domingo, 25 de fevereiro de 2018

O planeta de mau humor

O planeta está de mau humor. Se, por um lado, alguns analistas respeitáveis projetam crescimento econômico global, por outro parecem esquecer que a economia não ignora a política.

Começando pelo mais importante e seguindo a descendente escala de relevância, é justo focar-se nos Estados Unidos da América onde um Donald Trump empolgou o poder. Trump tem se revelado impulsivo, colérico, mentiroso e xenófobo. Adicione-se, racista. À bem da verdade, sua eleição reflete o apoio de uma importante parcela do eleitorado que, se, por vezes, não as partilhe
plenamente, não rejeita suas preferências. Ora, se estas características pessoais são exercidas pela presidência da nação, difícil sera evitar-se o virus que há de contaminar as decisões que emanem da Casa Branca. E o resultado já se faz observar no cenário internacional.

Os efeitos negativos do isolacionismo que defende se alastra no comércio. Sua visão de negociação, o que chama de “deal making”, lastreia-se na sua preferência pelo “hard power”, o poder impositivo, não o persuasivo. Ao assumir a presidência abortou três tratados comerciais, abandonando uma política que buscava uma crescente rede de interesses comuns.

Hoje, nas Américas, a renegociação do NAFTA. Na Ásia e na Europa, abortaram-se os tratados de livre comércio, o ASEAN, e o de Livre Comércio Transatlântico, o TTIP. Desta forma o governo Trump amputou boa parte de seu “Soft Power”.Seus efeitos fazem-se sentir nos campos político, comercial e militar.

Porém, vê-se, também, na União Européia o crescente germe da discórdia. Tendo a Inglaterra por catalizador, espalha-se o efeito centrífugo. Na sua periferia, naquela parte que menos comunga com o cerne civilizatório da Europa Ocidental formado pela França e a Alemanha, surgem movimentos autoritários na Polônia e na Hungria. Até, mesmo, o Reich do Leste, a Austria, abraça o nacionalismo autoritário reminiscentes de tempos de ditadura.

Ainda, mesmo nas chancelarias das potencias europeias, surge o novo desafio: até onde existe convergência geopolítica entre o velho mundo e Washington. A crescente constatação por líderes europeus que a União Européia deve desenvolver sua própria defesa armada, assim livrando-se de tutela instável de um Trump imprevisível, revela o esgarçamento que poderá verificar-se na própria OTAN, incondicional aliança que até hoje une os dois continentes.

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Do ponto de vista geo-político, a hostilidade que ora se agrava ente os Estados Unidos e a Rússia parece contrária aos interesses Europeus.

À União Europeia, hoje potência econômica e militar, interessa a multi-polarização global, com a abertura dos canais político-comerciais e redução das zonas de influência exclusiva. Neste quadro insere-se a pacificação de suas relações com a Rússia tendo a via comercial por objetivo. Bens de capital e de consumo da Europa, recebendo, no sentido inverso, o fluxo de commodities, onde se destaca o petróleo e o o gaz, com evidentes vantagens mútuas.

A alternativa militar seria impensável. Não existe benefício geopolítico que compense o risco de conflito com a Rússia. A agravar-se o contencioso Washington-Moscou, o espectro da guerra, possivelmente nuclear, colocaria as capitais europeias na mira imediata dos foguetes russos.

Porém, o maior benefício de uma reaproximação da Rússia com o Ocidente seria político. Retiraria
à China a aliança com Moscou, o mais temível dos pactos caso o cenário bélico torne-se realidade.

Do outro lado do Globo, continua a expansão acelerada da China, tanto no campo comercial como político. Tal expansão é frontalmente contrária aos interesses geopolíticos norte-americanos que têm a Asia sob sua influência desde a derrota da Espanha e a conquista das Filipinas. A vitória sobre o Japão, e sua cooptação como aliado tornou inconteste sua preponderância na região.

Hoje, tem-se a China como segunda potência mundial, em vias de tornar-se a primeira a perdurar o ritmo de seu crescimento econômico. Por resultado ter-se-á uma gradual mudança na esfera de influência na região. Já se observa movimento de aproximação com a China tanto pelas Filipinas quanto pela Indonésia.

O acordo de cooperação econômica já celebrado entre a China e países do Sudeste asiático, ASEAN, do qual os Estados Unidos estão excluídos (vide acima), é relevante. Assim, pari passu com sua superioridade militar na região, amplia Pequim o seu Soft Power.

Mas nem tudo serão rosas; No campo político a Coréia do Norte pode servir de estopim para um conflito de crescente proporções. Ainda, um Japão, sentindo-se ameaçado, pode transformar-se de nação pacífica em potência militar, o que parece já estar nas cartas. Ainda, as fronteiras que separa a Índia da China está prenha de disputas menores que podem escalar.

Já no campo comercial, a expansão das exportações chinesas, não raro favorecidas por subsídios excessivos vis a vis os tratados internacionais, deverá gerar crescente retaliação tarifária, muitas vezes já ameaçada por Donald Trump.

Atenção, recém divulgado. Xi Jinping pretende eternizar-se no comando da China. Ainda que hábil e racional, poucos políticos superam os riscos que acompanham a autocracia. Aumenta a nota de imprevisibilidade.  


Vê-se, pois, que o planeta não está tranquilo apesar das promessas de crescente prosperidade.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Intervenção no Rio





A intervenção militar no Rio é bem vinda, desde que sua atuação tenha sucesso. Caso contrário, teremos nossas forças armadas desmoralizadas, e ficaremos sem recurso de última instância no combate ao crime.
Para ter sucesso, as autoridades precisam do apoio da mídia e da cidadania, sem o que o projeto não poderá prosperar. Serão muitas as inconveniências no dia a dia do carioca decorrentes da luta ao crime. Se os jornais e televisão fixarem-se apenas nos detalhes, que serão dolorosos, ignorando a visão maior do bem público, o projeto não vingará.
No quadro militar, a inteligência será pedra fundamental. Também o sigilo. Quanto à tropa, rotatividade deverá ser a norma para que não sofra a intimidade corruptora que decorre da presença constante.
A boa vontade do judiciário será essencial, para manter os criminosos na cadeia, afastados da sociedade, enquanto se aperfeiçoa e executa-se a missão.
Já no prazo médio, investimentos sociais de saúde e educação devem reforçar os objetivos de segurança. A população favelada deve ser libertada de seus algozes mediante urbanização, oferta de serviços, pontos de apoio policial.

Boa sorte, General Braga, e que Deus e São Sebastião protejam o Rio de Janeiro

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Para sair da crise

As eleições presidenciais se aproximam e o horizonte político permanece nublado, incerto. O atual presidente desgasta-se, tentando manter-se acima do nível do castigo, e para tal exaurindo o pouco capital político que lhe resta. Perde, assim, as força necessárias ao cumprimento das reformas essenciais à saúde da economia nacional.

Resultado de imagem para foto de ferroviaAinda, a penúria do erário é tal que nem a manutenção do patrimônio, nem novos investimentos se encaixam no atual orçamento falimentar. Ao inédito desemprego soma-se o mais cruel de todas as inadimplências, o calote salarial e previdenciário. As estratosféricas taxas de juros praticadas pelo sistema bancário retira ao cidadão comum a possibilidade de atenuar, ainda que temporariamente, a agrura dos tempos difíceis. Vê-se, assim, grandes segmentos da classe trabalhadora na escuridão trazida pela falta de meios para sua subsistência. Desta condição resulta a revolta eleitoral contra os poderes vigentes e a busca por salvação na figura do candidato que mais prometer.

Tal descalabro promete ser fatal para as pretensões dos quadros políticos aptos a levar a nação ao bom rumo quando das próximas eleições. A prevalecer a atual tendência descendente, e nada faz prever o contrário, a oposição, qualquer oposição, terá, perante o eleitorado, condições de rejeitar os candidatos ungidos pelo atual poder politico.

São muitas as providências a serem tomadas para assegurar a vitória eleitoral em 2018; dentre elas tem-se a retomada do emprego para que possa reverter a atual anemia que oprime a dita “base aliada”, dando-lhe alguma condição de evitar o avanço das alianças à esquerda.


Nesta linha destaca-se a conveniência de priorizar-se um esforço concentrado em investimento, recuperação e manutenção da infraestrutura de transportes do país, completando e criando novas ferrovias, asfaltando rodovias, modernizando e provendo o acesso aos portos, criando armazenagem e tudo o mais necessário para o eficiente transporte de bens. Tal programa poderá gerar grande massa de novos empregos diretos, mas, também, àqueles indiretos que decorrem do fornecimento de bens e serviços de apoio. Por resultado ter-se-ia melhor integração dos polos econômicos nacionais, a queda de custos no mercado interno, como, também, maior competitividade de nossas exportações e geração de divisas. Em suma, a redução do Custo Brasil.

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Neste sentido, importa lembrar o efeito multiplicador que tais investimentos tiveram no excepcional crescimento da economia chinesa. De forma semelhante, tanto a topografia quanto a demografia brasileira clama pela aceleração de uma integração economicamente eficaz, exigindo a solução ferroviária para as grandes distâncias complementada pela capilaridade de uma moderna e confiável rede rodoviária, tendo o aparelhamento dos portos para o escoamento competitivo de suas exportações.

Para a execução de tal projeto, 120 bilhões de reais poderiam estar disponíveis através da “mobilização” de US$ 40 bilhões das reservas cambiais nacionais. Para tal, far-se-ia pela disponibilização como lastro de US$ 50 bilhões em títulos do tesouro norte-americano, com maturação de 20 a 30 anos, depositados em “escrow”¹ em bancos internacionais, assim permitindo o levantamento de empréstimo no mercado financeiro.

O custo financeiro desta operação seria inferior às taxas cobradas em operações habituais, tendo em vista a excelência da garantia e o seu longo prazo poderia estender-se além dos 20 anos.

Em contrapartida ter-se-ia, ao longo do prazo médio, uma substancial aceleração de receita fiscal decorrente da exponencial melhoria no transporte, distribuição interna e exportação de bens, criando a riqueza compatível à liquidação dos encargos de juros e principal do empréstimo assim contratado. Grosso modo, tais recursos poderiam viabilizar a construção de vinte mil quilômetros de ferrovias e, ainda, construir/pavimentar trinta mil quilômetros e rodovias.

Resta, contudo, importante indagação: teria a entrega em garantia de US$50 bilhões das reservas internacionais brasileiras causar dano à solidez do crédito internacional brasileiro? Não, a solidez creditícia se mantêm. Senão, vejamos: tal redução de reserva não fragilizaria a posição do Brasil perante credores externos uma vez que atenderia aos parâmetros de segurança creditícia exigidas pelas agências financeiras internacionais:
  • as reservas nacionais, líquidas da redução proposta, responderiam por 9,1 vezes o valor de três meses de importação, US$ 36 bilhões, “benchmark” para a proteção às importações.
  • as reservas são 6,6 vezes o “benchmark” de lastro para a divida externa soberana de curto prazo, que oscila em torno de US$ 50 bilhões.
No entanto, imprudente seria ignorar a fragilidade que se evidencia no entorno político brasileiro. Assim como estas reservas designadas podem abrir ao Brasil novas portas para seu desenvolvimento, podem elas, também, se nas mãos e intenções erradas, redundar no seu esbanjamento com irreparável dano ao país.

A executar-se tal plano a sociedade deveria exigir que sua execução deveria submeter-se a procedimentos e fiscalização internacionais, adotando para tal plena transparência operacional e financeira. Ignorar os perigos éticos que, habitualmente rondam todo grande projeto seria, como diria Telleyrand, pire q'un crime, ce serait une faute.

(¹) trata-se depósito irrevogável de titulo em garantia de empréstimo, de acordo com as condições contratadas, sendo sua execução automática.


sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

O Brasil de castigo?


Resultado de imagem para mapa brasil e estados unidosAo longo de décadas, os Estados Unidos tem ignorado a importância do Brasil, tanto no cenário Latino Americano quanto no resto do Mundo. Não parece disposto a investir tempo e recursos em tornar o maior país da America do Sul em aliado unido por indissolúveis interesses comuns.  Talvez por considerar que em momento de estrema necessidade, seu poderio, tanto econômico quanto militar, seria suficiente para fazer com que o Brasil atendesse aos seus objetivos. Assim, a atenção da superpotência para com Brasília  tem sido anêmica.

Vale perguntar-se o que embasa tal desinteresse? Afinal das contas o Brasil reúne, dentre outros, diversos trunfos que contrariam tal desprezo.

  • Extensão territorial que
    • o torna influente em qualquer país Sul Americano
    • projeta sua influência no continente Africano
    • dimensão geográfica e populacional que favorece a tomada de rumo próprio
  • Oitava Economia do planeta onde
    • desponta como a segunda maior produtora de alimentos
    • imensa produção de minerais, supridor das necessidades de grandes “players” internacionais como a China e o Japão
    • mercado de 80 a 100 milhões de consumidores de bens e produtos internacionais
    • autossuficiência energética.

O distanciamento histórico de Washington, que após o projeto fracassado da ALCA, zona de livre, mas nem tanto, comercio se confirmou, só parece ser revisto quando, por razões extremas, vide 2a Guerra Mundial ou a iminente vitória comunista no governo Jango, o interesse pelo Brasil reaparece. Também, a constante relutância do Itamaraty em submeter o Brazil à condições subsidiárias também tem agastado um Departamento de Estado habituado à fácil aquiescência de seus interlocutores latino americanos.

Assim, com acerto, a política externa brasileira tem privilegiado o forum multilateral, onde seus interesses são melhor defendidos, protegidos que se tornam de pressões excessivas de parceiros impositivos. Para o Brasil, as Nações Unidas e as demais organizações ancilares vêm permitindo ao Brasil tratamento equitativo no que tange suas aspirações comerciais e sua proteção política.

Neste quadro, a diversificação do comercio internacional brasileiro vem tendo efeito benéfico, reduzindo o risco de parcerias estreitas e preponderantes. Submete, assim, os diferendos à arbitragem das agências internacionais como a OMC (Organização Mundial do Comércio).

Retornando ao diálogo Norte-Sul, o silêncio é a regra, e revindicações pontuais o interrompe. A recente viagem do Secretário de Estado, Rex Tillerson à diversos estados sul americanos teve por fato mais relevante uma omissão. A não visita ao Brasil como se nada houvesse a dialogar. Como nada é gratuito nas relações diplomáticas, cabe concluir que Washington manifestava sua insatisfação. Mas com o que?

A expansão da presença Chinesa no campo dos investimentos industriais e em infraestrutura brasileira parece ser um deles. Ainda, a negativa, bem fundamentada, do governo brasileiro de disponibilizar a base de lançamento de foguetes em Alcântara talvez seja outro motivo. A preferência pelos caças suecos sobre os jatos norte-americanos, por recusa de transferência de tecnologia, pode-se adicionar à lista. A recusa da venda da Embraer à Boeing, seria ela mais um motivo?

Ou nada disso importa. Apenas, em arroubo imprevisível e desgovernado, Donald Trump achou por bem repetir o feito da Rainha Vitória, quando irritada com a Bolivia, pediu a Whitehall a sua retirada do mapa.

N.R. Após publicação deste artigo foi divulgado pelo N Y  Times a ressurreição da Doutrina Monroe, conforme discurso de Rex Tillerson, antecedendo sua viagem à America do Sul. Alvo: a China.  






sábado, 3 de fevereiro de 2018

Os Estados (Des)Unidos

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Dois protagonistas irados, raivosos foram escolhidos por seus respectivo partidos para disputar a presidência dos Estados Unidos. Já nas discussões entabuladas durante as primárias, a aspereza dos debates iniciais prenunciava a perda de civilidade que haveria de dominar a campanha. A deterioração foi inevitável; já nos últimos dias os insultos não mais eram velados. Hillary Clinton e Donald Trump, quais serpentes venenosas, atacavam-se com fúria e peçonha.

Graças às surpreendentes regras antidemocráticas que regem a eleição presidencial norte americana, Hillary, a vencedora no voto popular amargou a derrota enquanto Trump tornava-se vencedor graças aos votos dos Delegados do Colégio Eleitoral. Assim, todo um sistema construído pelos “founding fathers” para evitar que um desqualificado empolgasse a presidência dos Estados Unidos, tornou-se responsável pela eleição de um Trump. Em vez de permitir aos delegados a livre escolha de seu voto, o livre arbitrio foi substituído pela matematização do proceso; o pretenso filtro tornou-se ineficaz. Elegeu-se o aventureiro.

E agora? Perdedor no processo eleitoral, o Comitê Eleitoral Democrata decidiu impugnar o vencedor através da montagem de um dossiê que comprovasse um conluio do Republicano vitorioso com a nação que mais o norte-americana adora detestar: a Rússia. Para tal foi contratado um duvidoso espião inglês, Christopher Steele, já desligado do MI6 (Foreign Intelligence Office), para buscar elementos incriminadores contra Trump e sua equipe. A prosperar a acusação, o impeachment seria a conclusão lógica.

De fato, as denuncias, verdadeiras ou falsas, atingiram o objetivo de inocular a nação americana com a “febre Russa”. Viralizada com a incessante ajuda da imprensa* ao partido democrata, posição esta formalmente assumida pelo New York Times no início do pleito eleitoral. Diariamente novas acusações e editoriais anti-Rússia enfeitam suas páginas. A reportagem dos fatos, que deveria ser imparcial, parece politizada.

Fast forward. Encostados à parede pelo Investigador Especial Robert Mueller e pelas intrusivas iniciativas do FBI, Trump e seu partido Republicano resolvem contra atacar. O Comitê Parlamentar de Inteligência, de maioria Republicana, promove a divulgação de documento que revela as origens politizadas do processo que ora busca comprometer a equipe do presidente com os desígnios de Moscou. Identifica vazamentos que revelam o ânimo anti-Trump de membros destacados do FBI. Alegam, tanto o Comitê quanto Donald Trump que, havendo tal partidarismo, a investigação estaria comprometida e, portanto, seria inválida.

Panos para mangas e intermináveis discussões. Acusações e demissões no horizonte, incluindo o comando do Department of Justice e do FBI. E no fervor e calor do debate, a verdade torna-se a maior vítima. Um ponto parece destacar-se: até o momento não parece existir o “smoking gun”, a evidência inconteste da propalada interferência russa nas eleições norte-americanas.


* New York Times, Washington Post, CNN, e outros