Nas grandes recepções oferecidas em
Washington por ocasião da reunião do Fundo Monetário Internacional
e do Banco Mundial,
onde se reunem expoentes
financeiros, empresariais e políticos, proliféram as
indagações quanto ao novo rumo do planeta, e a quem caberá sua
liderança.
A enfase parece centrar-se não tanto para qual pólo irá o
cètro do comando mundial, mas sim, quais as consequências do vácuo
que ameaça instalar-se face à diluição do poderio internacional norte
americano. A indagação não se origina na mente de representantes
da esquerda anti-americana, nem, tão pouco, deste ou daquele analista
Russo ou Chinês. A indagação vem sendo oferecida por respeitáveis
analistas norte americanos, europeus e asiáticos. Dentre estes se
destaca o conhecido Lawrence Summers, colaborador de G W Bush e
Barack Obama, bem como Edwin Truman, anteriormente do Tesouro e
colaborador do atual governo, e outros de ilibada reputação. Seus
argumentos parecem centrar-se no que consideram relevante perda de prestígio dos Estados Unidos perante amigos e inimigos.
Muitos são os fatos que sustentam este questionamento. A
política externa adotada para o Grande Oriente Médio é, em boa
parte, responsável pelo enfraquecimento do gigante. Se possível
fosse escolher um fato seminal que explique o desmonte do castelo
de cartas que representa o atual cáos que grassa naquela região,
escolher-se-ia a trapalhada da primeira Guerra do Iraque quando a embaixadora norte americana ofereceu ao antigo aliado,
Saddam Hussein, o
nil obstat para invasão do Kuwait.
Em evidente reviravolta, Washington levou
seus exércitos a expulsar e punir, mediante severas sanções, o
ditador Iraquiano. A intervenção norte-americana levou os
vencedores, por razões politicas e logísticas, à concentrar tropas
norte-americanas na Arábia Saudita. A presença destes “estrangeiros
infiéis” em solo Saudita, considerada blásfema pelos puristas
Wahabitas, juntou-se a outras contestações, levando um grupo de radicais Sauditas, liderados por
Osama Bin Laden, a planejar e executar o nefasto atentado de Nine
Eleven.
O consequênte lançamento de duas guerras punitivas, contra o
Afeganistão e o Iraque tornaram-se “vitórias de Pirro”, onde
tanto sua tesouraria quanto sua imagem (“Soft Power”) sofreram
enorme dano. No primeiro caso, os Talibãns foram afastados do
governo, emprendendo uma guerra de guerrilha que até hoje persiste.
Já o governo de Saddam Hussein foi deposto, tendo por preço a
destruição econômica do país e sua desagregação política,
caracterizada pelo sectarismo religioso e seu fracionamento
geográfico, dividido entre Xiitas, Sunitas e Curdos.
Aproximadamente 8.000 soldados morreram, e mais de 15.000
foram feridos. Estima-se mais de 200.000 civís iraquianos mortos. Do lado
financeiro, os gastos ultrapassaram todas as expectativas, ecedendo um trilhão de dolares por ano. Ainda, as perdas
colaterais destas decisões hoje incluem o caos instalado na
Mesopotamia e na Síria, o berço dos neo-terroristas do Estado
Islâmico.
Tem sido alto o preço da aliança “incondicional” com Israel
face à continua ocupação militar da Palestina e o ininterrupto e
crescente sequestro das terras do dominado. A aposição do veto
norte americano no Conselho de Segurança das Naçoes Unidas a
qualquer proposição contrária aos interesses de Tel Aviv, retira
de Washington a legitimidade de sua posição, ferindo sua imagem de
defensor dos direitos humanos e da Lei Internacional.
Já, a clivagem interna observada em Washington, entre partidos,
facções e dissidências políticas vêm sabotando a tentativa
meritória de negociar com o Irã o seu afastamento da corrida
nuclear.
Não bastasse a discórdia interna, o Primeiro Ministro de Israel
decidiu participar, in loco, do debate, oferecendo apoio e
argumentos ao partido Republicano.
No cenário Europeu, o contencioso com a Rússia tem por origem a
contínua expansão de OTAN, “pari passu” com o encolhimento da
ex República Soviética. É considerada pelo Kremlin como uma
“política de cerco”. A intolerância Russa para com a
arregimentação de “estados tampão” pelo Ocidente manifestou-se
nos conflitos na Georgia e na Ucrânia. A progressão da aliança
Ocidental nas suas fronteiras é vista como ameaça direta à sua
segurança. Por resultado, a Russia anexou a Criméia e exige a
neutralidade da Ucrânia. A tentativa norte americana de cooptar a Ucrânia revelou
açodamento e desconhecimento da relação das forças políticas
do país. Confrontada com a reação, constatou-se a incapacidade norte- americana de reajir à anexação
da Criméia, lance audacioso de Wladimir Putin. Sugere-se, assim, fragilidade,
tanto na Casa Branca, como no Pentágono e no Departamento de Estado.
No campo de colaboração econômica com a União Européia,
Barack Obama enfrenta séria oposição ao proposto Tratado de Livre
Comércio. Esta resistência provém, não apenas de setores da
oposição Republicana, mas, também, dos sindicatos e de parcelas
consideráveis do estamento Democrata.
No Extremo Oriente, Washington vem perdendo terreno, face à uma
China em contínua expansão tanto nos campos diplomático quanto no
econômico e financeiro. A relutância de Washington em validar o
acordo celebrado pelo qual aumentar-se-ia a participação acionária
no FMI de diversos países, entre os quais os BRICS, levou Beijing a
criar o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura. Até o
momento o projeto já recebeu, apezar da oposição ativa de
Washington, a adesão de mais de 40 países, dentre os quais países líderes europeus.
Observa-se, assim, que são muitos os eventos que alimentam
dúvidas sobre a imutabilidade das forças que hoje dominam o mundo,
e quais as consequências das mudanças por vir.
Referindo-se ao recém-criado Banco de Desenvolvimento Chinês,
Lawrence Summers, ex-presidente da Universidade de Harvard, exclamou: “neste momento os Estados Unidos perderam seu status de
'underwriter' do sistema econômico global”. Os demais campos de
atividade internacional, talvez mereçam semelhante preocupação.