sábado, 7 de outubro de 2017

Um hospede controverso


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A imprensa noticia que está em andamento,novamente, um tratado entre o Brasil e os Estados Unidos, onde este último instalaria uma base de foguetes em território brasileiro. Mais precisamente, em Alcântara, no Maranhão.

A retomada desta pretensão norte-americana se dá após 16 anos, tendo sido interrompida pelo desastre de “nine eleven”. Naquela ocasião, parte da imprensa se manifestou sobre a séria inconveniência de vir o governo brasileiro, então Fernando Henrique Cardoso, ceder às pretensões de Washington.

Contrariando toda a doutrina de transparência para assuntos que envolvem interesses fundamentais do país, tais conversas vem sendo desenvolvidas do lado brasileiro pelo Itamaraty e pelo Ministério da Defesa em absoluto sigilo, sem que os termos de tal tratado tenha sido divulgado. Porém, em furo de reportagem, o jornal paulista, A Folha, o assunto volta ao conhecimento público. Obteve parcos comentários do Ministro Raul Jungmann e do Coronel Damasceno, Chefe de Gabinete do Ministério da Aeronáutica, cuja defesa pela aprovação do projeto deixa de ser convincente.

Relata-se, abaixo, pontos que parecem relevantes:

A base em questão teria por objetivo, segundo a proposta norte-americana, o lançamento de foguetes portadores de satélites, portanto, enfatizam, para fins pacíficos.

Tendo em vista a sensitividade da tecnologia empregada, revindica a limitação de acesso à base, ficando este restrito, de acordo com as determinações do arrendatário.

A importação dos materiais e equipamentos para a montagem e operacionalidade da base não estará sujeita à inspeção pelas autoridades brasileiras.

Para garantir a inviolabilidade da base, propõe ainda que a mesma seja protegida por pessoal estrangeiro, sob seu exclusivo comando, como se missão diplomática fosse.

Trata-se de projeto que fere os interesses e até mesmo a soberania do Brasil.

De início, a base para lançamento de mísseis, por pacíficos que se proponham, não escapam da característica militar ou para-militar. A interligação entre todas as atividades espaciais terminam por convergir na guerra moderna; comunicação, meteorologia, observação, etc... são, inescapavelmente, funções de interesse bélico.

Ainda, não será permitida às autoridades brasileiras a inspeção dos equipamentos importados. Ainda que fosse autorizada, a inspeção da importação dos equipamentos necessários à sua operacionalidade, fugiria à sua capacidade técnica. A distancia do conhecimento tecnológico que separa os Estados Unidos do Brasil, permitirá ao arrendatário, sempre que o desejar, a inclusão de equipamento com fins militares sem o conhecimento e a compreensão das autoridades locais.

Quanto à proteção do perímetro da base, esta se fará, necessariamente, por elementos visando a sua inviolabilidade, ou seja, por grupamento estrangeiro, este sob comando exclusivo norte-americano. Razoável concluir-se que este contingente, seja ele  militar ou para-militar, o fará em ambiente de extra-territorialidade, violando, assim, a soberania que cabe ao Estado brasileiro. 

A perspectiva histórica não deve ser desprezada no trato deste assunto; importante será avaliar-se o comportamento dos Estados Unidos em tais circunstâncias no exterior.

Inicialmente, justo concluir ser os Estados Unidos um estado guerreiro e agressivo quando na defesa do que considera ser seus interesses. Também, relevante será a avaliação da situação internacional, onde os novos blocos da era post-Soviética formam, por vezes, fronteiras inseguras e mutáveis, gerando conflitos convencionais ou envolvendo o terrorismo. Tais circunstâncias acentuam a necessidade do fortalecimento defensivo e ofensivo das grandes nações, e a consequente instalação de bases dentro e fora de seus territórios. Assim , são elas peças importante na projeção de seu poder, tornando-as vulneráveis à ataques e retaliações.

Seria imprudente presumir-se que, em caso de crise internacional, Washington se ateria a compromisso de atuação pacífica no uso de suas bases. O uso de bases em Guantanamo para a detenção de terroristas, e de outras, em países “amigos”, quando de operações secretas de “rendering”, posteriormente denunciadas pela imprensa norte-americana, refletem a inconveniência do abrigo de bases estrangeiras. Ainda, sob outro prisma, ingênuo seria presumir-se que os eventuais inimigos dos Estados Unidos poupariam tais bases, espalhadas pelo mundo, quando de um conflito.

Assim, a eclosão de crise militar internacional colocaria o Brasil na rota dos foguetes retaliatórios, com ou sem ogivas nucleares, arrastando o país para um conflito que não deseja nem é do seu interesse.

As parcas manifestações das autoridades não abordam os perigos estratégicos de tal projeto. Tratam-no como se mera operação comercial fosse, como nova fonte de recursos para o combalido erário. Chegam ao absurdo de mencionar como vantajoso o aluguel da base por 1,5 bilhão de reais.(1)

Parece ser razoável e prudente concluir-se que o tratado ora proposto para a cessão da base de Alcântara aos Estados Unidos deve ser rejeitado in limine por ferir os interesses permanentes do Brasil no que tange sua política de paz e convívio pacífico dentre as nações. Finalmente, vale buscar-se na sabedoria popular o dito: “não se convida quem não se pode dispensar”. Uma vez instalada, face ao imenso poderio político do arrendatário, mais fácil será sua expansão do que sua remoção.



(1) Insufuciente para pagar os salarios e benefícios do Congresso.

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