenhou-se futuro tenebroso onde a Ilha afundaria sob o peso de incontida imigração, provocando a perda de identidade daquele povo indômito. Perda, também, de empregos e de vagas em colégios e hospitais, ocupados que seriam pelas hordas invasoras.

Este foi, sucintamente, o cenário oferecido por Boris Johnson, preeminente membro do partido governista e traidor de sua liderança no Parlamento. Como cúmplice destacado, contou com o ultra direitista Nigel Farage do UKIP. No entanto, Londres, o mais relevante exemplo de imigração e de infraestrutura sobrecarregada, votou contra o Exit.

E assim tomam forma os primeiros passos de uma nação que retoma sua distância do Continente. Nação cuja civilização e grandeza vieram de uma Europa, hoje desprezada. Envoltos no Union Jack, seus operosos cidadãos nem sempre conseguem vislumbrar, através das cores fortes de sua bandeira, tudo aquilo que o Continent lhes trouxe.

Parecem esquecer que foram os Romanos que lhe ofereceram o primeiro gosto e uso da civilização. Seguiram-lhes os Anglo Saxões, vindos de suas terras germânicas, com Alfred the Great trazendo ordem ao vácuo deixado pela retirada de Roma. E por fim, os Plantagenets franceses, oferecendo o que, em 1076, poderia ser chamado de modernidade.

Concluirá a história que, hoje, Britânia presta um desserviço a si e ao Ocidente? Talvez. Além dos efeitos de curto prazo que, segundo argutos economistas, trarão cinzas e ranger de dentes aos mercados, mais deletérias seria, a prazo mais longo, o desmonte da União Européia.

Caso previsão tão pessimista prevaleça, impõe-se a lógica das rivalidades nacionalistas, das políticas  de alianças e contra-alianças, da busca de preponderância dentre as nações Europeias.

Se, pelo contrário, vencendo a União Européia este desafio, qual relação terá com a Grã Bretanha, talvez reduzida às fronteiras da Inglaterra, desfalcada  de uma Escócia Européia?

E como reagirá a Bruxelas face à inevitável tentativa de Londres em obter vantagens que atenuem o ônus da tão desejada independência, sabendo que tanto maior a leniência maior será a probabilidade de êxodo de outros membros do clube?

O incontido aplauso de Donalda Trump, refletiria o sentimento do partido Republicano, pronto a receber a desgarrada Albion em seu seio?  Ter-se-ia uma Aliança dos Cinco, exclusiva para os Povos de Língua Inglesa, criando-se novo Polo de Poder?

E, vitoriosa Hillary Clinton, exerceria ela toda a pressão do colosso Americano para levar a Europa, ainda que a contragosto, a conceder status especial à filha pródiga? Ou a traria sob sua ampla asa?

Não são poucas as perguntas. Vejamos o que nos espera.



sexta-feira, 17 de junho de 2016

A vida em jogo

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Súbito, aparecem os defensores da autorização dos jogos de azar em grande escala, escala empresarial. É bem verdade que o jogo clandestino já existe. Também, é verdade que se constata o jogo de loteria e similares, geralmente sob o beneplácito governamental. Porém, compará-los com a liberação legal do jogo é incorreto.

O jogo clandestino, por ser o que é, atrai um numero reduzido de viciados, já acostumados ou impelidos pela emoção se deixam levar pelo lucro episódico e ao prejuízo inevitável. Quanto às loterias, seu jogo não permite a febre da aposta contínua e do repique falimentar.

Resultado de imagem para fotos de casinoJá, os casinos propugnados pelos defensores do jogo, a todos oferecendo o modesto “caça niqueis”, o sofisticado “baccarat”, e a aleatória roleta, tornam-se antros onde o dia se confunde com a noite, onde ricos e pobres se misturam, atraídos pela ânsia do dinheiro fácil, e, na sua grande maioria, punidos, após longas horas, com a perda de economias e do trabalho que as criou. Estabelece-se o ambiente propício ao vicio, que, qual droga, leva à ruína e ao desespero.

Ainda, o soerguimento do jogo institucionalizado cria, pari passu com prejuízo social, um caldo de cultura onde germina a corrupção. Capitais cinzentos, ligados ao jogo marginal e ao tráfico de entorpecentes, hão de se precipitar em busca de sua quota na empreitada, não só rentável pela equação que favorece a “casa”, mas pela singularidade dos dinheiros que lá circulam. Sua específica anonimidade e fungibilidade transmuta-se em incontáveis riachos que alimentam a poça turva do dinheiro lavado, livre de seu pecado original.

Os defensores de tal legalização apelam para o dúbio benefício da oferta de emprego, a atração de turistas, a liberdade de empreender. Ainda, exibem como argumento a existência de casinos nos Estados Unidos, Europa e alhures.

Quanto ao emprego, trata-se de uma gota d'água num mar de desemprego, gota esta que anulará seus benefícios ao criar os custos aumentados pela repressão à mais uma fonte de criminalidade. Quanto à atração de turistas, difícil será vislumbrar-se a vinda de estrangeiros para jogar no Brasil. Se o acaso os trouxer à roleta, será exatamente isto, um acaso. No que se refere ao exemplo estrangeiro convém lembrar que ser estrangeiro não constitui diploma de qualidade. Tais comparações devem submeter-se ao exame das diferenciadas condições sociais e de riqueza, sem o que fica prejudicada uma comparação justa e confiável.

A questão de oportunidade surge forte no trato desta matéria. O país encontra-se num dos mais preocupantes momentos de sua história face à avalanche de corrupção que macula a sociedade brasileira. A legalização do jogo, mesclada à ubíqua lavagem de dinheiro em benefício do crime generalizado que ora ameaça a estabilidade social e política do país, tornará mais árdua a tarefa de corrigir o curso e trazer o criminoso à Justiça.



segunda-feira, 13 de junho de 2016

BREXIT


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UK contra EU?

O respeitado jornal britânico, The Guardian, recém publicou o comentário abaixo:

The campaign has not unfolded as Cameron anticipated when he fired the starting pistol. He didn’t foresee Boris Johnson and Michael Gove leading the Brexiters, he did not reckon with it being so poisonous between Tories and he didn’t think it would be so tough. By the final stretch, he expected to be sitting on a confident lead for In, not locked in a fight so tight that Remain campaigners talk of this being “squeaky bum time”.”

revela quão difícil é prever, a partir de 24 de junho próximo, se o Reino Unido permanecerá na União Europeia.

Não são poucos os comentaristas que veem na saída britânica o início do desmoronamento da União Europeia. Preveem a saída de países do Leste Europeu tais como a Hungria e a Polônia, já às turras com Bruxelas devido ao crescente distanciamento de seus governos dos princípios democráticos exigidos pela União. Fala-se também da saída da Grécia e Espanha, em voltas com suas dificuldades econômicas e substancial desemprego. Até a França é mencionada, com base na ascensão da Euro-fóbica Martine Le Pen.

Possível, mas pouco provável. O entrelaçado político e econômico dos países componentes da Europa é tal que seu desmembramento seria extremamente nocivo às suas economias tendo em visto o livre comercio e a migração intra europeia. Sofreria, também, a voz política das nações menores que hoje lhes permite um diálogo que d'outra forma seria comprometido.

O esgarçamento Europeu, caso concretizadas estas visões pessimistas, traria de volta uma Europa dividida bem como as práticas passadas de alianças competitivas gerando instabilidade econômica, política e, quiçá, militar. Este espectro retrógrado dificilmente será aceito pelos governos da região.

Porém, a Zona do Euro talvez venha a sofrer. O engessamento trazido pela moeda única dos países participantes revela sérios inconvenientes em tempos de crise, especialmente para as nações economicamente frágeis. A perda de instrumentos anti-recessivos, tais como as políticas monetária e cambial, tem adiado, excessivamente, o tempo de recuperação de determinadas economias.

O açodamento da França e Alemanha, pais da União Européia, ao empreender a cooptação acelerada de participantes da Zona do Euro priorizou objetivos políticos, num élan reconhecidamente imprudente. Atropelou-se a conveniência de similaridade de cultura financeira e de consistência econômica; buscou-se criar uma afinada orquestra formada por díspares instrumentistas.

De qualquer forma, nota-se, neste momento, considerável nervosismo nos mercados financeiros. Dentre os melhores analistas políticos e financeiros observa-se convergente opiniões sobre prováveis perdas nas economias regionais.

Seguindo secular hábito, tece Albion os fios que hão de enredar as engrenagens europeias. Desta vez, coube ao Primeiro Ministro britânico, David Cameron, a responsabilidade por engendrar tão imprudente cenário sem atentar para os substanciais prejuízos que seu próprio país poderá sofrer.


N.R. Para outras observações sobre a matéria, ver publicação de 4 de junho p.p. nesta coluna, entitulado “Tiro pela Culatra”



quarta-feira, 8 de junho de 2016

O que está em jogo


Com o Brasil mergulhado em extremo desarranjo administrativo, político, econômico e ético, difícil seria encontrar na calma a atitude preponderante. Muito pelo contrário, vê-se ânimos exaltados à menor menção de assuntos que envolvam a classe política.

Resultado de imagem para fotos de temer e dilmaO Mensalão e a Lava Jato tiraram a rolha que mantinha enclausurado em sua garrafa o Gênio da Realidade. Subitamente, turbinado pela delação premiada, o que era negado, ignorado, suspeitado tornou-se fato inconteste. Vivia-se, não num Brasil a caminho de crescente justiça e prosperidade, mas sim  num lamaçal de dimensões continentais.  

A ação coordenada pela policia Federal, pelos tribunais Federais, com o apoio da mais alta Corte do país, desmascararam a falsa imagem das instituições políticas, revelando a cínica  fisionomia que escondia-se por traz da mascara vestal.

Não surpreende, portanto, a exaltação que persegue todo novo fato, toda nova denuncia, todo novo grampo, fruto da profunda ferida que macula o corpo cívico. À toda nova revelação ergue-se na imprensa, nas conversas, nas reuniões um fervor revolucionário, em busca de uma solução imediata.

Porém, nada parece mais perigoso do que a busca de solução perfeita ao custo da solução possível. Qualquer desvio que se tome fora do curso institucional trará no seu bojo o germe de sua decomposição, de sua decepção. Na busca de uma saída do atoleiro ao qual foi jogado o país pelo governo anterior, chegou-se â primeira etapa do Impeachment. Foi uma vitória, ainda que conquistada por um amálgama de interesses, muitos escusos, por um conjunto  de indivíduos, muitos repelentes. Mas chegou-se, parafraseando Winston Churchill, nem ao começo, nem ao fim, mas ao começo do fim.

Falta, assim,  a segunda parte para completar-se o processo, essencial à reversão do rumo que levava o país ao precipício, o rumo que prometia aos brasileiros o destino dos venezuelanos. Pois bem, para que esta segunda etapa se cumpra, é essencial que o governo Temer se fortaleça. Para que isto seja possível, é imperativo que o presidente em exercício mantenha uma maioria no congresso, ainda que para tal o mecanismo necessário  não tenha a alvura por tantos desejada.

A perder-se a maioria no Congresso, o atual governo enfraquecido enfrentará  uma  possível derrota quando da votação final do impeachment.  Prever-se a consequência não requer maior esforço de imaginação.  A reentronização de Dilma Rousseff no Planalto trará a insistência primária na execução de seu projeto populista, cujo fracasso já se constata.  Vale lembrar-se que  2014 e 2015 foram dois anos onde os objetivos  da presidente foram  derrotados pelas medidas econômicas  que ela própria escolheu para atingi-los. 

Em vez de consumo, trouxe a recessão, em vez de aumento de renda, trouxe a inflação, em vez de moradia para todos, trouxe o desemprego.  Para atingis seus objetivos Bolivarianos queimou etapas,  recorreu a artifícios e manobras cuja eficácia foi negada pela inevitabilidade das leis econômicas.

Sem o apoio da sociedade ao atual governo, por temporário que seja, com suas falhas e erros, o Brasil corre o risco do retorno de tão extravagante e custosa experiência. Sem o suporte dos que acreditam num futuro, o atual governo talvez não se estenda à 2018, interrompido que possa ser quando da votação do impeachment em agosto próximo.


sábado, 4 de junho de 2016

O tiro pela culatra


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Tudo começou quando o primeiro ministro Britânico resolveu intimidar a Europa. Ora, nada mais delicioso para o psichê inglês (os escoceses não compartilham  deste prazer) do que torcer as orelhas de quem  chamam,  em tom depreciativo, “o Continente”.

E assim, lá se foi Mr. David Cameron tentar alterar as regras que regem as relações entre os membros da União Europeia, condições estas anteriormente aceitas pelo Reino Unido .  O fez, sob diversas alegações, entre as quais a de ordem econômica, de ordem imigratória,  de ordem trabalhista,  e outras.

Para reforçar seu cacife nestas negociações, o Premier Britânico optou por um estrategema que lhe permitisse exercer forte pressão  sobre  Bruxelas. Caso vitorioso nestas negociações, teria o líder conservador, por recompensa,  mais uma década dirigindo a política Britânica.  Convocou, para tanto, um referendum em junho, quando os britânicos decidirão se permanecem, ou não, na União Europeia. Armado desta  ameaça latente, acreditava ele levar Bruxelas à dobrar-se à seus propósitos.

Porém, o tiro parece ter-lhe saído pela culatra. As negociações que, a seu ver, tinha grande probabilidade de sucesso, encontrou uma Merkel fazendo barulhos suaves que escondia blindado repudio à qualquer alteração relevante na regra do jogo.  A França, pouco falou porém seu silêncio gritava pela rejeição das propostas Britânicas. Nem mesmo  o atual presidente da União Europeia, Donald Tusk, polonês e portanto simpático à Albion, conseguiu ser favorável às aspirações de Cameron; rejeitou-as.

Assim, o aristocrático Primeiro Ministro  sai da refrega  com minguadas vantagens, arrancadas nesta difícil negociação. Vê-se confrontado com um perigo bem maior do que previra. Não tendo bem avaliado a força dos opositores à permanência na União Europeia,  Cameron ora se encontra ameaçado de derrota quando do referendum, arma que pensava ser sua. Ainda, para surpresa geral, o próprio partido Tory esgarçou-se,  revelando insuspeito apoio de muitos de seus líderes ao egresso da União Europeia.   A estes juntaram-se forças nacionalistas e eleitores frustrados pelas atuais dificuldades econômicas, levando o resultado da consulta popular à imprevisibilidade.

Destacadas e respeitáveis fontes, nos campos  político  e econômico, tanto na Grã Bretanha  como alhures,  avaliam o rompimento com o Continente como sendo contrário aos  interesses do país. 
Ainda que vençam as forças do “Fico”, o desgaste político decorrente de tão audaciosa e arriscada iniciativa possivelmente custará  à  David Cameron  seu futuro político. Sofrerá, também,  o Reino Unido, visto como pouco confiável “team player” no maior projeto civilizatório oferecido ao planeta desde o Império Romano.