domingo, 22 de dezembro de 2019

Boeing e Embraer






Foram muitas as dúvidas que acompanharam a venda de Embraer, então empresa cem por cento nacional, para Boeing, numa configuração societária de 80% para a empresa norte-americana.

Para os oponentes, a venda da empresa seria contrária aos interesses da nação, por desmontar uma impar equipe tecnológica que criara o terceiro maior fabricante de aviões comerciais no mundo. Ainda, a transação foi concluída  por uma soma modesta(1) de 4 bilhões de dólares.

Já os defensores da operação argumentavam, em campanha publicitária surpreendente sob forma de notícia espontânea,  coordenada e publicada de forma idêntica (revelando uma só origem - no caso a Boeing),  nos principais jornais brasileiros, tendo por base a inviabilidade de uma Embraer de acionistas brasileiros. Desprezou-se a posição invejável da Embraer como a principal vendedora de aviões cuja configuração atende um crescente mercado, e cuja concorrência das grandes fabricates não representava perigo uma vez que para tal "re-tooling" deveriam elas despender dezenas de bilhões de dólares. Ainda, também passando despercebido, a  Embraer detinha um trunfo chinês, através  de uma joint venture, o que lhe permitiria entrada no mercado asiático.

A desinformação simultaneamente disseminada de que a Airbus teria comprado a Bombardier reforçou o argumento vendedor.  Propositadamente ocultou o fato de que não houve alteração acionária mas, sim, um mero  acordo comercial de venda 50/50 do mais novo modelo canadense.

Perante a acachapante argumentação paga e divulgada em todos os meios de comunicação nacionais, a maioria da opinião pública juntou-se aos vendedores.

O imediatismo, agravado pelo açodamento,  venceu. Os benefícios financeiros e estratégicos nacionais foram ignorados, tendo por beneficiários os acionistas vendedores da Embraer e os acionistas copradores da Boeing. A última linha de resistência, a anuência da Golden|Share, sucumbiu perante a argumentação de curto prazo. O Presidente Bolsonaro, inicialmente contrario à venda, rendeu-se aos argumentos de seu Ministro da Economia cuja meta parece ser a  desestatização ideológica, desprezando as  características de cada projeto.

De olho nos ganhos imediatos e intimidado pelos prejuízos prometidos, o governo cedeu e permitiu a operação, sem levar em conta o enorme valor estratégico de manter no Brasil uma incubadora tecnológica de primeira grandeza. Manifestou-se e validou-se o complexo de vira-lata tão repetido por Nelson Rodrigues

Pois bem,negocio feito; vamos colher os frutos prometidos...

Eis, senão quando, o castelo erguido começa a desmoronar. A Boeing, tida por incomparável, mergulhou no precipício cavado pela sua ganância ao criar o 737 MAX. Ao executar, em busca do beneficio imediato, um projeto falho, cometeu uma série de erros levando passageiros à morte em sua corrida contra o tempo. Hoje paga enorme preço, sendo obrigada a interromper a produção de um avião que, em parte,  poderia ser substituída por aeronaves Embraer.

E quais foram os ganhos da Embraer neste ano? O texto abaixo, recém publicado pela revista Exame responde a pergunta;

A Embraer apresentou prejuízo líquido de 314,4 milhões de reais no trimestre, cinco vezes superior ao número apresentado no mesmo período do ano anterior.
Apesar de uma entrega maior de aeronaves no trimestre –  17 aeronaves comerciais e 27 executivas, ante 15 e 24 respectivamente há um ano – as receitas da companhia se mantiveram praticamente estáveis, com alta de 2% para 4,69 bilhões de reais, resultados mais fracos que o esperado pelo mercado.
A margem operacional da divisão comercial foi negativa em 11,5%. Isso se deve a descontos maiores nas vendas(2) dos E175, para atrair novos pedidos para a aeronave, avalia o Bradesco em relatório.


Mr. Muilenburg, Executivo chefe da Boeing, foi responsável pela associação com a Embraer. Sabe-se, agora, de sua destituição do comando. É provável que esta fusão seja objeto de reavaliação, tendo em vista as controvertidas decisões do CEO anterior. É possível que a nova administração venha a considerar três hipóteses:
1.Prosseguir com o atual projeto, sem alteração.  


2 Transferir a empresa para os Estados Unidos, onde as vantagens de escala e de    "procurement" serão relevantes.
3.Gradualmente encerrar as atividades da empresa brasileira visto o valor         insignificante do preço de aquisição representa perto de 5,12% de seu  Ativo   Corrente e 3,83% de seu Ativo Total.
 


(1) Uma corretora brasileira recém captou 20 bilhões de dólares no mercado financeiro norte-americano ao vender menos de 50%  de seu capital final.

(2) Vendas que a Boeing deveria ter facilitado e potencializado.


O Presidente e Chefe Executivo da Boeing, Dennis Muilenburg, acaba de ser demitido.

 New York Times , 23 de dezembro 2019.











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