As semanas que decorreram do golpe que derrubou o presidente
Mursi não trouxeram a tranqüilidade para o Egito. Também não contribui para a
tão necessária estabilidade do conflagrado Oriente Médio. A derrubada de um
presidente democraticamente eleito e, ainda, pouco antes de eleições
parlamentares que reforçariam ou abrandariam a força do primeiro mandatário, renova
as tensões que há tanto mortifica o Oriente Médio.
Sem dúvida, o presidente Mursi pecou por promulgar decretos
que intranqüilizaram as minorias, ainda que dentro dos limites da nova
Constituição, aprovada por referendum popular. Aguçou discordâncias e intranqüilizou
segmentos da população, ainda que dentro dos limites legais. Não foi hábil,
porém presidia legalmente o país.
Sua derrubada, contudo, era previsível. Ao levar a Irmandade
Muçulmana ao poder provocou a ira de Israel e a disfarçada oposição de seu
aliado incondicional, os Estados Unidos. As monarquias da região juntaram-se aos
opositores, financiando os partidos oposicionistas, tendo por única exceção o Emirado
do Qatar.
O exército Egípcio, um misto de Força Armada e Conglomerado
econômico, tornou-se, a seguir, o
instrumento para a deposição, para o golpe militar. Dependendo do fluxo
bilionário provindo de Washington para sua existência hermafrodita, ampliando
arsenais e capitais, cedeu, sem grande constrangimento, à necessária traição do General Sissi. Assim, poder e
riquezas foram assegurados, mantendo os enormes benefícios para a casta uniformizada
que domina o país.
O que importa agora é o desdobramento desta aventura. A
Irmandade Muçulmana, conquistando após o golpe o apoio dos demais partidos de
viés Islâmico, representam o maior grupo político do país, chegando perto da
maioria. A repulsa cívica manifestada poderá degenerar em conflito armado e
eventual guerra civil, ou, bem inversamente, mergulhar aquela nação nas trevas
de prolongada ditadura.
O rompimento do processo democrático trouxe a seus instigadores a perda da liderança moral, levando os Estados
Unidos. a posição comprometedora. Quem não se lembra do discurso de Barack
Obama no Cairo, onde defende a instauração da democracia no Oriente Médio, nas
barbas do ditador Mubarack? Hoje, constata-se não passar de farsa, costurada com
os interesses imediatos, sem curar pelas conseqüências que hão de vir.
A peça teatral que ora se processa em Washington e na Casa
Branca seria motivo de risadas, não
fosse o assunto tão sério. A recusa de definir o golpe como golpe, seguida de
explicação que não é um não-golpe, desafia a credibilidade dos mais crédulos, e
desmoraliza os autores de tais (não)explicações.
Já, Israel, mergulhado em prudente silêncio, regozija-se com
a dêmise da Irmandade, irmão maior do Hamas, seu incômodo vizinho. Feliz estará
com o retorno do exercito Egípcio ao comando daqueles soldados mais interessados em enriquecer e
subjugar. É mais um cheque em branco que
recebe a jovem nação para manter o domínio, em continua expansão, sobre aqueles
seculares vizinhos que lhe tolhem os passos.
Quanto às outras monarquias da região, podem elas suspirar
aliviadas, tranqüilas no exercício de seus discretos regimes de força, enquanto
recebem do rico amigo o caudal inesgotável que fortalece seus soldados, seus
policiais e seu poder absoluto.
Para o observador experimentado, tudo que vai acima é
perfeitamente normal, pois segue os princípios que regem as nações: o seus interesses.
Estes por vezes mais aparentes do que reais, mais imediatos do que permanentes.
Contudo, a débito das demais nações não
comprometidas, como o Brasil, vê-se na
crescente hostilidade entre o Ocidente e o Islã promessa gratuita de futuro intranqüilo. O circulo vicioso já criado caminha para a irreversibilidade. A cada ação corresponde uma
reação, a cada violência outra é cometida.
A democracia parecia ser o antídoto, mais não o é. Não
quando quem ganha não agrada.
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