sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Crime e castigo*


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Talvez seja a impunidade jurídica àquela que melhor define o doente Brasil. Nada mais comum do que ver-se condenados circulando nos circuitos sociais e políticos, com plena e arrogante desenvoltura, décadas depois de sua primeira condenação. Nenhum destes senhores é pobre ou remediado, pelo contrário, navegam recostados  na opulência ilícita que os colocou na condição de réus condenados.

Estes, ao apresentar recursos após a confirmação da condenação pela Segunda instância,  raramente a inexistência do crime e sua inocência são arguidos pelo réu. Fixa-se ele na  contestação de aspectos processuais redundando, ainda segundo ele,  em cerceamento de seu direito de defesa, o  que invalidaria a condenação. Assim, a defesa busca nos meandros processuais, não oferecer novos fatos que levem à inocência do réu, mas, sim, a eventual impropriedade do rito até então seguido. Sendo generoso o limite de recursos, o réu não mais argui pela inocência, mas,  sim, visa estender o processo até atingir o objetivo prescricional.

Assim sendo, frágeis parecem os argumento dos que propugnam a liberdade do réu até o esgotamento de todas as instâncias possíveis. Alegando temer que fosse encarcerado o réu inocente, preferem  ignorar a eficácia das duas primeiras instâncias e ocultam o teor iminentemente protelatório dos recursos que se seguem.

Ora, já tendo sido condenado por pelo menos três juízes, o de Primeira instância e, no mínimo, mais dois dos três Desembargadores da Segunda instância,  difícil conceber não ter tido o réu a oportunidade de defender-se plena e cabalmente.

Lícita e razoável, a partir desta confirmação da decisão inicial, é a presunção de culpa e a prisão do réu, ao qual caberá, a qualquer momento, oferecendo fatos novos relevantes, impetrar recurso e obter, talvez, a liberdade.

Tendo por objetivo ordenar o comportamento e  harmonizar os interesses da sociedade, a lei não deve ser vista como um corpo autônomo, onde a letra se sobrepõe ao sentido. O texto, na sua minúcia,  não deve tornar-se uma camisa de força, impedindo o interesse da comunidade. Infelizmente, neste sentido, enquanto a exatidão da palavra prevalece no código Napoleônico o embasamento em precedentes prepondera na Common Law anglo-saxônica. O segundo se adapta e atualiza-se criando novos precedentes enquanto  o primeiro sofre de rigidez, só sendo alterado pelo formalismo de novo texto.

Contudo, no contexto brasileiro cabe ao Supremo Tribunal Federal, através de seus acórdãos, promover  ajustes que o tempo e a sociedade reclama, atualizando a jurisprudência. No caso em questão, face à impunidade que decorre da interpretação restritiva, libertou-se o judiciário  da exegesse formalista,  assim ajustando-se à nova realidade.

A eficácia da Justiça e sua percepção pela sociedade, tanto na qualidade quanto na presteza, são condições fundamentais para o  desenvolvimento do país.



*Com permissão de Fyodor Dostoievski

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