sábado, 2 de maio de 2020
Requiem ou ressurreição?
Começou mal, e acabou pior. A venda da Embraer-civil à Boeing representou a renúncia brasileira à tecnologia e à modernidade. Vendia-se um dos poucos núcleos de excelência tecnológica no país, compartilhado com a Embrapa, o complexo Fio Cruz e mais uma lista restrita.
Graças á concordância da Golden Share do Estado (vide Jair Bolsonaro e Paulo Guedes), foi vendido à Boeing o controle (80% do capital votante) do segmento aviação comercial.
Tal decisão, além de comercial foi, sobretudo estratégica. Renunciava-se, assim, à continuidade da capacidade tecnológica e empreendedora nacional. Transferia-se ao exterior as decisões sobre as prioridades.
Único país não desenvolvido a conquistar um sólido lugar no sofisticado mercado, como a maior produtor de aviões regionais, o governo brasileiro e os acionistas da empresa optaram por um Brasil menor. Abriu-se mão deste status diferenciador. Também abriu-se, mão de benefícios futuros.
O desenvolvimento humano, comercial, industrial lastreia-se, cada vez mais, no desenvolvimento tecnológico. As inovações que decorrem destas empresas e de seus engenheiros inseminam, se derramam sobre o resto da economia, gerando em ritmo exponencial a capacidade inventiva, criativa, inovadora nos mais diversos campos de atividade.
A Embraer e demais empresas de ponta, não são apenas empresas; são universidades que projetam seus ensinamentos, suas experiências através do tecido sócio-econômico.
Porém, a oportunidade de substancial lucro aliado ao temor de um futuro incerto, levou os acionistas brasileiros a aceitarem a oferta de compra de 80% do capital da Embraer pela Boeing ao preço de US$ 4,2 bilhões. Proprietária de maioria acionária incontestável, criava-se a vulnerabilidade quanto a permanência da empresa no Brasil, sendo explicitada no contrato o direito de transferência geográfica de sua produção.
Se pelo lado do acionista privado, cabe-lhe a decisão, já pelo lado do acionista representante da Nação, detentor da Golden Share, a análise de sua conveniência envolve outros fatores. Estes, não são tão somente financeiros mas, também, estratégicos. Constata-se, também, que o sucesso até então obtido pela Embraer deveu-se a sinergia criada por esta associação, do privado com o estatal. Do lado privado criava-se o produto de alta qualidade ajustado à demanda do mercado e, do lado estatal, provia-se a tecnologia militar e o financiamento essencial à sua comercialização.
A decisão do governo Bolsonaro em apoiar a operação revelou uma visão da Embraer como empresa do presente mas não do futuro. Ao defender sua venda não atribuiu valor aos benefícios diretos e indiretos, tanto no up-stream quanto no down-stream. que uma empresa aeroespacial trás ao país. Ainda, desprezou-se a crescente sofisticação das empresas fornecedoras, de seus dirigentes e funcionários.
Não parece ter levado em conta que graças aos benefícios diretos e indiretos, empresas similares internacionais existem e prosperam graças aos subsídios de seus governos.
Para alguns a visão aritmética limita o futuro; despreza a inspiração e a vontade. Mas na história do desenvolvimento humano, 2+2 por vezes não resulta em 4; o conhecimento, a vontade e a ambição humana potencializam aquela soma à um valor só limitado pelo horizonte a ser conquistado. .Ao olhar-se para trás, rememorando o modesto início na produção do seu primeiro avião comercial, evidencia-se o avanço exponencial da empresa. Nos anos que se seguiram, a qualidade e a tecnologia de seus aviões, tanto comerciais quanto militares excederam o que seria, à época, a mais imprudente projeção.
Ad astra per aspera. As grandes nações desenvolvidas superaram suas limitações iniciais, lutaram por sua grandeza; unindo o homem à suas aspirações. Recusados os sonhos e desafios, prevalecem os grilhões da inferioridade que condenam toda uma Nação à subserviência internacional e à mediocridade nacional. Esta condição é a realidade tacanha que precisa ser vencida. O Brasil precisa ousar.
Novo episódio! Com o affair 737 MAX a Boeing revelou falhas, não só técnicas, mas éticas e morais. Na ânsia de manter voando o avião condenado pelas agências internacionais, tropeçou em sua incontida ambição. Terríveis as mortes e grandes os prejuízos por sua incúria. Obrigada a rever seu plano de negócios, constata que a Embraer nele não mais se encaixa. Para desobrigar-se, acusa a sócia brasileira de descumprimento contratual...
Hoje, à Embraer, ferida pelas inevitáveis mudanças e adaptações ao longo destes últimos dois anos sob o comando da Boeing, caberá adaptação à nova realidade societária, e, ainda mais grave, enfrentar a depressão que atinge o setor do transporte aéreo mundo afora.
Dificilmente terá a Embraer condições de sobrevivência sem um parceiro com deep pockets. A China é lembrada como possível parceira ainda que, face à hostilidade que lhe move a diplomacia brasileira, difícil será chegar-se à um acordo.
Talvez Bolsonaro, e Paulo Guedes tenham alguma boa ideia...
.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
4 comentários:
Ótimo
SÓ más noticias! Esperemos que essa seja um mal que virá para o bem posteriormente ... caso nao desabe no caminho...uma pena mesmo! era um orgulho voar naqueles aviaozinhos....
Pois é, assim estamos tentando seguir.... muito boa explanação Pedro.
O jogo ainda nãocabou, mas ascartas que a Embraer detêm são muito ruins...Vamos torcer.
Postar um comentário