sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Manifest Destiny

Seria a Hipocrisia um biombo ao qual grandes potências recorrem quando suas iniciativas imperiais atropelam os limites da Lei Internacional?  Ou, ainda, seria ela mais uma arma política das nações poderosas como justificativa de suas ações dominadoras? Até que ponto este "jogo de espelhos" dá ao perpetrador a roupagem da respeitabilidade atribuindo, "urbe et orbi"o ônus do malfeito ao adversário?.

Dentro de quadro político-psicológico caminham as relações internacionais dos Impérios e grandes nações. Não raro, a eles se aplicam as fábulas de La  Fontaine e Esopo, que já ensinavam que o mais forte exerce o seu domínio através da manipulação de falsos argumentos que justifiquem sua prepotência. Quase sempre a raposa fazia de vilão, e por vezes o escorpião,  mas sempre a lebre/coelho eram a vítima de ocasião.

Relevante será a estória da raposa acusando o coelho de lhe poluir a água que do rio bebia. O coelho argumentou que a bebia a jusante do lobo, e portanto não poderia poluí-la. Mas de nada valeu-lhe o argumento. Assim às potencias cabe exercer seu poder; seja qual for o argumento; sempre terá razão em detrimento do mais fraco.   

Envolta em "righteous" manto, a Nação Americana exerce uma política de resultados práticos; mas o que a diferencia das demais potencias é a crença de cumprir ela uma "missão divina", denominada "Manifest Destiny" e de merecer proteção de "In God we Trust". O pathos nacional é o de a todos superar:

"Manifest Destiny, a phrase coined in 1845, is the idea that the United States is destined—by God, its advocates believed—to expand its dominion and spread democracy and capitalism across the entire North American continent." 

Hoje, esta política prevalece, mediante uma diplomacia com matízes impositivos tais como a aplicação de sanções quando possível, e através da guerra, quando necessário.  Assim, tem-se, como parte de seu arsenal conceitual/ideológico, um Estado que, por auto libertar-se de culpa pode cometer graves atropelos.

"Fast forward"  aos tempos atuais, tem-se o conflito político entre os Estados Unidos e a Rússia enfraquecida.  esta uma pálida imagem do que fora a União Soviética, cuja população, capacidade industrial, e forças armadas diluíram-se quando de seu desmonte.  

A partir do governo Gorbashev deu-se a desconstrução do império Soviético, verificando-se inédito apaziguamento político, seguido de desarmamento militar entre as duas potencias. Sob seu comando a União Soviética concedeu a independência à nações a ela  anexadas no tempo de seu Império, voluntariamente enfraquecendo-se política, econômica e fisicamente. Resulta, assim uma nova Russia, pálida versão dos tempos czaristas e comunistas,  perdendo perto de 20% de seu território e mais de 50% de sua população.  

Condizente com o processo de conciliação, o presidente Boris Yeltsin (1991 - 1999) ordenou  a dissolução do Pacto de Varsóvia e o retorno à Russia de seus exércitos, tomando por base promessa do alto escalão Norte Americano de ação recíproca com relação à OTAN. Tal não ocorreu; pelo contrário como se observa abaixo, foi notável a sua expansão:


Yeltsin consolidou-se na presidência, derrotando os resquícios comunistas reforçando, ainda, as relações cordiais com os Estados Unidos, nações outrora inimigas. Em clara  manifestação de entendimento pessoal entre Clinton e Yeltsin, foram celebrados tratados contendo a produção das armas nucleares e permitindo inspeção aérea mútua, assim encerrando o anterior processo de instigação mútua. Visitas recíprocas às suas capitais cimentaram as relações e abriam as portas para um mundo livre da ameaça e desconfiança dominante desde o término da Segunda Guerra Mundial.

Mas não haveria de ser. Os anos seguintes revelaram uma OTAN não abolida; pelo contrário não só manteve sua postura anti-Russia, mas, a partir de 1999 expandiu sua presença nas nações do Leste europeu libertas do comunismo. Ainda, a crescente interferência americana nos assuntos internos russos, inclusive na rebelião da Chechênia,  agastou e terminou por romper os laços de amizade construídos entre Washington e Moscou. 

Sentindo-se novamente ameaçado, Yeltsin designa Wladimir Putin como candidato para sucedê-lo; este eleito, toma posse em  maio de 2000. Excepcionalmente e demonstrando solidariedade, Putin, nos meses que se seguiram à derrubada das torres em 2001, ofereceu auxílio aos Estados Unidos permitindo o uso de suas bases militares em apoio às operações contra os terroristas da Al Qaeda.

Já, em 2008, um novo capítulo de provocação ocorre na Georgia (2008), onde a interferência norte-americana tenta torná-la hostil a Moscou. Não foi bem sucedida. Em 2014 a Secretária de Estado norte americana, Hillary Clinton designa sua subordinada, Victoria Nuland, com a missão in loco  de, em conluio com as forças de oposição, provocar a derrubada do presidente eleito ucraniano, Viktor Yanukovich, próximo à Russia. Por resultado Petro Porochenko o substitue e anula os direitos de cidadãos ucranianos de raises russa, causando uma cisão interna com o apoio de Moscou,  e inicia negociações para a inclusão da Ucrânia na OTAN.      

Hoje, tem-se um conflito que não parece possível ser revertido; extinta a União Soviética, constata-se que a Rússia  em vez de expandir territorialmente fez o oposto, reduzindo seu território. Para tal concedeu a independência à diversas e relevantes províncias anteriormente parte do império russo, sendo elas de relevante contribuição econômica, como o Cazaquistão e o Azerbaijão, ricas em petróleo, minérios e recursos humanos porém, não aceita a presença potencialmente inimiga em suas fronteiras.

Contrariando a imagem expansionista da Russia que prevalece no Ocidente, a perspectiva histórica revela um quadro de enfraquecimento voluntário russo o qual, em vez de pacificar as relações internacionais com os Estados Unidos, como pretendiam tanto Gorbachev quanto Yeltsin, demonstrou uma fraqueza que Washington avaliou como uma oportunidade.

A partir de 1999, promove-se a expansão da OTAN na Europa Central assim impedindo um entendimento duradouro com Moscou. O último capitulo deste confronto decorreu da insistência norte americana para atrair a Ucrânia, fronteiriça à Russia,  para a OTAN. A reação de Moscou foi inevitável conforme opina Kissinger, levando Putin a  cair na armadilha  e cometer o grave erro de invadi-la em vez de seduzir a Alemanha e a França (vide a dependência por energia) para a causa da paz na região.

Por resultados destes eventos mantem-se crescente pressão exercida por Washington, causando forte aumento de  tensão entre as dois polos nucleares, Estados Unidos e Europa por um lado, e Russia e China no outro. Este momento a política externa norte-americana evidencia o pathos da Manifest Destiny que perdura no âmago nacional, impondo a subordinação, tanto da Russia quanto da China, 

 

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