quinta-feira, 22 de agosto de 2019
The Big Bully
É no recreio que os alunos conhecem seus colegas. Na hora da aula as personalidades são contidas, tanto pelo estudo quanto pelos professores. Quando soa a campainha e as filas se espalham pelo pátio chega o choque de realidade, a hora da verdade. Revelam-se os espertos, os "de vagar", os leais, os malandros, os malvados. E conhecem também, muito a contragosto, o Bully; o fortão que tem, acima de tudo, o direito ao que quer, direito validado pela dimensão do seu tamanho, do seu muque.
É a primeira aula de política aplicada que a criança recebe: o perigo e a preponderância da força bruta, ao mais fraco a conveniência e a necessidade da conciliação, a prudência da fuga e, para os sortudos, a descoberta da "atitude" que também pode ser chamada de "força psicológica". Nela, muitos fracos contiveram a força bruta, mas aí é outra história...
Voltando ao Bully, observamos que esta figura evolui ao longo da vida, alimentando-se do sucesso quando não confrontado, revelando uma personalidade imperiosa, onde sua vontade e interesse a tudo supera, onde a conciliação é sinal de fraqueza.
E constata-se que, no cenário internacional, ninguém preenche esta "persona" melhor do que Donald Trump. O seu "pátio escolar" é o planeta, onde, tendo por apoio a imensa força dos Estados Unidos, atropela os legítimos interesse de outras nações. Ignora ou despreza tratados assinados que, fruto de concordância entre as partes são descartados, desaguando em novas e leonianas condições.
Neste ano e poucos meses de seu mandato, Trump intimida a minuscula Honduras, humilha a Dinamarca, estimula o Brexit hostil, rasga o tratado do NAFTA, ofende as Nações Unidas ao abandonar a UNESCO e o tratado ambiental de Paris, renega o acordo que regula armas nucleares, descarta unilateralmente o tratado anti-nuclear com o Irã, e declara guerra tarifária à China.
Desta forma o presidente norte-americano, tendo por argumento sua força inconteste, fragiliza as regras que regem o Ocidente e seus parceiros, construídas a partir do fim da 2a. Guerra Mundial, e, ainda, fragiliza a harmonia politica e comercial vigente no planeta desde a derrubada do Muro de Berlim.
Pois bem, à este singular e impulsivo indivíduo, Jair Messias Bolsonaro atrela, imprudentemente, a politica externa do Brasil. E mais, como seguindo seu mestre, adota comportamento anti-diplomático contrário aos interesses do país. Em sequência preocupante, o Presidente vem ofendendo chefes de Estado europeus em momento que seu apoio nos é necessário tanto no campo dos investimentos essenciais à retomada econômica brasileira quanto nas negociações que devem formalizar e implementar o acordo Europa-Mercosul.
Ainda, levar o Brasil à uma aliança militar com os Estados Unidos, país em guerras permanentes, revela uma incompreensão do quão importante é ter o Brasil protegido por uma atitude determinada, pacífica e ativa nos foros internacionais. Um desvio destes princípios exporá o Brasil à iniciativas do interesse de seu recém aliado. não necessariamente alinhadas aos interesses nacionais. Não convêm ao Brasil tornar inimigos os que hoje não nos ameaçam, em nome de uma aliança, onde o desequilíbrio de poder, de objetivos, e de comportamento junto à comunidade internacional mais nos afasta do que aproxima.
Contrariamente ás posições norte americanas nos assuntos abaixo:
a) não tem o Brasil qualquer contencioso com a China. Pelo contrário, trata-se do nosso maior parceiro comercial e maior fonte de investimentos nestes últimos anos.
b) o comportamento equidistante de nossa Chancelaria no conflito Israel-Palestina em nada nos prejudica junto às partes enquanto nos beneficia comercialmente junto à Israel.
d) a relação comercial e diplomática com a Rússia nos é benéfica.
e) qualquer conflito armado com a Venezuela traria perigo imediato e instabilidade futura na fronteira norte do Brasil.
f) a participação brasileira na OMC tem sido, historicamente, do interesse nacional.
Em suma, no campo internacional, não existe plena convergência. No cenário comercial somos não raro concorrentes.
Sem dúvida, a amizade Brasil-Estados Unidos é imprescindível aos interesses nacionais. Nos é benéfica politica e comercialmente. Porém, não se deve confundir aproximação e entrosamento com as obrigações implícitas numa aliança militar. Em quadro internacional onde o Brasil não tem inimigos, tal aliança trará mais desvantagens, leia-se, perigos, do que benefícios, podendo, assim, fragilizar a segurança nacional..
Porém, nada parece explicar a lamentável e incompreensível ausência do Chanceler Ernesto Araujo. É neste momento que a notável experiência dos quadros diplomáticos brasileiros devem ser mobilizados. Porém, como se tais acontecimentos nada tivessem a ver com o Itamaraty, hoje tão omisso quanto nos maus momentos do passado recente, somente o silêncio emana da outrora excepcional instituição.
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