terça-feira, 31 de outubro de 2023

A Terra Santa e Seus Pecados


A parte branca representa a população Árabe ao longo dos anos.

Preliminarmente, justo dizer-se que o ataque perpetrado pelo Hamas  contra a população civil israelense merece repúdio. Atingir civis é indesculpável e só pode ser considerado como terrorismo. No foro íntimo sente-se a agressão de civis, adultos e crianças, como se pessoal fosse. Sejam eles Judeus, sejam eles Palestinos. 

Contudo, torna-se necessária à compreensão geopolítica dos eventos que levam à atual tragédia, observando com a perspectiva necessária que lhe permita a compreensão de tão longo conflito. Como consequência necessário é lembrar-se ser a faixa de Gaza uma prisão a céu aberto onde 2,5 milhões de homens, mulheres e crianças vivem enclausurados por décadas sem crime ter sido cometido. Este fato não pode ser ignorado ou minimizado. Torna-se fator relevante, se não preponderante,  na análise da evolução da violência naquela região.    

Israel, como carcereiro daquela urbe, habitada por 2,5 milhões de civis não deveria se surpreender com reações violentas dos encarcerados. 

Certamente, uma visão histórica mais ampla favorece uma compreensão do tão complexo conflito entre Palestinos e Israelenses, entre Árabes e Judeus. Porque tal persistência no ódio que separa as duas raças e as duas crenças? 

A Palestina, dominada e administrada  pela Grã Bretanha desde a derrota do Império  Otomano em 1918, era, na época, habitada majoritariamente pelos Árabes. A reversão teve seu início quando do movimento Sionista nos anos pós Primeira Guerra Mundial, dando substância ao conceito de retorno dos Judeus à região. Conquanto o Sionismo era na sua essência pacífico e de viés socialista, desenvolvendo os kibutzim em relativa harmonia À mesma época também teve início dos movimentos terroristas  judaicos, Irgun¹ e Stern². Estes cometeram inúmeros atentados e assassinatos em busca violenta da criação de um Estado Judeu. Dentre estes, destaca-se a explosão do Hotel King David ferindo e matando 91 hospedes e empregados. O responsável pelo ato terrorista, Menachen Begin, líder do Irgun, tornou-se, anos mais tarde, presidente de Israel.  

Tanto os Ingleses dominantes quanto os Árabes majoritários foram constantemente fustigados, como método necessário ao domínio judaico da Palestina. Ainda que tais tentativas à época fossem infrutíferas,  já, com o término da 2a. Guerra Mundial quando o sofrimento do povo Judeu nas mãos Nazistas foi conhecido a opinião das potencias Ocidentais reverteu³, evoluindo para a criação do Estado de Israel.

Por resultado ocorreu marcante alteração populacional na região que hoje abriga os limites do  Estado de Israel, revelando a expulsão do povo Palestino que lá preponderava a partir da Diaspora da população judaica imposta pelos Romanos no Século 6 AD. Ou seja, faziam 15 séculos que a maioria Árabe dominava a região, condição revertida pela política e pela força em menos de 54 anos (1946 a 2000).   

Apoiada pela nações Ocidentais como reação e compensação aos imensos sofrimentos da etnia Judaica durante a 2a. Guerra Mundial, a criação da nova Nação recebeu apoio quase unânime, porém com a abstenção da Grã Bretanha³. Esta, então dominante na região, previa conflitos e instabilidade face à  contestação da população Árabe já habitando a região e amplamente majoritária.

Uma vez criado o Estado de Israel, realizou-se a expulsão da maior parte dos Palestinos residentes em Israel aterrorizados por práticas de "limpeza étnica", encenando uma versão árabe da Diaspora judaica. Muitos instalaram-se na Cisjordânia vizinha. Em sentido oposto, iniciou-se crescente atividades terrorista por parte dos  Árabes. Criava-se, assim, o quadro  que perdura até os dias de hoje.

Tem-se hoje na região, uma configuração étnica altamente instável, cuja normalidade só poderá será atingida pela concessão à ambas a partes territórios de inquestionável soberania. Este conceito já fora criado pelas Nações Unidas quando da emergência de Israel. Contudo, em clara aliança, Estados Unidos e Israel impediram os esforços necessários ao cumprimento da  decisão majoritária. 

A celebração do Acordo de Oslo 2 em 1995, na presença de Bill Clinton, celebrado por Shimon Perez, Isaac Rabin e Yasser Arafat foi frustrada pelo assassinato do então Primeiro Ministro de Israel, o General Isaac Rabin, pelo extremista israelense Ygal Amin. Destituídos os Palestinos de sua esperança de autonomia, reestabeleceu-se naquelas terras a opressão e a reação, ambas entregues à violência. 

    

O quadro acima Israel revela uma condição anômala por ser o Estado Ocupante, tendo sob sua responsabilidade o bem estar de sua população. Por outro lado, tem-se a severidade da ocupação israelense onde as mortes violentas de parte a parte refletem domínio e reação. Ainda, tornando-se Israel, por sua recém aprovada constituição um Estado Judeu e não mais laico, terá por efeito pressionar as outras etnias e religiões, acentuando diferenças potencializando hostilidade. 
A interrupção deste círculo vicioso torna-se imperativo para a Paz mundial, pois um conflito hoje geograficamente  contido poderá, por seu conteúdo religioso, alastrar-se no Oriente Médio e alhures. O bom senso demanda a intervenção das grandes potências em novo esforço de paz na região. Um novo "Acordo de Oslo" se impõe, onde Israel e o Estado Palestino dar-se-iam as mãos sob o beneplácito imprescindível dos Estados Unidos.



1) (Encyclopedia Britannica) Irgun committed acts of terrorism and assassination against the British, whom it regarded as illegal occupiers, and it was also violently anti-Arab. Irgun participated in the organization of illegal immigration into Palestine after the publication of the British White Paper on Palestine (1939), which severely limited immigration. Irgun’s violent activities led to execution of many of its members by the British; in retaliation, Irgun executed British army hostages. On July 22, 1946, Irgun blew up a wing of the King David Hotel in Jerusalem, killing 91 soldiers and civilians (British, Arab, and Jewish). On April 9, 1947, a group of Irgun commandos raided the A
rab village of Deir Yassin (modern Kefar Shaʾul), killing about 100 of its inhabitants.

2)According to Yaacov Shavit, professor at the Department of Jewish History, Tel Aviv University, articles in Lehi (Stern) publications contained references to a Jewish "master race", contrasting the Jews with Arabs who were seen as a "nation of slaves".[47] Sasha Polakow-Suransky writes that "Lehi was also unabashedly racist towards Arabs. Their publications described Jews as a master race and Arabs as a slave race." Lehi (STERN) advocated mass expulsion of all Arabs from Palestine and Transjordan,[48] or even their physical annihilation.[49]

3) Porém, a Grã Bretanha, profunda conhecedora das conflitantes correntes raciais e culturais na região, optou por abster-se quando da votação nas Nações Unidas concedendo a criação do Estado de Israel.


segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Avaliação de um "expert" sobre o conflito Israel/Palestina




Transcrevo abaixo artigo do renomado comentarista internacional Thomas L. Friedman publicado no New York Times de hoje, 22 de outubro,  sobre o conflito Hamas-Israel. Friedman, habitualmente ferrenho defensor de Israel, oferece uma visão estratégica que avalia as consequências da posição Israelense. 




                                                           Morally Impossible Situation  

I have great admiration for how President Biden has used his empathy and physical presence in Israel to convince Israelis that they are not alone in their war against the barbaric Hamas, while trying to reach out to moderate Palestinians. Biden, I know, tried really hard to get Israeli leaders to pause in their rage and think three steps ahead — not only about how to get into Gaza to take down Hamas but also about how to get out — and how to do it with the fewest civilian casualties possible.

While the president expressed deep understanding of Israel’s moral and strategic dilemma, he pleaded with Israeli military and political leaders to learn from America’s rush to war after Sept. 11, which took our troops deep into the dead ends and dark alleys of unfamiliar cities and towns in Iraq and Afghanistan.

However, from everything I have gleaned from senior U.S. officials, Biden failed to get Israel to hold back and think through all the implications of an invasion of Gaza for Israel and the United States. So let me put this in as stark and clear language as I can, because the hour is late:

I believe that if Israel rushes headlong into Gaza now to destroy Hamas — and does so without expressing a clear commitment to seek a two-state solution with the Palestinian Authority and end Jewish settlements deep in the West Bank — it will be making a grave mistake that will be devastating for Israeli interests and American interests.

It could trigger a global conflagration and explode the entire pro-American alliance structure that the United States has built in the region since Henry Kissinger engineered the end of the Yom Kippur War in 1973.

I am talking about the Camp David peace treaty, the Oslo peace accords, the Abraham Accords and the possible normalization of relations between Israel and Saudi Arabia. The whole thing could go up in flames.

This is not about whether Israel has the right to retaliate against Hamas for the savage barbarism it inflicted on Israeli men, women, babies and grandparents. It surely does. This is about doing it the right way — the way that does not play into the hands of Hamas, Iran and Russia.

If Israel goes into Gaza and takes months to kill or capture every Hamas leader and soldier but does so while expanding Jewish settlements in the West Bank — thereby making any two-state solution there with the more moderate Palestinian Authority impossible — there will be no legitimate Palestinian or Arab League or European or U.N. or NATO coalition that will ever be prepared to go into Gaza and take it off Israel’s hands.

There will be no one to extract Israel and no one to help Israel pay the cost of caring for more than two million Gazans — not if Israel is run by a government that thinks, and acts, as if it can justifiably exact its revenge on Hamas while unjustifiably building an apartheidlike society run by Jewish supremacists in the West Bank. That is a completely incoherent policy.

Alas, though, a senior U.S. official told me that the Biden team left Jerusalem feeling that while Prime Minister Benjamin Netanyahu of Israel understands that overreach in Gaza could set the whole neighborhood ablaze, his right-wing coalition partners are eager to fan the flames in the West Bank. Settlers there have killed at least seven Palestinian civilians in acts of revenge in just the past week.

Meanwhile, U.S. officials told me, the representatives of those settlers in the cabinet are withholding tax money owed the Palestinian Authority, making it harder for it to keep the West Bank as under control as it has been since the start of the Hamas war.

Netanyahu should not allow this, but he has trapped himself. He needs those right-wing extremists in his coalition to keep himself out of jail on corruption charges.

But he is going to put all of Israel into the jail of Gaza unless he breaks with those Jewish supremacists.

Unfortunately, the senior U.S. official told me, Israeli military leaders are actually more hawkish than the prime minister now. They are red with rage and determined to deliver a blow to Hamas that the whole neighborhood will never forget.

I understand why. But friends don’t let friends drive while enraged. Biden has to tell this Israeli government that taking over Gaza without pairing it with a totally new approach to settlements, the West Bank and a two-state solution would be a disaster for Israel and a disaster for America.

We can help, we can even insist, that our Arab and European allies work to create a more effective, less corrupt and more legitimate Palestinian Authority in the West Bank that, after some transition in Gaza, could help govern there as well. But not without a fundamental change in Israeli policy toward the PA and the Jewish settlers.

Otherwise, what began as a Hamas onslaught against Israel has the potential to trigger a Middle East war with every great power and regional power having a hand in it — which would make it very difficult to stop once it started.

In the first week of this conflict, the supreme leader of Iran and Hassan Nasrallah, the leader of the Hezbollah militia in Lebanon, appeared to be keeping very tight control of their militiamen on the border with Israel and in Iraq, Syria and Yemen. But as the second week has gone on, U.S. officials have picked up increasing signs that both leaders are letting their forces more aggressively attack Israeli targets and that they might attack American targets if the United States intervenes. They smell the logic of how much an Israeli invasion of Gaza could help their goal of driving America out of the whole region.

On Thursday, a U.S. Navy warship in the northern Red Sea shot down three cruise missiles and several drones, apparently launched by the pro-Iranian Houthi militia in Yemen, that might have been headed toward Israel. More missiles, likely from pro-Iranian militias, were fired at U.S. forces in Iraq and Syria.

So many rockets are now coming from the pro-Iranian Hezbollah militia in South Lebanon that we are one degree away from a full-scale missile war between Israel and Iran’s proxies — and very possibly directly between Israel and Iran.

Israel is not likely to let Iran use its proxies to hit Israel without eventually firing a missile directly at Tehran. Israel has missile-armed submarines that are probably in the Persian Gulf as we speak. If that gets going, it’s Katie, bar the door.

The United States, Russia and China could all be drawn in directly or indirectly.

What makes the situation triply dangerous is that even if Israel acts with herculean restraint to prevent civilian deaths in Gaza, it won’t matter. Think of what happened at Gaza City’s Ahli Arab Hospital on Tuesday.

As the Israeli columnist Nahum Barnea pointed out to me, Palestinian Islamic Jihad achieved more this week with an apparently misfired rocket “than it achieved in all of its successful missile launches.”

How so? After that rocket failed and fell on the Palestinian hospital in Gaza, killing scores of people, Hamas and Islamic Jihad rushed out and claimed — with no evidence — that Israel had deliberately bombed the hospital, setting streets ablaze across the Arab world. When Israel and the United States offered compelling evidence a few hours later that Islamic Jihad accidentally hit the Gaza hospital with its own rocket, it was already too late. The Arab street was on fire, and a meeting of Arab leaders with Biden was canceled.

If people cannot talk openly and honestly about a misfired rocket, imagine what will happen when the first major Israeli invasion of Gaza begins in our wired world, linked by social networks and polluted with misinformation amplified by artificial intelligence.

That is why I believe that Israel would be much better off framing any Gaza operation as “Operation Save Our Hostages” — rather than “Operation End Hamas Once and for All” — and carrying it out, if possible, with repeated surgical strikes and special forces that can still get the Hamas leadership but also draw the brightest possible line between Gazan civilians and the Hamas dictatorship.

But if Israel feels it must reoccupy Gaza to destroy Hamas and restore its deterrence and security — I repeat — it must pair that military operation with a new commitment to pursue a two-state solution with those Palestinians in the West Bank and Gaza ready to make peace with Israel.

The hour is late. I have never written a column this urgent before because I have never been more worried about how this situation could spin out of control in ways that could damage Israel irreparably, damage U.S. interests irreparably, damage Palestinians irreparably, threaten Jews everywhere and destabilize the whole world.

I beg Biden to tell Israelis this immediately — for their sake, for America’s sake, for the sake of Palestinians, for the sake of the world."


sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Palestina, Israel e Desdobramentos

                                                                                         

                                     Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas

                                                                        

                                                                

Ao propor oportuna e substancial resolução ao  Conselho de Segurança das Nações Unidas (vide abaixo), este sob a presidência do Brasil, a diplomacia brasileira, reconhecendo a urgência na interrupção do conflito e na interrupção das crescentes mortes de civis em Gaza, propõe imediato cessar fogo.  Obtendo a proposta brasileira a maioria dos votos do colegiado, confrontou-se com o veto dos Estados Unidos, o qual assegura a continuação da carnificina de inocentes não combatentes bem como a destruição da estrutura assistencial da região. Como razão para seu Veto, Washington alega a não menção no documento do direito de Israel em defender-se. 

No entanto, ao responsabilizar o Hamas pelos atos terroristas, o texto proposto e aprovado implica no reconhecimento de Israel defender-se, porém dentro dos limites que protejam a população civil. Ora, abolir-se este conceito abriria as portas aos bombardeios indiscriminados de colégios, hospitais e residências civis. A versão norte americana de Direito de Defesa não pode tonar-se um "cheque em branco" outorgado pelas Nações Unidas.    

Assim, a proposta brasileira, condenando o terrorismo do Hamas foi a forma diplomática de atender o desejo da Washington e viabilizar a aprovação da proposta. Se aprovada, milhares de vidas seriam poupadas, tanto palestinas quanto israelenses. Contudo, não foi aceita por Biden.

Por consequência, justo duvidar-se da coerência do veto norte americano ao optar pela continuidade do perigo que ora paira sobre civis inocentes e infraestrutura essencial. Biden assume forte risco ao aliar-se em surpreendente intimidade com Bibi Netanyahu lançado em represália excessiva segundo a lei internacional.

Face a este cenário sanguinário, alto será o preço politico de rejeitar solução que o interrompa. Contudo, vale buscar-se na iminentes eleição presidencial norte americana  a razão para tal comportamento. Pressionado pela  ascensão da candidatura Trump, por um lado, e pela identificada rejeição à sua avançada idade, Joe Biden, em seu apoio ostensivo e incondicional a Israel, parece buscar os 3,5 milhões de votos da comunidade Judaica que lhe dariam a margem necessária à vitória.

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Veja a impecável resolução do Brasil com a aprovação pela maioria do Conselho de Segurança das Nações Unidas, em seguida vetada pelos Estados Unidos.

  • Condena toda a violência e hostilidades contra civis e todos os atos de terrorismo;
  • Rejeita e condena inequivocamente os ataques terroristas hediondos feitos pelo Hamas em Israel a partir de 7 de outubro de 2023, além da tomada de reféns;
  • Determina a liberação de todos os reféns, zelando pela segurança, bem-estar e tratamento humanizado de acordo com o Direito Internacional;
  • Urge que todas as partes cumpram suas obrigações de acordo com o Direito Internacional, incluindo legislações internacionais de direitos humanos, relacionadas com a condução de reféns, relacionadas com a proteção de civis e estruturas civis, bem como trabalhadores da área humanitária, e para permitir e facilitar acesso a suprimentos e serviços necessários àqueles que precisam;
  • Urge fortemente pela provisão contínua, suficiente e desimpedida de bens e serviços à população civil em Gaza, incluindo eletricidade, água, combustível, comida e suprimentos médicos, destacando a obrigação, em linha com o Direito Internacional, de garantir que os civis não fiquem privados de objetos indispensáveis para a sua sobrevivência;
  • Determina a suspensão da ordem para que civis e equipes da ONU deixem todas as localidades no norte de Gaza e na cidade de Gaza para a região Sul da Faixa de Gaza;
  • Determina pausas humanitárias para permitir acesso humanitário total, rápido, seguro e desimpedido de agências humanitárias das Nações Unidas, da Cruz Vermelha e de outras organizações humanitárias imparciais, além de encorajar a criação de corredores humanitários e outras iniciativas para levar ajuda humanitária aos civis;
    • Destaca a importância de um mecanismo de notificação humanitária para proteger estabelecimentos da ONU, de todos os centros humanitários, além de garantir o translado de enviados;
    • Determina o respeito e a proteção de todos os profissionais da saúde e de ajuda humanitária que atuem exclusivamente em atividades médicas, bem como seus meios de transporte e equipamentos, assim como hospitais e outros estabelecimentos médicos;
    • Enfatiza a importância de evitar repercussões na região e, neste contexto, apela a todas as partes para que exerçam a máxima contenção e a todos aqueles que têm influência sobre elas para que trabalhem em prol deste objetivo.

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Aqui e Agora



Ao longo das décadas as sociedades aceleram sua capacidade de gerar e multiplicar riqueza. Não mais se destacam aqueles poucos milhardários cujas vidas serviam de estímulo, ou inveja, aos ambiciosos de todas as classes. Hoje tem-se a multiplicação da riqueza graças ao conhecimento e o salto tecnológico, assim ampliando os mercados e a exploração das oportunidades. Porém, a prudência não segue este ritmo, nem a ética o acompanha.  

Conquanto muitas das grandes fortunas se devem à extenso investimento e longa maturação como se observa nas fortunas industriais, sua incidência no quadro geral se vê paulatinamente reduzida, cedendo espaço e volume às opções de rápido retorno.

A crescente sofisticação e eficácia dos instrumentos de apoio, vide o computador, à tomada decisão vem gerando  na sociedade um novo conceito comportamental, onde o objetivo no curto prazo se sobrepõe à longa maturação, assim gerando a ansiedade comportamental em busca do imediato. Estimula-se, também, a fragilização da ética, esta levada no roldão à riqueza.

Tal efeito se observa na abrupta queda na venda de livros, onde o fator tempo, o de sua leitura, vê-se a substituição pela gratificação imediata das redes sociais. Mais grave , ainda, reflete-se no comportamento político da Nação, onde o imediatismo das decisões parlamentares, de hábito voltadas para atender interesses grupais, levam à ineficiência a prazo médio e longo.

Ainda mais grave é o desmonte das instituições, onde tem-se o exemplo da atual manipulação política visando a fragilização do Supremo Tribunal Federal. 

Hoje, ao garantir-lhes a Constituição a vitaliciedade,  garante-se, também, a opção dos Ministros pela imparcialidade, protegidos que são das manobras políticas para sua recondução.

Ao vingar a proposta parlamentar de retirar-se a vitaliciedade dos Ministros  do Supremo, abole-se  a visão de longo prazo e do interesse nacional de suas decisões judiciais, tornando-os meros peões políticos em perene busca de sua indicação ao Tribunal, estes prontos a pagar o preço por tão poderoso cargo.

Quanto menor for o prazo de permanência no STF, maior será o preço, seja em favores, seja em cambalacho, pelo cargo ambicionado. A vaga cobiçada tornar-se-á mera mercadoria de livre curso, desmontando, em curto tempo, a estrutura judicial do Brasil.

Estamos diante de iminente ameaça institucional que, caso prospere levara a Nação à poça fétida do subdesenvolvimento político e moral.       

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

O Complexo e o Simples



O importante texto a seguir reflete tanto a atual realidade quanto a tendência modernista da crescente simplificação da comunicação verbal e escrita que ameaça o pensamento e sua transmissão. Esta simplificação tem, por vezes, um conteúdo ideológico, onde o "simples" adquire valor da inclusão "democrática", rejeitando o complexo como o apanágio dos privilegiados. A ver...   


“O QI médio da população mundial, que sempre aumentou desde o pós-guerra até ao final dos anos

 90, diminuiu nos últimos vinte anos. É a inversão do efeito Flynn.
Parece que o nível de inteligência, medido pelos testes, diminui nos países mais desenvolvidos. 

Pode haver muitas causas para este fenómeno. Um deles pode ser o empobrecimento da linguagem.
Na verdade, vários estudos mostram a diminuição do conhecimento lexical e o empobrecimento da 

linguagem: não é apenas a redução do vocabulário utilizado, mas também as subtilezas linguísticas 

que permitem elaborar e formular pensamentos complexos.

O desaparecimento gradual dos tempos (subjuntivo, imperfeito, formas compostas do futuro, 

particípio passado) dá origem a um pensamento quase sempre no presente, limitado ao momento: 

incapaz de projeções no tempo.
A simplificação dos tutoriais, o desaparecimento das letras maiúsculas e da pontuação são exemplos 

de "golpes mortais" na precisão e variedade de expressão.
Apenas um exemplo: eliminar a palavra "signorina/senhorita/mademoiselle" (agora obsoleta) não 

significa apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover involuntariamente a 

ideia de que entre uma menina e uma mulher não existem fases intermediárias.
Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e 

menos capacidade de processar um pensamento. Estudos têm mostrado que parte da violência nas

esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de descrever as emoções em palavras.
Sem palavras para construir um argumento, o pensamento complexo torna-se impossível.
Quanto mais pobre a linguagem, mais o pensamento desaparece.

A história está cheia de exemplos e muitos livros (George Orwell - "1984"; Ray Bradbury - "Fahrenheit 

451") contam como todos os regimes totalitários sempre atrapalharam o pensamento, reduzindo o 

número e o significado das palavras.
Se não houver pensamentos, não há pensamentos críticos. E não há pensamento sem palavras. Como

construir um pensamento hipotético-dedutivo sem o condicional? Como pensar o futuro sem uma 

conjugação com o futuro? Como é possível captar uma temporalidade, uma sucessão de elementos no 

tempo, passado ou futuro, e a sua duração relativa, sem uma linguagem que distinga entre o que 

poderia ter sido, o que foi, o que é, o que poderia ser, e o que será depois do que pode ter acontecido, 

realmente aconteceu?

Caros pais e professores: Façamos com que os nossos filhos, os nossos alunos falem, leiam e escrevam. 

Ensinemos e pratiquemos o idioma nas suas mais diversas formas. Mesmo que pareça complicado. 

Principalmente se for complicado. Porque nesse esforço existe liberdade.
Aqueles que afirmam a necessidade de simplificar a grafia, descartar a linguagem dos seus "defeitos", 

abolir géneros, tempos, nuances, tudo que cria complexidade, são os verdadeiros arquitetos do 

empobrecimento da mente humana. Não há liberdade sem necessidade. Não há beleza sem o 

pensamento da beleza."


Christophe Clavé¹

 

1) CHRISTOPHE CLAVÉ, Professeur de stratégie & management, INSEEC SBE (AGEFI)1