quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Pesadelo




20 de outubro, 2022.

Os jornais de hoje mergulham no embate político, com pouco espaço dedicado às demais matérias.   

Tudo indica que o Segundo Turno que se avizinha terá intensidade inigualável. Em alguns dias a Nação terá que decidir pelo voto quem, entre candidatos tão díspares, será o ungido. Os demais candidatos já caíram  na vala da insignificância face à intensidade ideológica que domina o debate político.

Neste décimo mes de 2022, o quadro emocional é extremado, traz em seu bojo a simplificação das ideias, divididas pelo maniqueísmo; "comunista" de um lado  e "nazista" por outro. O esgarçamento atinge  tanto a elite quanto o lumpen, levando à simplificação do complexo, à descoloração dos matizes,  à redução do pensamento ao mínimo denominador comum. 

No início era discordância, hoje, transforma-se em raiva, violência.  Não mais política, mas pessoal. Ódio nos olhos, na expressão e nas palavras. Nos pensamentos. 

É o Brasil dividido, no povo e nas instituições. A Câmara dominada pelo Centrão tenta salvar os anéis sem perder os dedos. Em pragmatismo rasteiro, compra e vende nacos de poder, ora para um lado do tabuleiro, ora para o outro.  O  Senado, intimidado, oscila entre a disciplina partidária e a opção pelo vencedor. O Supremo, fracionado e desequilibrado pelas novas nomeações, escorrega sem rumo entre exegeses, pareceres e considerações; sob o manto do partidarismo não mais há Justiça.  

Nas ruas, as passeatas se multiplicam, nem sempre pacíficas. Confrontos, agressões, xingamentos dominam o ambiente eleitoral, fazendo prever a contínua escalada da violência. 

As pesquisas eleitorais, hoje publicadas, indicam forte vantagem para a coligação oposicionista. Difícil será a inversão do quadro eleitoral. Os melhores analistas preveem a eleição do  opositor.

24 de outubro, 2022

Conclamados pelas redes sociais, pelas rádios e televisões, o que se inicia como um filete transforma-se, em poucas horas, em caudal humano. Cores de contestação e de apoio salpicam as aglomerações que, pouco a pouco, face às provocações de lado a lodo, tornam-se turbas violentas.

Aos impropérios seguem-se as pedras; no encontro das maltas, agressões físicas.  Caminhões sonoros atiçam cá e lá. Soa o hino nacional, enrolam-se nas bandeiras. O certo e o errado, o errado  e o certo, dicotomia azeda, cega, peremptória.

Soa o primeiro tiro. A vítima se perde na multidão e, súbito,  ressurge nos ombros  de seus companheiros. Faca, porrete, murro e mais tiros. Os slogans reverberam sobre a onda estridente da revolta. 

25 de outubro, 2022

Às 16:00 , as cadeias de rádio e televisão divulgam um pronunciamento:  

"Brasileiros, cidadãos, a insegurança assalta as ruas, ameaça as famílias. As instituições democráticas estão sob perigo. A perseverar o atual estado de anomia, a Lei e a Ordem não mais poderão ser mantidas e garantidas. Assim sendo determinei, com o assentimento das instituições garantidoras da Ordem e Segurança do país, o adiamento temporário do processo eleitoral do país.

Deus acima de todos, viva o Brasil."

26 de outubro, 2022

O Brasil acorda sob profundo silêncio...

   

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Brinkmanship¹




A tradição norte-americana ensina que seus presidentes Democratas tem sido os que mais envolveram o seu país em  guerras.   

Depois da derrota no Vietnam, não mais conquistou vitórias conclusivas; no Iraque, ganhou mais não levou. Hoje, Bagdad não mais obedece à Washington, seguindo seu próprio rumo, em cautelosa  sintonia com o Irã. 

Fracassou quando de sua intervenção na Síria, onde Washington se aliava à várias facções (a Al Qaeda dentre elas!). Neste embate o governo Assad, aliado à Rússia, prevaleceu. E, como último capítulo, deu-se a derrota no Afeganistão, onde inimigos medievais prevaleceram sobre o mais sofisticado exército do planeta.  

Apesar deste histórico, Biden persiste no diálogo ameaçador. Não busca a concórdia negociada entre parceiros,  mas sim um rol de exigências à inimigos, estes bem mais perigosos; no elenco vai-se à China, passando pela Rússia e chegando ao Irã. 

Contudo, Joe Biden hoje enfrenta um Mundo diferente daquele encontrado por seus antecessores mais distantes. O poder dos Estados Unidos, paradoxalmente,  diluiu-se a partir do colapso Soviético, centro de um império expansionista, abrindo espaço preenchido por novos players.

Hoje, tem-se um planeta dividido em quatro grandes blocos géo-politicos: no Ocidente, a America do Norte e a União Europeia; no Oriente, a Rússia² e a China.

O monopólio do Poder, não apenas Poder mas sim o Poder cataclísmico,  não mais pertence à apenas uma Nação. A plena compreensão desta constatação não mais permite o exercício do Poder Hegemônico, ao qual os Estados Unidos se acreditam ungidos. 

Nos dias de hoje, falar-se  em guerra torna-se cada vez mais arriscado. Washington, ao impor sanções e proferir ameaças, aumenta,  gradualmente, a temperatura bélica com estados providos de sofisticado e múltiplo arsenal nuclear.  

Estrategicamente  desequilibrados pelo crescimento econômico da China, por um lado, e pela da recusa da Rússia em submeter-se à expansão da OTAN no limite de suas fronteiras, os Estados Unidos caminham na direção de um contencioso que, se não bem dosado, poderá resultar em conflagração armada.           

A China, país com de um bilhão e meio de habitantes, não tem por opção senão a do desenvolvimento: empobrecer não é opção. Ou o standard de vida de seus habitantes dá um salto quantitativo ou se auto condena à um frágil e espoliada passado e no qual os Estados Unidos está presente. Não será realista supor-se a continuidade da submissão de outrora.

Ao Sul, sua integridade geográfica protegida pela imensidão dos oceanos, lhe permite a segurança contra incursões militares, contendo o risco à dimensão de escaramuças.  Quanto às suas fronteiras ao Norte, graças às boas relações com Moscou, estas não oferecem perigo.  

Porém, uma "linha vermelha", inegociável para Pequim, será  a permanência de Taiwan como "parte da China continental" ainda que sob um governo política e ideologicamente  diferente.   

Já, a  Rússia post Soviética, não mais tendo o antigo poder de conquista além fronteiras face ao duplo handicap que a limita, uma diminuta população (150 milhões) e uma imensidão geográfica a preservar (17,000.000 km²), segue ela a política que poderia chamar-se de Defesa Ativa. Antecipação e audácia são dois fatores prioritários na contenção dos Estados Unidos e da OTAN.

A retomada da Crimeia por Wladimir Putin após a interferência americana na Ucrânia, depondo o presidente pró Russia,  desfez a desastrada doação de Krushchev, cedendo a Crimeia à Ucrânia. Ainda, sua base militar na Síria que controla a aproximação ao Estreito dos Dardanelos, ilustra notável visão estratégica.    

Para o Kremlin, sua maior vulnerabilidade geográfica está nos dois Estados Tampão que hoje protegem, com tempo e espaço, sua fronteira ocidental; a Ucrânia e a  Bielo Rússia.  Assim, Moscou estabelece uma "linha vermelha", cruzá-la levará Moscou à resposta militar.

O elo mais fraco neste mosaico prece ser a União Europeia, que se confronta com uma progressiva perda de unicidade. A deserção da Grã Bretanha pelo Brexit revela um esgarçamento político com o "Continent", passando a compartilhar das prioridades dos "English Speaking People" comandados pelos Estados Unidos. 

Do outro lado do Canal da Mancha, não por acaso, as Chancelarias Alemã e Francesa já planejam a criação do exército Europeu, prenunciando uma alternativa à OTAN no seu atual formato. Um passo inicial na direção da plena autonomia quanto à política externa da UE.

Noutra dimensão, observa-se o gradual e crescente  distanciamento entre o Ocidente Europeu, onde Alemanha e França se destacam, e a Europa Oriental. tendo por protagonistas a Polônia e a Hungria. Diferenças se consolidam tanto no formato político quanto nas prioridades estratégicas. 

Por resultado tem-se uma União Europeia fragilizada na sua coesão política e fustigada pelo crescente conflito de interesse que o maniqueísmo USA-Rússia impõe. Sua estreita vinculação histórica aos Estados Unidos vem, paulatinamente, cedendo aos interesses econômicos que advém da China, onde está seu maior parceiro comercial, e da Rússia, de onde provêm sua maior fonte externa de energia.

Sem manter-se uma plena aliança com a União Europeia, os Estados Unidos terão sua liberdade de ação contida. A  possível neutralização do Velho Continente deixaria desprotegido o flanco norte-americano.

Tempos complicados; basta de Brinkmanship.


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1) Política feita à beira do precipício.

2) Cultura defensiva extremada por ser vulnerável do ponto de vista territorial (invasões sofridas: Mongol, Lituânia-Polônia, Tártaros,  Austríaca, Sueca, Francesa-Napoleônica, Anglo-Francesa, Alemã) 

1) Aos Democratas coube:  Woodrow Wilson, 1917 (Guerra Mundial I) --  Franklin Roosevelt, em 1941 (Guerra Mundial II). Esta foi a última guerra vitoriosa.

A partir desta data, e excetuando o curto conflito --  Harry Truman em 1950 (Coreia) --  John Kennedy em 1959 (Vietnam do Sul) -- Lyndon Johnson, 1965 (Vietnam do Norte).

Como exceção à regra, ao Republicano George W. Bush coube as guerras gêmeas do Iraque e do Afeganistão.  (1)

A operação punitiva ao Iraque em 1990 (George H. Bush), durou apenas 40 dias. O presidente iraquiano Saddam Hussein permaneceu no poder após o armistício.

domingo, 5 de dezembro de 2021

Os Trapalhões



Sem dúvida, o enorme sucesso dos Trapalhões foi merecido. Semanalmente o telespectador acompanhava as peripécias que Didi, Mussum, Dedé e Zacarias enfrentavam. Navegavam os absurdos que lhes surgiam, com humor, esperteza e, por vezes, inocência. Porém, nunca esquecendo que se  tratava de caricatura da vida real onde o despautério pode se tornar a regra do jogo.

Voltando ao presente, o brasileiro se depara com a versão política daquelas trapalhadas. Só que a sério.  A foto acima traz ao público novos Trapalhões, mas estes sem qualquer humor coletivo apesar do seu rictus gargalhante. Traz ela uma imagem desrespeitosa, rastaquera, galhofenta divorciada da persona que todo Homem Público tem por dever respeitar. Mormente quando se trata do Presidente da República e de um futuro Juiz da Suprema Corte.

Governar  o Brasil não é uma festa: é uma imensa responsabilidade. É enfrentar os desafios a pandemia, a pobreza, a recessão e a corrupção que hoje ferem o povo sob sua guarda. Este fatos não fazem rir.  São parte de uma existência que traz crescente angustia e insegurança ao cidadão. 

Nada há contra a alegria. Pelo contrário; para o bem da saúde do cidadão brasileiro é preciso preservar o bom humor, a alegria de viver, a satisfação de realizar. Porém, esta tolerância não se estende a manifestação pública de um regozijo que não encontra sustentação no exercício de sua missão. 

O Presidente é responsável pelo Bem e pelo Mal que decorre de suas ações políticas, esta tendo por base o respeito estrito à Ética e à boa governança.. 

Porém, atentos à fotografia, é fácil constatar que se desenrola um projeto de debilitação do Estado Laico predeterminado pela Constituição. Esta determina que um Ministro do Supremo seja pessoa de ilibada reputação e notável saber jurídico, cujas decisões sejam pautada pelas leis dos Homens e não das Divindades.

Pari passu à aprovação do Senado à candidatura de André Mendonça ao Supremo, a imprensa divulga  entrevista concedida por Robson Rodorvalho, líder Evangélico e íntimo do círculo presidencial. Nela desnuda-se um conteúdo político-religioso onde aflora a ambição de poder, tanto pessoal quanto sectário.

Argumenta o Pastor entrevistado que, representando o conjunto evangélico 30% (sic) dos brasileiros, merece ele idêntica representação no Congresso e nos Tribunais, tanto nas instâncias subalternas quanto no Supremo Tribunal Federal.  Argumenta o  Pastor:  "Porque o espaço (atual) não condiz com a nossa representação (sic) de 30% da sociedade brasileira." (!!!)

Ora, tal afirmação tem por indesejável efeito tornar uma confissão religiosa como se partido político  fosse, sendo sua abrangência, não resultante das urnas, mas, sim, decorrente de uma incidência demográfica.  Por consequência ter-se-ia a subordinação da Lógica pela Crença. 

Trazer a Religião para a Política é um retrocesso civilizatório só encontrado em Nações ainda manietadas pelo atraso. Vale lembrar os povos reféns da religião predominante, dentre estes, diversos países Muçulmanos.