quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Etapas do homem




Sem dúvida, são muitas as datas importantes que povoam a vida do homem. Certamente a mais importante é a data do nascimento (entre em cena a insubstituível mulher); sem ela nada existe. A partir deste ponto inúmeras efemérides (êta palavrinha feia) salpicam a vida do individuo (meninas, vocês estão incluídas).

Chegando aos vinte anos, é a glória para os adolescentes, doidos para serem homens crescidos, mal sabendo da enrascada que estão se metendo. Aos trinta vem a constatação que papai não está mais ajudando, e que, ou você se vira ou vai ficar falando sozinho na hora de pagar pra ver. Aos quarenta o mínimo admissível é uma boa posição profissional, com respeitável contribuição à Fazenda Nacional, a menos que tenha optado pela parte perdedora da operação Lava Jato.

Aos cinquenta, ou é o Grande Bacana ou pode esquecer de sustentar a mais perfeita maquina de consumo jamais inventada: a mulher. Ainda, arrastado pela inevitabilidade dos gastos crescentes, a ânsia de status (antigamente chamado de importância) cabe ao homem a potencialização geométrica, não dos pães, mas do seu cash flow (salário, para os menos afortunados). Belas moças,  carros variando entre bólidos e carruagens imperiais, moradias construídas e decoradas de forma a superar àquelas que invejam, helicópteros e outras manifestações explícitas englobam os prêmios esperados. É o ápice da auto-gratificação, a ser acentuado, ratificado e ampliado na chegada dos sessenta e, a seguir, os setenta. A não ser, é claro, que um súbito ataque de megalomania, que inclua excesso de cortesãs, de cavalos, de cartas e de hubris, levem tudo a perder.

Chega-se então à década terribilis. Até então, as doenças diversas, divórcios milionários, a gangorra dos mercados e a incúria dos governantes dão ao sobrevivente o frisson do inesperado, o desafio que aduba o sucesso dos vencedores. Mas o advento da octogésima década, esta sim impõe meditação. Pelo menos para aqueles que sabem fazer contas.

Deixando para traz os 72 anos tidos como expectativa de vida do brasileiro, aquele que nasceu em berço esplêndido ou soube construir o seu, adentra a década dos 80 já distanciado dos menos afortunados. Só aí está o nosso putativo protagonista com um ganho de oito anos de sobrevida. Nada mal. Porém, chega a hora dos anos que se seguem tornarem-se menos generosos, sendo a probabilidade que nesta década derradeira 90% dos sobreviventes encontrem o seu fim.

A partir desta constatação, somente o mais distraído dos homens não se dará conta que acaba de atravessar o Rubicão. Tendo por horizonte, não a conquista de impérios mas sim a abdicação definitiva. Esta cognição nada tem de adversa ou deprimente. Pelo contrário, seguindo um sábio dito medieval inglês, “a visão do patíbulo aguça a mente”*, recebe o homem esta singular dádiva, aquela de meditar sobre o que foi, como foi, e como remediar; como reconstruir o que por volição ou imperícia terá destruído na sua passagem. Recebe este bem aventurado, o pré-aviso à muitos negado, buscando, nestes  derradeiros passos, fazer, oferecer, agradecer e perdoar.


*The sight of the gallows sharpens the mind



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