terça-feira, 5 de outubro de 2021

A lâmpada de Aladim


Somente um dinossauro nostálgico se posicionará contra os avanços da tecnologia, seja no campo financeiro, seja nos demais ambientes. O atual avanço tecnológico oferece condições de ampliar, acelerar, coletar,  absorver, analisar as informações relevantes de qualquer problema mensurável.

Porém, a tecnologia também lembra a "lâmpada de Aladim", cujo mal uso leva à caminhos insuspeitos e nem sempre desejados. De acentuada complexidade para o público leigo, tais inovações anunciam e propagam suas vantagens, ainda que também possam tornarem-se armadilhas.

Dentre outras, de inegável relevância é o surgimento da Moeda Virtual. Hoje, intermediários financeiros, incluindo até então respeitáveis bancos,   oferecem aos investidores (poupadores, sonegadores e especuladores) fundos de investimento lastreados nestas "ativos". Na realidade, não se trata de uma ativo real, na habitual concepção da palavra, mas, sim, de um "ativo abstrato", pois se embasa em formula matemática alheia a qualquer referência à valor bem como despido de qualquer lastro.

Leia-se, trata-se de "moeda" fictícia (vide Monopólio¹) sem qualquer valor intrínseco e destinada à perda total de valor, real ou putativo, terminado o jogo. E quando será o final do jogo que hoje rege estas "moedas"? A permissão, pelas autoridades financeiras, de que se promova publicamente a busca e captação de poupança popular para investimento em ativo abstrato que caracteriza a moeda virtual, aproxima-se da irresponsabilidade criminal.

Ora, dir-se-á que após a abolição do lastro-ouro que outrora sustentava o "dollar" norte-americano, o valor, ou cotação, das moedas perderiam seu parâmetro específico, entregues às oscilações da subjetividade. Não muito diferente dos Ethereum ou Bit Coin... 

Contudo, o valor fungível das moedas nacionais estará intimamente ligado ao desempenho econômico, financeiro e político, sendo sua emissão compatível com a atividade financeira da país emissor. Nação  estável nestes quesitos resulta em moeda estável. O inverso também ocorre. Transformar ou equiparar  a moeda virtual a ativo fungível redundaria em desorganização monetária e descontrole no seu estoque.  

Ainda, do ponto de vista sócio-econômico, a moeda virtual é uma ficção, pois nada cria e em nada contribui para a sociedade. Enquanto a moeda tradicional  é um instrumento de viabilização de comercio e investimento, ou seja, criação de riqueza, já a cripto-moeda é um fim em si mesmo, sem consequência produtiva. Sua "personalidade" como instrumento financeiro é estéril. Em nada contribui para o beneficio da sociedade.

Ao aumentar sua disseminação como instrumento pseudo financeiro, crescente número de "investidores" e de recursos fragilizam a estabilidade da economia como um todo   uma vez que, no momento em que se constate "estar o rei nu", as perdas econômicas podem transformar-se em catalizadores depressivos de impacto multiplicador. Se assim for, justo indagar-se onde estavam as autoridades monetárias ao autorizar tamanha especulação?

Se por uma lado a moeda nacional é essencial ao desempenho eficiente de uma economia, tanto dentro quanto fora de fronteiras, um "bit coin" em nada contribui para a riqueza nacional pois ampara, no anonimato, uma riqueza subterrânea, protegida da sociedade e do fisco. Uma riqueza que não contribue para com a responsabilidade que todo o cidadão deve à sociedade.

Escondida atrás do"glamour" tecnológico e inovador e, até hoje, merecendo guarida irresponsavel das autoridades monetárias mundiais, que lhe dedicam "vista grossa", dá-se livre e crescente curso à um instrumento que, longe de beneficiar a sociedade, promete causar-lhe grave dano no futuro.   

A inevitável adoção de regras limitadoras e constrangedoras às moedas digitais  pelos Bancos Centrais e agências tributárias  mundo afora, estas respeitando suas obrigações para com a isonomia financeira e fiscal essencial à qualquer ente político-social,  prenuncia  crescentes prejuízos para tais especuladores e para a sociedade em geral. 

Quanto mais tardar a correção de rumo maior será a dimensão do dano.


 1) Jogo sobre especulação imobiliária,  muito popular em meados do Século XX, onde imóveis eram negociados pagando-se em moeda fictícia.

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