De hoje à posse do novo presidente, muita coisa acontecerá, seja seguindo a atual tendência que se observa, seja revertendo-a face à obstáculos insuspeitos.
No memento, contudo, a
evolução do processo de transmissão da Presidência parece bem
encaminhado. Jair Bolsonaro, contrariando expectativas de muitos, não
mais parece tão dogmático. Pelo contrário vem dando sinais de
flexibilidade, reconhecendo que muitas das idéias que nortearam sua
campanha, merecem revisão.
Tratando-se de política
externa, parece ter recuado quanto ao reconhecimento de Jerusalém
como capital de Israel. Recebeu um choque de realidade ao conhecer a
reação negativa do Egito que, em companhia dos demais países
árabes, respondem por quantidade importante das exportações
brasileiras. Também, deve ter sido aconselhado pelos profissionais
do ramo que ao Brasil não interessa ignorar a lei internacional,
conforme estabelecida pelas Nações Unidas, uma vez que nela terá o
país guarida quando confrontado por estados que lhe superem política
e economicamente.
As boas relações com
Israel devem prevalecer, como ora ocorre. O
reconhecimento de Jerusalém como
capital não é exigência para que assim
continue. Ainda, a mesma relação construtiva deve se aplicar
aos países árabes, mantendo e aprimorando as condições atuais.
Quanto ao Mercosul, o
novo governo não deve desprezar os benefícios políticos e
econômicos que propicia ao Brasil, ainda que muito deva ser feito
para aprimorara e ampliar o alcance potencial desta aliança. Tudo
indica que o presidente eleito pretende adotar uma política
construtiva.
Agora resta à
Bolsonaro a escolha de um ministro que possua a experiência, a
maturidade e o profundo conhecimento do que seja a mais conveniente
política externa brasileira.
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As linhas acima
escritas o foram na véspera da designação do futuro Chanceler, o diplomata
Ernesto Araújo.
Embasado nas
informações obtidas em entrevistas concedidas e textos por ele publicados, algumas observações tornam-se convenientes.
Sem dúvida o currículo
do futuro ministro revela um carreira de sucesso, atuando em nações
de primeira grandeza e, ainda, aperfeiçoada por posto nas Nações
Unidas. O fato de ainda não ter comandado missões e, portanto, não
ter alcançado o posto de embaixador não impede que venha exercer
com competência o comando do Itamaraty.
Já, suas declarações
à imprensa ou os textos de sua publicação revelam uma
predisposição ao pensamento enfático, senão radical.
Sua divisão do mundo
entre um Ocidente a ser protegido contra as ameaças que parecem
advir das regiões euro-asiáticas, suscita indagação quanto à sua
razoabilidade, uma vez que da Ásia provém fluxos comerciais e
financeiros essenciais à prosperidade do Brasil. Tanto a China quanto
a Rússia hoje representam dois polos de poder político-econômico que não devem ser
ignorados nem hostilizados.
Sua declarada admiração
pelo presidente Trump (que acaba de impor, unilateralmente, tarifas
ao Brasil) e pelo filósofo (auto didata segundo o próprio) Olavo de
Carvalho, talvez o melhor expoente da visão maniqueísta, sugere uma
visão impositiva que, se implantada no âmbito das relações
internacionais, pareceria negar a bem sucedida tradição da
diplomacia brasileira.
Sua declaração ”O
projeto meta-político significa, essencialmente, abrir-se para a
presença de Deus na política e na história” e sua exumação da
obra de Samuel Huntington alertando para o Choque de Civilizações
remete ao período das Cruzadas. O escudo que preconiza em seus
escritos, portando a Cruz e a Espada, se traduz em conflito, mais
adequado ao Ministério da Defesa do que ao Itamaraty. Ora, a razão
de ser da diplomacia é, justamente, evitar-se o conflito.
O diálogo é o mais
eficaz antídoto ao conflito, e o conflito moderno pode tornar-se nuclear.
Não parece ser a hora de experimentos exóticos.
O que o novo Chanceler
defende se reveste, possivelmente, das melhores intenções ainda
que revele um “que” de pre-modernidade. O retorno ao “nós e
eles” e o abandono da globalização no alvorecer do Século XXI parece um passo atrás.
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