Sem dúvida, são
muitas as datas importantes que povoam a vida do homem. Certamente a
mais importante é a data do nascimento (entre em cena a
insubstituível mulher); sem ela nada existe. A partir deste ponto
inúmeras efemérides (êta palavrinha feia) salpicam a vida do
individuo (meninas, vocês estão incluídas).
Chegando aos vinte
anos, é a glória para os adolescentes, doidos para serem homens
crescidos, mal sabendo da enrascada que estão se metendo. Aos trinta
vem a constatação que papai não está mais ajudando, e que, ou
você se vira ou vai ficar falando sozinho na hora de pagar pra
ver. Aos quarenta o mínimo admissível é uma boa posição
profissional, com respeitável contribuição à Fazenda Nacional, a
menos que tenha optado pela parte perdedora da operação Lava Jato.
Aos cinquenta, ou é o
Grande Bacana ou pode esquecer de sustentar a mais perfeita maquina
de consumo jamais inventada: a mulher. Ainda, arrastado pela
inevitabilidade dos gastos crescentes, a ânsia de status
(antigamente chamado de importância) cabe ao homem a potencialização
geométrica, não dos pães, mas do seu cash flow (salário, para
os menos afortunados). Belas moças, carros variando entre bólidos e carruagens imperiais,
moradias construídas e decoradas de forma a superar àquelas que
invejam, helicópteros e outras manifestações explícitas englobam
os prêmios esperados. É o ápice da auto-gratificação,
a ser acentuado, ratificado e ampliado na chegada dos sessenta e, a
seguir, os setenta. A não ser, é claro, que um súbito ataque de
megalomania, que inclua excesso de cortesãs, de cavalos, de cartas e
de hubris, levem tudo a perder.
Chega-se então à
década terribilis. Até então, as doenças diversas, divórcios
milionários, a gangorra dos mercados e a incúria dos governantes
dão ao sobrevivente o frisson do inesperado, o desafio que aduba o
sucesso dos vencedores. Mas o advento da octogésima década, esta
sim impõe meditação. Pelo menos para aqueles que sabem fazer
contas.
Deixando para traz os 72 anos tidos como
expectativa de vida do brasileiro, aquele que nasceu em berço
esplêndido ou soube construir o seu, adentra a década dos 80 já
distanciado dos menos afortunados. Só aí está o nosso putativo
protagonista com um ganho de oito anos de sobrevida. Nada mal.
Porém, chega a hora dos anos que se seguem tornarem-se menos
generosos, sendo a probabilidade que nesta década derradeira 90%
dos sobreviventes encontrem o seu fim.
A partir desta constatação, somente o mais
distraído dos homens não se dará conta que acaba de atravessar o
Rubicão. Tendo por horizonte, não a conquista de impérios mas sim
a abdicação definitiva. Esta cognição nada tem de adversa ou
deprimente. Pelo contrário, seguindo um sábio dito medieval inglês,
“a visão do patíbulo aguça a mente”*, recebe o homem esta
singular dádiva, aquela de meditar sobre o que foi, como foi, e como
remediar; como reconstruir o que por volição ou imperícia terá
destruído na sua passagem. Recebe este bem aventurado, o pré-aviso à
muitos negado, buscando, nestes derradeiros passos, fazer, oferecer, agradecer e
perdoar.
*The sight of the gallows sharpens the mind
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