quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Vacina e política


                                                            Pazuello e Bolsonaro


Uma análise isenta da personalidade de Jair Bolsonaro levaria à conclusão que trata-se de uma pessoa dominada por suas emoções, a ponto de transformar suas percepções sobre os mais diversos assuntos em pseudo-realidade.

Tal desvio se acentua quando assentado sobre seu endêmico desconhecimento sobre os assuntos que lastreiam seu processo decisório. Tendo saído da Escola das Agulhas Negras como Tenente e deixado o Exército anos depois, ainda como Tenente (título de Capitão decorreu de seu afastamento), não mais demonstrou aprofundar seus conhecimentos. Limitando sua atuação parlamentar, uma vez eleito, conteve sua contribuição à missão corporativa promovendo o aumento de soldo de militares e policiais. Não ofereceu, nos seus oito anos de luta legislativa, qualquer projeto de lei  que pretendesse melhorar os destinos do país. 

Uma vez eleito à presidência, substitui a busca de consenso na sua equipe pela afirmação autoritária de  "quem manda sou eu". Assim, corre o risco de embasar suas decisões monocráticas em intuições e emoções, estas validadas pela posse da proverbial "caneta". 
   
Imprudentemente, Bolsonaro amarrou suas ambições eleitorais à pronta derrota do Corona virus. Assim, negou sua gravidade inicial taxando-o de "gripezinha", defendeu remédios exdrúxulos, menospresou máscara e distanciamento social, minimizou a perda de vidas (...e daí?), tudo na esperança que o virus cedesse em favor da retomada econômica necessária à sua reeleição.. 

Como se não bastasse, Jair Messias Bolsonaro agora comete o que poderá vir a ser capitulado como crime, ao intrometer suas preferências políticas em assunto diretamente ligados à saúde pública, daqueles que tem por missão proteger. 

Aliando-se mais uma vez a Donald Trump, em subserviência que talvez se desvende em estudos freudianos, lança-se o presidente brasileiro em campanha contrária à China, como se tal fosse do interesse do país. Sobrepondo-se aos métodos científicos para a seleção de vacinas anti Covid 19, o presidente declara-se contrário ao uso da CoronaVac, de origem chinesa, sem que, para tal exponha as razões que sustentem a sua decisão.

Dando sequência à esta preferência, Bolsonaro, mais uma vez, constrange seu Ministro da Saúde. Impõe ao Gen. Eduardo Pazuello a revogação da autorização por ele concedida à importação de insumos essenciais à produção da vacina. Em decisão meramente opinativa e política, sem qualquer base científica,  o presidente interrompe processo em desenvolvimento (cujo atraso redunda em maior número de mortes) essencial à saúde pública.

As vacinas em elaboração são do interesse vital do cidadão brasileiro ameaçado. Lhe cabe escolher dentre aquelas aprovadas pela Anvisa. Tendo-se em vista a enorme demanda prevista em país com mais de duzentos milhões de habitantes, a diversidade de opções é desejável.     

                                              



domingo, 18 de outubro de 2020

Tempos modernos




No princípio da cinematografia surge o filme "Tempos Modernos", dirigido e interpretado por Charles Chaplin. Tendo por tema a chegada explosiva da modernidade, Chaplin, com insuperável humor descreve os desafios e ansiedades humanas que acompanhavam e revolução industrial em curso.

Os dias de hoje bem se assemelham àqueles tempos.

Quanto mais tecnologia mais se aceleram as mudanças na sociedade e nos segmentos que a compõe. Um deles é a atividade bancária, onde a velocidade da luz dos circuitos aceleram as relações entre clientes e bancos. Acelera-se também o treinamento, a maturação do homem técnico que, ao dominar os labirintos virtuais, potencializa a capacidade de análise e solução de problemas.

Nos tempos idos do Século XX, o administrador de banco maturava qual vinho, colhendo com o tempo a experiência na lide dos fatores relevantes, tanto sob o aspecto operacional da mecânica financeira quanto sob a ótica mais abrangente do comportamento e motivações do mercado nas suas diversas fases.   

O que demandava o instrumental humano como centro da análise e previsão dos diversos fatores de risco que permitissem o sucesso do projeto, hoje os algoritmos reproduzem infinitas hipóteses e oferecem soluções para os mais variáveis cenários. 

Porém, esta revolução cibernética talvez não tenha ainda incorporado em suas equações o peso da ambição e da malícia que se escondem e se confundem no caleidoscópio das emoções humanas. As pulsões do Bem e do Mal, em permanente conflito bíblico, dificilmente serão dominadas pela arregimentação dos bytes.

Assim, duas realidades se criam, àquela gerada pelo consenso cibernético, que em processo circular cria e valida sua própria "verdade mecânica" e a "verdade humana" que, poderá chegar (após tempo e prejuízo) à contestação de tal validação. 

A capacidade de gerar, propagar, mobilizar e cooptar os fatores necessários para a geração de uma proto-realidade pode, também, tornar-se o germe de um grande engodo.   

O que nos traz aos momentos atuais de re-desenhamento do sistema bancário brasileiro, este dirigido por uma nova geração, sob a égide da "verdade virtual". O surgimento das quinhentas novas  "Fintecs"  e milhões de novos "Pix" propõe aumento de eficiência e velocidade que, no tempo, trarão benefícios aos mercados financeiros e seus clientes. 

Contudo, toda atividade que envolve valores monetários exigem especial cuidado tendo em vista sua natureza  fungível, passível de manipulação e artifícios. A eficiência, eficácia e prudência na  movimentação da poupança é de extrema relevância sócio-econômica, sendo também parâmetro de confiabilidade política.  Ainda, por sua complexidade e vulnerabilidade, exige  conhecimento, experiência e ética na sua condução.

Assim, a cautela se impõe no período de instalação e ajuste na implementação de novos sistemas, quando além das variáveis conhecidas surgirão as ainda por conhecer, sobretudo no que envolve  a segurança das partes.

  



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Plano inclinado



Contrariando os interesses fundamentais do Brasil, o Itamaraty acaba de juntar-se aos Estados Unidos e o Japão para, nada mais nada menos, posicionar-se contra o seu maior parceiro comercial, a China! Sob a batuta do jejuno ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o governo Bolsonaro emite comunicado conjunto com os países acima mencionados.com o intuito de retirar à China as suas atuais condições de participação na Organização Mundial do Comércio. 

Assim o Brasil, imprudentemente,  posiciona-se contra os interesses da maior importadora de seus produtos, responsável pela manutenção do invejável saldo de moeda forte brasileiro, esteio de sua credibilidade fiscal e financeira no exterior. 

Simultaneamente, e na direção oposta, as estatísticas de nosso comercio exterior revelam uma precipitosa queda nas trocas comerciais entre Brasil e Estados Unidos. Esta queda já se manifesta a partir de 2019 e ainda mais agravada em 2020, como resultado da política de "America First" instituída por Donald Trump. Apesar das inúmeras concessões do Brasil aos interesses norte-americanos, desde os estratégicos, aos comerciais. as tarifas norte americanas sobre nosso produto vem aumentando continuamente.

Ao Brasil cabe juntar-se aos Estados Unidos quando tal iniciativa condiga com seus interesses. A subserviência do governo Bolsonaro, que se observa desde seu início, ameaça a estabilidade econômica brasileira, a qual tem por parceiro comercial insubstituível, a China. 

Surpreende o alheamento do Congresso e das Forças Armadas quanto às consequências que redundariam de hostilidade gerada para com a fonte de riqueza crucial ao nosso desenvolvimento e segurança.

A atual política externa brasileira, contrariando todo o seu histórico republicano,  aproxima-se de crime de responsabilidade, por conspirar com potência estrangeira contra os interesse permanentes do Brasil.






sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Milicia e democracia



O que segue abaixo servirá de alerta para para brasileiros e norte-americanos. A mistura de radicalismo político e líderes radicais encerra novos perigos, até agora impensáveis. O Brasil não estará livre da infiltração política das milícias nos níveis sensíveis da estrutura política nacional, a serviço de lideres inescrupulosos.

O impróprio e o inoportuno ocorre no gélido estado de Michigan. Em plena campanha eleitoral, onde os ânimos se acirram, onde o contraditório se torna fanatizado, onde a proverbial lenha é jogada na fogueira das opiniões incendiárias, nos chega a surpreendente notícia de uma tentativa de  golpe de estado naquele estado. 

Para o observador distraído mais pareceria roteiro de novela barata. Mas, não, a notícia procede. O atentado, evitado em cima do laço, foi desbaratado pelo FBI. Os perpetrantes se originam na  denominada "Michigan Militia".

Não será por acaso que o poder a ser deposto seja exercido por uma mulher, Gretchen Whitmer, do partido Democrata

Esta e outras milícias, armadas "até os dentes", encontram em Donald Trump seu líder ideológico, defensor  do opaco machismo, do ultra nacionalismo, da supremacia da raça branca, da liberdade ilimitada do porte de qualquer arma. 

Na realidade estes grupos dedicam-se às armas fálicas, em compensação freudiana por uma virilidade ameaçada. Tentam compensar, de forma consciente e inconsciente, a frustração derivada de sua irrelevância cívica e existencial, tendo por armas a violência e a prepotência.  

Coincidência ou imprudência? Donald Trump, em tentativa de domínio dos "swing states", essencial à sua vitória eleitoral,  envia  recente mensagem: "Liberate Michigan". Insinuando trapaça adversária, aguça a desconfiança e a confrontação, propugnando a formação de grupos de vocação violenta, denominados "fiscais eleitorais". Ainda, seus  discursos contra as minorias raciais, pelo apoio aos  movimentos em prol da supremacia branca,  o Presidente americano vem  criando um ambiente sócio-político hostil, levando seus seguidores a confundir a realidade política com fantasia fanática. 

Porém o perigo pode ser bem maior uma vez que o início de movimentos violentos adquirem vida própria, fugindo, não raro, às intenções de seus criadores. Já faz tempo, milícias fortemente armadas vem  participando de reuniões públicas; até que ponto outros grupos semelhantes, disseminados país afora, não estarão contaminadas pelo mesmo vírus radical?

Observa-se, hoje, na sociedade norte americana, uma crescente dissonância sectária. Como pano de fundo, a  lei eleitoral americana se presta à contestação, uma vez que, não raro,  o voto popular, ao  subordinar-se ao sistema de colegiado, fragiliza a higidez democrática. 

Talvez, os ânimos ora acirrados causem séria contestação face aos resultados post eleitorais, abrindo caminho para uma crise institucional. Nestes tempos, tudo é possível...


sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Debate ou embate?

 


O que se observou no dia 29 de setembro em Cleveland, Ohio não foi um debate mas sim um embate. Em vez de seguir as regras enunciadas pelo mediador Chris Wallace, o que permitiria aos espectadores em teor bem mais pacífico do que muitos chamariam de "the Great Bully". 

Em vez de oferecer ao espectador as ideias e propostas dos candidatos, o que se viu foi um pugilato verbal iniciado e provocado  pelo presidente Donald Trump. Ameaçado de ser descartado e anulado, Joe Biden teve que reagir, ainda  que ris Wallace, mesmo sendo comentarista do canal Fox News, pró governo, tendo por natureza simpatia pelo atual presidente, viu-se levado a responsabilizar Donald Trump pelo fiasco.    

O Presidente, em vez de pautar-se por um debate disciplinado, falando e deixando falar,  lançou-se em ataques e interrupções, impedindo que o público assistente pudesse ouvir e compreender as declarações, de Joe Biden, seu adversário. Segundo o moderador, Trump interrompeu Biden 77 vezes, assim provocando a resposta do adversário em 22 vezes.

Porém, bem mais grave, foi Donald Trump exibir, de forma explicita, sua vocação ditatorial. Em vários momentos revelou não estar preparado para comandar dentro de balizamento democráticos, atropelando-os  em compreensão desvirtuada dos limites de seu poder.

Arrastado por sua arrogância

1. revela não aceitar os resultados das urnas se estes lhe forem adversos, predeterminando serem fraudados os votos pelo correio, estes preponderantes em condições de pandêmia. 

2. não admite críticas a seu governo e sua pessoa sem que reaja colérico. Como exemplo repudia a realidade ao se auto conferir eficiente combate à pandemia. Descarta ter desprezado o uso da máscara, o isolamento social, o respeito à medicação de fontes científicas, etc... 

3. promete invalidar, por fraudulentos, os votos a serem enviados pelo correio. Ameaça formação de grupos "fiscalizadores" nos locais  eleitorais servindo, assim,  para intimidar opositores. 

4. conta com o apoio das milícias armadas da Supremacia Branca

5. não hesita recorrer à mentiras facilmente verificáveis para embasar seus argumentos   

6. apesar de defender o conceito de "Law and Order"  desrespeita regras pré estabelecidas que venham a lhe tolher seus interesses

7. rompe as regras de educação e respeito devido em debate político ao acusar de drogado o filho de Joe Biden. 

Ainda mais relevante do que suas observações políticas durante o embate, Donald Trump revelou-se psicológicamente despreparado para o cargo que ocupa. Revelou ao público impetuosidade e falta de auto-contrôle verbal e mental. Sua irrascibilidade, seu desrespeito às regras do debate democrático revela um ethos refratário ao que conteste sua vontade.  Suas reações são incontroláveis, dentro do quadro de "custe o que custar", mesmo quando sabendo ser contrário ao seu interesse posterior ao imediato.

Esta "amostra" de sua personalidade dixa claro à nação norte-americana que a eleger-se Donald Trump à presidência não só o país ver-se-á sob as incertezas de uma mente inquieta, impulsiva, e, ainda, destituído  das defesas que um arcabouço cultural propicia, dando-lhe  referências essenciais ao bem governar.

Já, fora de fronteiras, cabe ao Brasil e seus governantes , meditar sobre os perigos de uma excessiva dependência a governo de alto risco para si e para a ordem internacional.