terça-feira, 31 de agosto de 2021

A derrota impensável

                                                                           Adeus 

                                                          

Hoje, 31 de agosto de 2021, o presidente  dos Estados Unidos vem a público se vangloriar pela eficiência demonstrada ao administrar a sua retirada de uma guerra  de 20 anos! Quase uma fuga, deixando aliados afegãos e incontável equipamento no campo de batalha.  "On aura tout vu!".

Mas são dois os derrotados; o colosso norte americano e a sociedade afegã que,pela segunda vez em sua longa existência adotou o estilo de vida Ocidental. Os Estados Unidos terão dias melhores pela frente, já os entregues aos vencedores teem diante de si um futuro negro onde riqueza e vida estão em jogo. 

É trágico ver-se a preocupação da imprensa sobre a sorte das mulheres afegãs condenadas ao retorno ao obscurantismo e semi escravidão da  Sharia¹. No entanto, já em 1979, faz uns 40 anos, a mulher afegã já tinha conquistado esta liberdade. 

A instalação em 1978 de um novo governo em Cabul, sob a égide da Rússia, teve por resultado a extinção das leis islâmicas, tornando o governo laico e dando o primeiro passo na emancipação feminina. Não mais seria ela sujeita à ditadura masculina, recebia o direito ao estudo, à profissão, à vestimenta que bem lhe aprouvesse. Tinha ganho sua liberdade pois nem as leis distributivistas comunistas foram adotadas. O programa de auxílio vindo de Moscou financiava tanto estradas quanto escolas, e o novo exército Afegão.

Porém, após 14 anos de sua implantação, este projeto de inegável modernização desmoronou graças aos imperativos da Guerra Fria, onde as populações nada mais eram do que peças descartáveis no Grand Game face às prioridades geo-politicas.

Assim, formou-se a aliança dos Estados Unidos da América, cooptando os "mujahedin"² que reuniam os guerreiros engendrados pelas crenças medievais e na treva ideológica. Por um lado estes davam suas vidas quando necessário enquanto eram financiados e municiados pelos cofres da CIA. 

Vitorioso, o governo Talibã seguiu seu rumo sem que os mestres de política externa em Washington, conhecidos pela sua miopia, previsse a intrínseca incompatibilidade que condenava a perenidade de tal aliança. E assim foi. Os Talibãs, aliados a Bin Laden, este executor  da tragédia das Torres, o óbvio revelou-se (oxymoron?). Washington e Cabul eram inimigos, não aliados. 

Vinte anos depois, esta triste história, que não parece ter fim, encerra um importante capítulo. Relata a derrota do moderno pelo medieval, do impulsivo pela resiliência, do racional pelo ideológico, da riqueza pela vontade. Qual o rescaldo político dentre aliados e inimigos potenciais?  Qual a confiabilidade dentre os atuais e futuros protagonistas?

A meditar... 


1. Lei islâmica

2.Guerreiros islâmicos


      

Ò tempora, o´mores

Ó tempora, ó mores!

"Até quando seremos forçados a viver tempos deploráveis?" perguntava-se Cícero, pergunta-se  o cidadão João  Silva.


Colapso da Justiça - Lava Jato desmontada, Lei da Improbidade. Não mais prisão na 2a. Instância.

Colapso da Educação - Nos níveis primários e a corrupção intelectual das redes sociais

Colapso da Política - O assalto do Centrão ao poder em aliança com o Executivo

Colapso da Diplomacia - A perda de respeito que o Brasil sofre perante a comunidade internacional.

Colapso da equidade social - A brutal concentração de renda, relegando as camadas pobres à                                                                 subsistência precária

Colapso da segurança pública - A contaminação política na Polícia Militar.

Colapso da segurança do Estado - A politização do Exército

Colapso do auto respeito e do orgulho nacional.  

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Por resultado tem-se a entronização do cinismo e do auto proveito. 

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

O debacle Afegão


O General Eisenhower já dizia: "Os Estados Unidos não devem se envolver em guerras terrestres na Ásia". O tempo tem dado razão ao velho General/Presidente. Voltando ao passado. os diversos conflitos no Oriente  não resultaram em vitória desde a guerra contra o Japão. Em todos os casos custaram, em vidas e dinheiro, muito além do esperado.

No conflito com os Japoneses, em três anos  41 mil militares americanos morreram e 145.000 foram feridos. Não fosse o uso de duas bombas atômicas, a perda de soldados  americanos teria ido muito além. A campanha na  Coréia resultou em empate após a entrada do Exército Chinês no conflito. No Viet Nam foi uma  derrota americana, com mais de 50.000 GI's mortos e 200.000 feridos. No Iraque, o que parecia ser um "passeio" custou a vida de 4000 soldados e dezenas de milhares feridos, tanto física quanto mentalmente,

Já a guerra no Afeganistão, perto de  3500 americanos morreram e 20.000 resultaram feridos. Já, seus aliados afegãos tiveram  mais de 60.000 mortos. Estima-se 50.000 Talibãs mortos. Além destas baixas humanas, custou aos Estados Unidos  mais de dois trilhões de dólares. 

Tivesse Washington, em 2001, usado uma modesta parcela deste enorme capital lastreando um  esforço diplomático junto às lideranças Talibãs, visando a expulsão, ou até mesmo a prisão de Bin Laden, qual teria sido o resultado?  Por outro lado, ao preferir o recurso ao ultimato, na presunção da eficácia de uma cirúrgica operação militar, deixou o Talibã sem opção política. Por consequência iniciou-se uma guerra que durou vinte anos com um país não longe da Idade da Pedra (excluindo-se os Kalashnikov). 

Por outro lado, não se pode desprezar o fato que o fanatismo esposado pelos Talibãs e a justa indignação dos Estados Unidos tornava difícil, senão impossível, chegar-se a um acordo racional.

E qual terá sido o resultado da mais longa  guerra empreendida pelos Estados Unidos? Se visto pelos olhos norte-americanos, estarão seus interesses naquela região mais protegidos hoje do que em 2001? A resposta parece ser negativa.  Uma análise post conflito sugere forte redução da influência de Washington na região, esta de considerável importância geopolítica. 

A perda de suas bases militares no Afeganistão reduz significativamente sua eficácia militar ao norte do Oceano Índico, abrindo as portas para uma aliança mais eficaz entre a China e o Paquistão, assim impondo à India, que oscila entre a neutralidade e o engajamento como Estados |Unidos, mais um fator de contenção. 

Ainda, se desfaz o obstáculo militar americano à um movimento político-militar da Rússia na direção Sul, influente que é na região dos "Stãos".¹ Aproxima, também, Moscou à Teerã e à Islambade, ambos seus antigos clientes na corrida armamentista e no sentimento antiamericano.

O Irã, além da perda de prestigio americano, ve-se livre da vizinhança de tropas americanas em sua fronteira Leste. Quanto aos perigos que a vitória Talibã lhe traria, este não parece ser excessivo, um vez qua sua população Xiita pouca empatia tem com os Talibã Sunitas. 

O Paquistão se vê livre da ingerência norte-americana  para aprofundar sua influência junto aos Talibãs, lhes permitindo melhor contrariar pretensões da India, sua inimiga, junto ao  governo de Cabul. Inversamente, à India a derrota norte-americana anula um aliado na região, reduzindo as vantagens antes vislumbradas.

A China vê-se entre dois dilemas. A proximidade de sua província do Xinjiang, de população muçulmana, corre o risco de contaminação do radicalismo religioso.. Porém, excluídos os americanos do Afeganistão, suas ações ativas ou passivas de contenção ou ação ganham mais liberdade. Maior cooperação econômica compensará boicotes esperados do campo Ocidental. 

A Rússia exulta com a saída norte-americana, pois livra seu "underbelly"¹ de uma presença incômoda, onde bases americana teriam grande importância estratégica. Por outro lado tal benefício de curto prazo não elimina o  perigo de ter um Islã fundamentalista infiltrando-se nas nações "tampão"¹ que lhe protege ao sul de suas fronteiras.  Porém, na soma algébrica de seus interesses, o saldo parece positivo. 

Mas como ficam os aliados da OTAN, muitos dos quais juntaram-se à empreitada norte-americana. Grã Bretanha, França, Alemanha e outros europeus? Qual o balanço humano, militar, político? Como agirão face à uma ocorrência militar futura  em que suas tropas sejam cooptadas sob o comando norte-americano?   

Resta a pergunta: as brasas que ainda ardem nas relações dos dois beligerantes poderão reacender-se? Até que ponto a instauração de um regime brutal não insuflará a indignação Ocidental? Afinal, o poder aéreo americano pode obliterar o inimigo, inviabilizar a  nação Pashtun. 

O "animus beligerandi" não  parece ter sido extirpado da atitude de Washington, ao vedar a transferências dos 10 bilhões de dólares em  reservas cambiais depositadas em seus bancos a pedido de Cabul? Resta, também, a repatriação dos "hospedes" de Guantanamo, etc...etc...  E como agirão no futuro aqueles estados periféricos que se aliam à grande potência ao risco de serem abandonados à própria sorte?

E assim continua o Xadrez internacional. Uma nova partida está para começar, onde os Estados Unidos perde importante peça uma vez que o Afeganistão também é uma das portas de acesso ao âmago da Euro-Ásia, a maior massa terrestre do planeta Terra. Abre o caminho à China, que através de sua Belt and Road, inicia a conquista do rico corredor que conecta a Europa, a Rússia (um continente per se) o Oriente Médio e a Ásia.

Este corredor terrestre inaugura uma alternativa para a outrora essencial rota marítima, onde as potências Ocidentais (vide Estados Unidos e Grã Bretanha) exerciam o seu domínio e estabelecia o pedágio econômico e militar para o acesso ao Oriente. Não mais, O jogo está mudando.  

(1) Uzbequistão, Quirguistão, Casaquistão, Turquemenistão, Tajiquistão. 










domingo, 15 de agosto de 2021

Reset na Política Externa


                                                                            O Itamaraty na sua origem

A correção de rumo da politica externa brasileira vai demorar. O retorno ao respeito conquistado pelo Itamaraty ao longo dos lustres passados, que abrangem os tempos do Império, tardará.

Hoje, o Brasil esta diplomaticamente isolado dos relevantes blocos de poder.

Por resultado da política externa abraçada pelo Governo Bolsonaro, o Brasil se encontra sem aliados politicos, conta, apenas, com parceiros comerciais. Tendo colocado todas suas fichas no tabuleiro de seu alter-ego, Donald Trump, o Tenente/Capitão teve por efeito destruir o já feito e descurar do à fazer.

A junção de duas condições, a ignorância e a ideologia, move montanhas. Na direção errada. O "guru" Olavo de Carvalho, contaminando a prole Bolsonaro bem como seu patriarca, infiltrando-se no Itamaraty, teve por resultado a desconstrução da diplomacia brasileira visando uma "tabula rasa" denominada "terra-planismo". Tiveram sucesso, às custas da nação.

Ao dividir-se o planeta em zonas relevantes  pode-se observar que as relações brasileiras estão prejudicadas nos principais polos de poder; os Estados Unidos, a União Europeia, a China. 

A incúria ambiental do governo Bolsonaro tem prejudicado suas relações internacionais tendo em vista a importância da Amazônia no âmbito global, tornando o Brasil o principal vilão. Com se não bastasse, do ponto de vista bilateral, as relações com o governo Biden estão arreganhadas pelo apoio subserviente ao seu antecessor, Donald Trump, e pelo tardio reconhecimento de sua vitória eleitoral pelo presidente brasileiro.

Quanto à aceitação da União Europeia ao tratado proposto pelo Mercosul, este encontra forte resistência liderada pela França, a maior competidora regional no setor agrícola europeu.

Já, as relações com a China, de insuperável importância para a economia brasileira, são elas continuamente fustigadas pela liderança brasileira, seja por pronunciamentos inamistosos, seja pela recusa de dar andamento ao projeto 5G de inegável interesse brasileiro. 

Contudo, a bem vinda luz ao fim do túnel surgiu com a "demise" de Ernesto Araújo, hoje substituído por um Chanceler "normal"; porém, muito falta para otimizar os tradicionais canais político-comerciais. Onde buscar a complementariedade internacional?  Nas relações do Brasil com os demais países, quais os objetivos mútuos, quais as alianças que o favorece, quais os países concorrentes cujo poder e ação podem ajudar ou  tolher as metas nacionais?   ...e por aí vai...

Estas indagações formam o pano de fundo sobre o qual deverá o Brasil buscar recompor, tanto a intensidade quanto a qualidade necessárias ao "reset" de suas relações com os Estados Unidos de Joe Biden. O Presidente Bolsonaro terá que reinventar-se, abandonando suas preferências ideológicas e  subordinando-as à realidade, dentro de um quadro de respeito mútuo.

A recente visita ao presidente brasileiro por Mr. Jake Sullivan, funcionário do Conselho de Segurança norte-americano revela forte assimetria no campo protocolar. Foi um mal sinal que sugere a atual fragilidade nas relações entre os dois países.

A mensagem trazida por este emissário, como se bonus fosse, de eventualmente incluir o Brasil ao tratado da OTAN em troca de retomar o governo brasileiro a imprescindível proteção ambiental levanta sérias dúvidas, uma vez que não fica claro qual o benefício oferecido. Pelo contrário, pareceria trazer previsível  ônus.

A conveniência ou inconveniência de vir o Brasil participar em aliança bélica, que visa interesses  distantes e alheios ao Brasil, acende uma luz de Alerta. Vale lembrar que a política militar de Washington vem sendo fonte de incontáveis dissabores e arrependimentos, arrastando consigo uma plêiade de aliados frustrados. 

É chagada a hora de vir Jair Bolsonaro, com a devida assessoria, cortar o Nó Górdio causado por  ilusória política externa, embasada em ficção e que, por resultado, colheu  a animosidade internacional. 

Não é possível  refazer os laços com esta comunidade senão derrubando muralhas e construindo pontes.



terça-feira, 3 de agosto de 2021

FUNDO ELEITORAL




O debate sobre o Fundo Eleitoral chama a atenção da opinião pública: como justificar o gasto de recursos públicos, estes já exauridos, para auxiliar a eleição de deputados e senadores? Qual o raciocínio que justifica tal gasto como sendo do interesse do processo eleitoral e da democracia? 

Porque o Governo leva a Nação à despesa equivalente à  5,6 bilhões de reais (1 bilhão de dólares!) neste Fundo quando prioridades sociais, tais como saúde, ensino, transporte clamam por recursos para suprir endêmicas insuficiências em áreas prioritárias ao cidadão? Para ilustrar o despropósito, faz poucos dias o Ministro de Economia sustou a verba de 2 bilhões de reais necessários ao IBGE para compilação dos dados que sustentam as políticas públicas do país.

Não há como justificar tamanha generosidade ao estamento político, a não ser que o poder concedente, liderado pelo Presidente da República, dele espere reciprocidade, senão subserviência,  para seus projetos políticos. Ainda, até que ponto está imensidão de dinheiro será destinado ao interesse comum ou terá uma função distributiva dentre os políticos.   

Ilustrando a falta de responsabilidade e bom senso, a pesquisa pelo Instituto de Matemática Aplicada (IMPA)  revela ser o governo brasileiro  "medalha de ouro" no valor da alocação orçamentária em campanha eleitoral. Ocupa liderança inconteste, superando o Mexico e a Coreia do Sul em mais de 100% e os Estados Unidos e outros países europeus  em mais de 50 vezes. 

O conceito de buscar-se nos  recursos orçamentários, estes oriundos dos milhões de contribuintes dentre os quais a esmagadora maioria é financeiramente modesta, gera uma deturpação política. A aplicação destes  recursos durante a campanha eleitoral dificilmente encontrará compatibilidade entre os interesses do modesto doador coagido e o beneficiário final das eleições.   

Ainda, o sistema vigente, ao privilegiar a alocação dos recursos de acordo com o tamanho dos partidos conforme constatado na eleição anterior, parece beneficiar o "status quo" no compartilhamento do poder político. Em vez de facilitar a atualização de novas visões sociais e políticas tendo por base o surgimento de novos fatores que emergem no passar do tempo, engessa-se a evolução.  

De fato, o Cidadão delega ao Estado o direito de manipular seu voto. O passado tem revelado quão inapropriadas são as "jaboticabas" engendradas pelo setor público brasileiro. Este episódio, tanto nos objetivos quanto nos valores envolvidos,  não revela paralelo nos países desenvolvidos. 

Ao ver desta coluna, não deve ser concedido o financiamento das eleições  pelo Estado. Deveria tal  apoio financeiro limitar-se às contribuições do setor privado, pessoas, empresas e sindicatos,  obedecendo limites quantitativos e sujeitas à plena transparência conforme ocorre em outros países respeitáveis. Aos políticos, que busquem o reconhecimento público na aprovação de seu comportamento pessoal e político.