sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Hoje e ontem


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A supremacia explicita saiu de moda a partir do termino da Segunda Guerra Mundial. A internacionalização do movimento Comunista propugnando a inter relação dentre os países aderentes ao bloco, senão na prática, na aparência diluia o nacionalismo extremado. 

A política norte americana, com fortes matizes isolacionistas na pré guerra, tornou-se a após a vitória, numa política interativa e solidária, sem que para isto, tenha abandonado seus interesses nacionais, tanto políticos como econômicos.. Liderando a criação das grandes instituições internacionais, como as Nações Unidas, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e outras, completou esta notável política com o Plano Marshall, ajudando a Europa a livrar-se do comunismo, e possibilitando um desenvolvimento econômico que deu, à ambas as partes, imensa riqueza.

Assim, a nova Alemanha foi levada a abandonar a estrofe contendo a exclamação Deutschland Über Alles em seu hino nacional. Pressionada pelos Aliados abandonou-se o conceito “a Alemanha acima de todos” sendo substituído pela terceira estrofe, de teor mais congenial.

“America First” não difere em muito do espirito de excepcionalidade tão caro à cultura norte-americana. Donald Trump, contudo, retornando ao início do Século XX, pretende transformar este sentimento de superioridade étnico-cultural a novo patamar, o da superioridade mercantilista. Ao colocar-se como se fosse o Chief Executive Officer empresarial da nação norte-americana pretende, no trato com as demais nações, em tudo levar vantagem imediata.

Ora, são muitos os que concordam com o espirito patriótico, porém não às expensas do respeito devido à outras nações. Enquanto respeito não signifique liberalidade, é justo que, na escolha de negociações bilaterais, os interesses imediatos não atropelem as conveniências de longo prazo. Conquistar alguns bilhões ao longo de alguns anos na balança comercial pode não compensar uma incipiente hostilidade ou uma perda de lealdade em nações cuja relevância estratégica possam afetar, a prezo mais longo, a segurança dos próprios Estados Unidos.

Internamente, o Donald procura inimigos afim de conquistar apoio popular. Encontrou os imigrantes. Despreza a imensa contribuição econômica e cultural destes milhões que, em boa parte executam tarefas que os próprios nativos rejeitam. Não obstante, a ordem é expulsá-los.

Ainda, o abandono por Washington do campo multilateral, dando preferencia ao one on one nos negócios externos leva as demais nações a negociar em evidente inferioridade. O resultado de tais confrontos parece sugerir uma forte queda do “soft power” norte-americano, aumentando exponencialmente o esforço diplomático para a obtenção perene de vantagens pretendidas.

Como defesa contra a ofensiva que se anuncia ter-se-á uma tendência de maior aglutinação de nações com interesses convergentes quando enfrentando o desafio Trump, Daí resultaria, possivelmente, o enrijecimento nas posições dos polos econômicos que dominam o planeta. Novamente, o resultante aumento da fricção e tensão internacional poderá traduzir-se em perda de eficiência comercial e financeira, aumento dos custos de transação e, até mesmo introduzindo uma expansão de potencialidades militares antagônicas.

Em suma, o homem levado à presidência pelo processo democrático norte-americano não deixa de lembrar ocorrências passadas, onde o povo ingenuo culturalmente  torna-se refém de promessas oblíquas sob a bandeira “America First”, cuja implementação promete alto custo.

Em 1933, Adolf Hitler subiu ao poder democraticamente, sob a promessa de maior emprego e prosperidade econômica. Prometeu, também, revisar tratados e renegar pagamentos. Iniciou o maior programa anti-étnico da história. Impôs sua vontade sobre vizinhos. Era a época de Deutschland Über Alles.


O povo norte-americano saberá proteger-se.

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Motim e tolerância


São muitas as características que dão a uma nação sua personalidade. Nos Estados Unidos seria o dinamismo, na Alemanha, talvez a eficiência, na Inglaterra muitos diriam a habilidade política, na França, possivelmente, a intelectualização.

No Brasil, o traço predominante seria a tolerância. Traço dúbio, pois tanto engrandece como diminui. Se, por um lado, na sua história, o conflito tende a encontrar solução pacífica, em muito destoando da maioria das nações, por outro, ao transpor-se a visão histórica chega-se ao comportamento comunitário, onde a visão é bem outra.

Resultado de imagem para fotos prisõesNaquilo pertinente à cidadania, na interface entre o cidadão e sociedade, observa-se a fluidez de conceitos, a relativização das regras de comportamento, a flexibilização das leis, a rejeição da severidade. Escorrega-se para o Mais ou Menos. 

Para o brasileiro, o indivíduo, suas vontades e conveniências alcançam nítida prevalência sobre os interesses do conjunto. Como se numa imensa e subconsciente conspiração o brasileiro se amolda à linha de menor resistência, onde o Bem, se caro for, é substituído pelo Possível, de bem menor custo. Perde-se, na transferência de um para o outro, o ímpeto da determinação que o processo civilizatório exige

Como em todas sociedades, a opção tida por amena, confortável, que rege o procedimento sócio-político nada mais é do que o reflexo do comportamento coletivo das elites. Às elites dominantes cabe optar pela abrangência, pela intensidade e pela severidade, das regras que a sociedade sob seu domínio deve seguir. Se seus mores refletem a tolerância e favorecem a convivência com o ilícito, impossível ter-se uma sociedade onde prepondere o estrito respeito à Lei. Porém, ao fazê-lo, coloca-se o futuro em risco, onde filhos e netos abdicam da evolução devida.

O descalabro evidenciado nestas últimas semanas onde bandidos e policiais desafiam a lei em busca de benefício próprio, bem refletem o estado de anomia que assalta o país. No primeiro caso, a rebelião reflete a des-priorização do binômio Código Penal e a realidade física carcerária. No segundo, explora-se o monopólio da força armada, concedido pelo Estado, em benefício próprio.

A inadequação das penitenciarias revela a velocidade no encarceramento supera a capacidade de absorção pelas prisões, as quais, por decisão da sociedade, não merecem a ampliação exigida. Tolera-se a superlotação, tolera-se o descontrole que dela resulta, tolera-se a transferência de poder dos carcereiros para os líderes traficantes. Quando da inevitável consequência temos recriminações e ranger de dentes.

Resultado de imagem para fotos quartel pmNo caso da greve iniciada pela policia militar pecou-se pela não aplicação da lei, que classifica como Motim o abandono, por parte força armada, de suas obrigações. Inaceitável ter-se a Sociedade tornada refem por batalhões por ela municiada. Constatou-se um governo tímido, acuado. A anedótica barreira de mulheres à entrada dos quartéis para assegurar aos policiais a sua recusa de deles sair resultou, é claro, da tolerância concedida aos grevistas. Ora, em tempos de emancipação das mulheres, não há que tratá-las como se flor de estufa fossem, e sim como cidadãs responsáveis por seus atos. A cumplicidade no crime cometido parece manifesta. A remoção dos obstáculos, com a tropa federal adentrando os quartéis teriam, em pouco tempo, restabelecido a ordem. Evitar-se-ia a onda de assassinatos e saques que impôs o terror à população de Vitória.


Estes dois nefastos acontecimentos refletem o pathos liberandi que domina a sociedade brasileira. Esta, em boa parte, resulta da generosidade de sua geografia, de seu clima, de sua demografia. São fatores que conspiram em prol da leniência que, não raro, entoxíca o corpo social. Assim, agravam-se os obstáculos que barram o caminho do progresso material e cívico da nação, tendo por responsáveis àqueles segmentos das elites que hesitam quando da necessária aplicação da lei.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Alianças e lambanças


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Desde 1946 o renascimento da Europa, o berço da civilização Ocidental, tornou-se um laboratório buscando, ao mesmo tempo, o retorno do crescimento econômico e, face a devastação de suas terras e o empobrecimento de sua gente, novas formulas de equidade social.

Sem o Plano Marshall talvez seu experimento não chegasse a bom term, visto o campo fértil que a pobreza então endêmica oferecia ao Comunismo. Confrontado com esta realidade política o governo Truman iniciou um programa que haveria de preserevar o capitalismo no continente. Ao Plano somou-se o poderio militar norte americano, revelando-se suficiente para conter o maior exército do mundo, o Soviético.

Na periferia das grandes potenciais foram muitas as guerras. No Sudoeste asiático, na África, no Oriente Médio os conflitos por procuração dos dois impérios, um financeiro, o outro geográfico, ceifaram vidas, patrimônio. Nestes anos ameaçadores, a Europa livre perdeu suas colonias e submeteu-se ao seu grande aliado, único provedor da segurança. Como se nascesse da coxa de Júpiter, surge a OTAN, mais Marte do que Dionísio, aliança garantidora do velho Continente.

Finalmente, quarenta e cinco anos depois ruí o Muro de Berlim concedendo a vitória indiscutível aos países democráticos. Às portas de Século XXI, os Estados Unidos assumem a liderança inconteste do Planeta Terra.

Fast Forward...

Poucos homens tem o poder de alterar o rumo da história. Donald Trump, um impetuoso businessman, revela tênue cultura internacional, confundindo diplomacia com deal making. Detem o poder de virar o jogo”. Lastreado na agressiva cultura nova yorquina, considera que as táticas negociais se aplicam ao diálogo com chefes de Estado. Não conhecendo a história que liga Washington às demais nações, desrespeita interesses legítimos e sensibilidades arraigadas. Já demonstrou seu desprezo pelas instituições multilaterais, optando pelo perigoso bilateralismo na solução de problemas.

Não será impensável ver-se a Europa, a mais importante aliada, por razões estratégicas, políticas e comerciais, abalada pela nova realidade. Será o momento de repensar sua confortável dependência na generosidade norte-americana? Ameaçada por embates internos, como a deserção da pérfida Albion, a possível queda de Angela Merkel e a preocupante ascenssão de Marine Le Pen, vê-se a União Europeia em módulo defensivo.

Aos acidentes domésticos soma-se, agora, a instabilidade na liderança internacional. Novas exigências prometem tensionar a OTAN, nublando a convergência de propósitos nas politicas comercial e de segurança.

Ainda, a singela percepção de Trump sobre as complexidades no Oriente Médio, não favorece conclusões eficazes. Nesta região, amigos e inimigos se confundem, ombro a ombro, tornando imprudente conclusões apressadas. Sua modesta compreensão das circunstâncias históricas e geo-políticas que movem os players no berço das três religiões favorece decisões erradas e iniciativas perigosas.


Há cem anos as tropas norte-americanas desembarcam na França, juntando-se aos exércitos francês, britânico, belga, português e outros em sua luta contra o Império Germânico. Pouco depois, os vencedores retalharam o Oriente Médio. Cabe a Donald Trump rever estes tempos para entender como o presente foi construído. Só então poderá tratar do futuro.  

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

O sistema elétrico situa-se no espaço Público


Joaquim Francisco de Carvalho *


Em linha com o professor Norberto Bobbio, num país bem organizado pode-se distinguir os conceitos de Espaço privado e Espaço público em função dos objetivos visados pelas entidades, estabelecimentos ou empresas que neles operam :

Do lado do espaço privado ficam as corporações e empresas industriais; estabelecimentos comerciais e de serviços; corretores e instituições financeiras, etc. O objetivo preferencial dessas corporações e estabelecimentos é o de gerar lucros para os seus controladores.

Do lado do espaço público ficam as entidades voltadas para atividades não lucrativas, tipicamente estatais, como a diplomacia, a segurança nacional e a polícia, além daquelas de caráter social, como a educação primária e a saúde pública. Neste espaço também estão alguns serviços públicos (utilities), que são vitais tanto para as corporações e empresas que operam no espaço privado, como para aquelas que estão no próprio espaço público. Por isto, as utilities devem respeitar certos princípios éticos, que as afastem dos embates por lucros que caracterizam o espaço privado. Aí temos, verbi gratia, o suprimento de eletricidade, que, num país como o Brasil, entra na classe dos monopólios naturais. De fato, nas cidades deste país, as tarifas de eletricidade são impostas por um único fornecedor (Light, no Rio; Eletropaulo, em São Paulo, etc.)

Seria uma lapalissade acrescentar que a eletricidade é indispensável para a produção industrial; as comunicações; o comércio; a pesquisa científica; os hospitais e laboratórios; a conservação dos alimentos; o abastecimento; o lazer; enfim, para tudo. Os preços da eletricidade impactam todos os custos da economia, acabando por influir na qualidade de vida das pessoas. Por conseguinte, tarifas elétricas não devem ser formadas no espaço privado, porque o objetivo preferencial das empresas deste espaço é a sua própria rentabilidade – e não a saúde financeira de outras empresas ou a qualidade de vida dos consumidores.

Ademais, em virtude de sua ampla interface com os demais setores, o setor elétrico é um indutor de transformações modernizadoras, que vão desde novas tecnologias e processos produtivos, até a melhoria da qualidade e confiabilidade de produtos e serviços, a eficiência da gestão empresarial, a formação de recursos humanos, etc.

No caso brasileiro, ao lado das considerações acima, convém lembrar um aspecto ético essencial, relacionado às atuais tendências de se passar para o espaço privado o que resta do sistema hidrelétrico.
Trata-se do seguinte: até a década de 1.990, as tarifas de eletricidade eram estruturadas no contexto do espaço público, de forma a permitir que o investidor (o Estado, no caso) cobrisse todos os custos operacionais (pessoal, manutenção e reposição de equipamentos, impostos, etc.) e recuperasse em trinta anos o capital investido na construção das hidrelétricas, linhas de transmissão e redes de distribuição – além de se capitalizar para expandir o sistema proporcionalmente ao crescimento previsível da economia.

As tarifas eram baratas porque a idade média do parque gerador brasileiro aproximava-se dos acima referidos trinta anos, portanto seu valor contábil (que entra na formação das tarifas) é muito reduzido.
Daí resultava uma baixíssima incidência do capital sobre os custos da eletricidade gerada, permitindo que se estruturasse uma tarifa de suprimento média, que dava, às distribuidoras, margem para cobrar tarifas acessíveis para as microempresas e até para os consumidores de baixa renda.

Com a desregulamentação e a artificial transferência do sistema para o espaço privado, essa vantagem desaparece, porque as tarifas passam a ser formadas visando a lucros. Em consequência, os consumidores residenciais já encontram dificuldades para pagar as suas contas de eletricidade, o que retém a demanda por muitos tipos de bens de consumo. Por outro lado, já é grande o número de pequenas e médias empresas expulsas do mercado, devido à alta incidência das tarifas de eletricidade em seus custos de produção.

Parece claro que esses movimentos provocarão um retrocesso da economia brasileira, retardando o desenvolvimento social e mergulhando o país numa penosíssima situação, da qual só emergirá quando os governantes tiverem visão de estadistas e perceberem a importância do espaço público, numa economia ainda frágil como a brasileira. Por outras palavras, é indispensável que se respeite o direito das pessoas e das classes produtoras, de receber eletricidade a preços compatíveis com os custos de geração do sistema hidrelétrico, que deveriam ser baixos porque, como foi explicado linhas acima, as usinas estão no fim do prazo de depreciação contábil, de sorte que a eletricidade que elas produzem (energia “velha”) permite que se componham tarifas favoráveis ao setor produtivo e à população.

Em suma, receber energia barata decorre do direito natural dos consumidores, pois foram esses consumidores que pagaram tarifas que incluíam parcelas destinadas a amortizar os financiamentos contratados para construir as hidrelétricas e os sistemas de transmissão e distribuição. Por esta razão, o conjunto dos consumidores (pessoas físicas e empresas) adquiriu o que alguns juristas denominam “direitos difusos de propriedade” sobre os ativos do sistema elétrico.

Para respeitar esses direitos, o Estado deveria obrigar-se a vender eletricidade a preços calculados com base no valor depreciado do capital investido na construção do sistema. Isto seria viabilizado pela criação de uma entidade de direito público (um pool), que compraria a energia das geradoras e revenderia às distribuidoras, de acordo com os seguintes princípios:

• O pool seria operado por um núcleo técnico, submetido a uma diretoria não política, designada, de forma paritária, por entidades representativas das empresas geradoras e distribuidoras de energia elétrica – e, também, por associações de consumidores residenciais e entidades de classe da indústria (CNI, Fiesp. Firjan, etc.).
• A energia das geradoras seria comprada pelo pool a preços calculados com base em custo comprovado mais lucro previamente acordado. As diferenças entre os custos das três fontes (hidroelétrica, termelétrica e eólica) seriam compensadas para se formar uma tarifa média de suprimento às distribuidoras. Estas entregariam a eletricidade aos consumidores, também a custo demonstrado mais lucro previamente acertado.
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* Joaquim Francisco de Carvalho é doutor em energia pela USP. Foi pesquisador associado ao Instituto de Energia e Eletrotécnica daquela universidade, coordenador do setor industrial do ministério do planejamento, diretor da Nuclen (atual Eletronuclear), engenheiro da CESP e presidente do IBDF (atual Ibama).

sábado, 4 de fevereiro de 2017

O Excessivo custo da Cura


Há muito que o planeta embarcou na luta contra os estupefacientes. Maconha, cocaína, heroína, anfetaminas, dentre outros espalham-se através do mundo, conquistando crescente numero de usuários, muitos deles irremediavelmente viciados.

São muitas as formas pelas quais os países lidam com o problema, a mais comum tratando dos adictos com maior leniência enquanto o peso da lei é reservado aos traficantes. Faz sentido. Contudo,  a aplicação das políticas variam de país a país. Enquanto nas Filipinas e na Indonésia o traficante tende a receber a pena de morte, na Europa constata-se maior tolerância na aplicação das penas. Lá aposta-se mais na recuperação social do criminoso.  Em alguns casos, nações toleram o consumo “a céu aberto” deixando para os intermediários as duras penas da lei.

Já nas Américas persegue-se o modelo norte-americano onde a severidade é extrema quanto ao encarceramento dos traficantes e severa para com os usuários. Tanto no Norte quanto no Sul do hemisfério americano, as punições tendem a privilegiar a raça dominante e penalizar as minorias.

Resultado de imagem para photos of drug traffickingTanto nos Estados Unidos quanto no Brasil a diferença das condenações impostas aos brancos em contraste aos negros é abissal. Estatísticas confiáveis  revelam forte incidência de  usuários negros emprisionados, enquanto as sentenças lavradas aos brancos refletem incomparável tolerância do sistema judicial de ambos os países. Avilta-se a Justiça. Constata-se, assim, inegável viés racial na forma pela qual o combate à droga vem sendo praticado.

No que tange o universo carcerário, observa-se a incapacidade das autoridades em conter o domínio exercido pelos sindicatos criminosos que dominam a geografia prisional. É do conhecimento geral, graças às recentes rebeliões em diversos presídios brasileiros, que estruturas de comando vicejam no ambiente carcerário, a ponto de coordenarem-se com seus comparsas além-muros, assim ampliando e aperfeiçoando a extensão de sua ação criminosa com evidente e crescente ameaça à sociedade brasileira.

O fato de tal realidade, contrária aos interesses da nação, persistir ao longo de décadas reflete a necessidade de rever-se toda a base lógica sobre a qual repousa o atual combate à distribuição e proliferação das drogas.  Esta parece lastrear-se sobre a duvidosa tese de que a contenção manu militari da distribuição da droga protege a sociedade. No entanto, a observação empírica revela realidade oposta. A contenção na distribuição da droga, ainda que ineficaz, cria as condições ótimas para a precificação do produto e a proliferação do crime especializado. Desta prosperidade crescente redunda a continua ampliação do recrutamento de soldados e da aquisição do armamento necessário à manutenção e disseminação do crime.

Ainda, os enormes valores que decorrem da distribuição ilegal da droga permitem, não apenas beneficiar as gangues nela envolvidas mas facilita, também, o processo corruptor onde as próprias forças repressivas são cooptadas pelo crime que devem combater. Constata-se, assim, que, contrariamente ao que a atual formulação de combate ao crime defende, este torna-se, ano a ano, cada vez mais presente Brasil afora.

Tais tentáculos são letais, gerando não apenas um crescente contingente de drogados, mas trazendo direta e indiretamente um incontido aumento dos crimes de morte, onde tanto o envolvido como os inocentes pagam com a vida. Alem dos meliantes, morrem em crescente numero,  policiais e civis, dentre os quais, forçoso lembrar, crianças. Em certos momentos, bairros e comunidades carentes são feitos reféns, ônibus incendiados, escolas fechadas  para atender os desígnios de  comandos criminosos. Não poucas vezes a sociedade encontra-se sitiada.

Recente estudo do Fundo Monetário Internacional revela que, em 2014, o combate às drogas no Brasil consumiu mais de noventa e hum bilhões de dólares, ou, seja, mais de 3,5% do PIB, valor próximo das perdas da economia  nacional em 2016.

A atual formulação para enfrentar o flagelo da droga tem por consequência enriquecer os seus comandantes e soldados. Ao Estado cabe romper a equação econômica que, até os dias de hoje, vem beneficiando o crime. No momento, o custo social que dela decorre promete superar o custo da alternativa propugnando a descriminalização da droga. Enquanto o custo do combate em sua atual formulação revela aumento ano a ano, provavelmente já chegando aos cem bilhões de dólares em 2017, o ônus decorrente da descriminalização,necessariamente acompanhado das medidas sociais de apoio, tenderia decrescer com a passagem do tempo.

Como suporte desta medida, ter-se-ia uma permanente campanha de mídia, a guisa do que já foi realizado contra o cigarro, com acompanhamento sócio-medical  lastreado em estrutura física de recuperação dos viciados. Para os traficantes recalcitrantes, a pena máxima, sem atenuantes, seria apropriado.

Não são poucos os nomes ilustres que atribuem à guerra às drogas a imagem de enxugar gelo. Dentre estes, destacam-se o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso bem como o atual ministro Luis Roberto  Barroso do Supremo Tribunal Federal. Parece ter chegado a hora da sociedade brasileira enfrentar a realidade.