segunda-feira, 15 de julho de 2013

Momentos estranhos

Desafiando aqueles que, há trinta anos, afirmariam:  “Não, isto não pode acontecer”,  hoje deparam-se com a mais abrangente vigilância, interna e externa, que o mundo já presenciou. Na trilha do “caso Snowden”, novas revelações aguçam a intranqüilidade que assalta o espírito, levando a conjeturas  sobre a relação entre o Estado e o Cidadão.

No que tange o individuo, vale perguntar se alguém que, por justa indignação,  revela segredos de Estado, sem que o faça para beneficio próprio ou, ainda,  deste ou daquele contratante, é espião ou um rebelde político (whistle blower). Sua prisão será justificável  por razões criminais  ou melhor se enquadraria  na definição de Prisão Política? 

Os segredos revelados escancaram procedimento que seguramente viola o direito dos cidadãos, dentro e fora de fronteiras. Se a escuta e a perseguição eletrônica de criminosos ou elementos enquadráveis no que se chamaria “probabilidade de crime” (probable cause) mereça justificativa, parece ser difícil argumentar que qualquer vocábulo “suspeito”, pronunciado em conversa telefônica ou  na internet dê ao Estado o direito de introduzir-se na vida íntima do cidadão inocente, seja ele Norte Americano, seja ele Brasileiro.  Ora, todas as palavras-chave surgem nas conversas mais inocentes, desde a “bomba” de chocolate, o “extermínio” dos mosquitos no jardim,  às referências ao “terror” de filme de Drácula.  Em suma, a intrusão “a priori”  fere frontalmente o direito do cidadão inocente à privacidade. 

Quanto aos efeitos sobre as nações, são eles os mais inquietantes. O New York Times, jornal renomado, acima de suspeita, revela a escuta ubíqua a que se submete a sociedade. Esta invasão, sob a supervisão de tribunal secreto, ainda segundo o diário mencionado, não mais se restringe ao combate ao terrorismo, mas já avança para o combate ao tráfico de drogas e à lavagem de dinheiro.  Da-se, assim,  o que é de mais natural no comportamento dos homens ou de grupos; a permanente procura pelo expansão de seu poder. Novos crimes são incorporados, novas  palavras-chave são criadas e a rede de escuta se amplia, cercando o cidadão com as escuras paredes desta  moderna Inquisição

Quanto tempo levará para que se amplie a lista negra ? Até que ponto, aqueles que criticam o crescente cerceamento individual, poderão eles  ver-se envolvidos em represália? Quando chegará a vez do “crime político”, da opinião discordante? Quanto mais ampla a cobertura dos serviços de Inteligência  maior a multiplicação das “palavras-chave” captados na internet e ao telefone,  terminando por abranger o léxico universal. Não existe dúvida quanto à capacidade de disseminação da cultura Americana, como também é fácil prever-se que, lastreada na expansão incontida da tecnologia, chegará a vez dos outros países incorporarem, como válida e justificável,  a invasão do pensamento  individual. Daí ao Estado Totalitário é um pequeno passo.


Em nome da Segurança perde-se a Liberdade. Double  speak, já  dizia Orwell.

Nenhum comentário: