sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Justiça ou Coação?






Mais uma nova formulação jurídica é inaugurada no âmbito da política-externa Norte Americana. A Sra. Meng Wanzhou, Vice Presidente financeira da Huawey, destacada empresa chinesa na área eletrônica, está encarcerada em Vancouver pelas autoridades Canadenses desde 2018 a pedido de Washington.

Enfrenta a Huawey processo na Côrte americana, acusada de roubar patentes americanas e negociar "ilegalmente" com o Irã, este submetido à embargo pelos Estados Unidos. Pela lei americana, trata-se de crime, submetendo todo e qualquer "infrator" (seja qual for sua nacionalidade ou residência) que comercialize com a nação Persa à ira judicial norte-americana. 

Tal procedimento adotado por Washington contraria frontalmente a lei internacional, uma vez que o crime de negociar com a nação persa não encontram guarida nos estatutos e procedimentos das Nações Unidas, não tendo aquele organismo  aprovado tal embargo. 

Perdida sua liberdade e submetida à humilhação pública a Sra. Meng Wanzhou enfrenta nova etapa do processo contra ela dirigido. Acusada de obstruir a justiça, roubar segredos comerciais, e violar o embargo contra o Irã, o Ministério da Justiça norte-americano concedeu à Sra. Meng o "beneficio" de soltura mediante adiamento do processo e, assim, para que possa  retornar à China. Porém, tal concessão  tem por preço a confissão da Ré, reconhecendo ter cometido o crime que lhe é imputado!

Tal desdobramento evidencia surpreendente farsa jurídica, onde a liberdade sonegada é restituído pela condição de assunção de Culpa pelo pretenso Criminoso! Ora, tal procedimento evidencia a prática de  Crime de Coação pelas autoridade norte americanas. Por sua vez, a Ré, ilegalmente detida e despida de sua liberdade não terá alternativa senão reconquistá-la, mesmo ao preço de "confessar" crime não cometido!

Este episódio revela à que ponto a atual confrontação com o "império do Meio" vem toldando o bom senso e a imagem dos Estados Unidos. O "Soft Power", outrora um dos grandes trunfos da política internacional norte americana, se torna, progressivamente, em "Unreliable Power". Ele se volta não tão somente contra os seus inimigos, mas, conforme visto há pouco¹, também contra seu aliados.

Além da supremacia econômica e militar, os Estados Unidos manteve no passado uma imagem bondosa e justa ao dominar as comunicações e notícias internacionais através de pervasivas redes internacionais, suas aliadas, . Hoje, tal domínio se enfraquece e se esgarça, tanto pelo crescimento de outros polos de poder (chinês e russo) quanto pela multiplicidade e ubiquidade das redes sociais não subordinadas à Washington, assim provendo ao público maior diversidade de informação e opinião.

Washington, neste episódio, lembra o mal que traz a prepotência e o hubris. Estes, obnubilam o essencial equilíbrio que impeça a gestação de um mal maior. 

1) Vide o affair Aukus.

 

domingo, 19 de setembro de 2021

Retorno à Guerra Fria

                                                                    





Tirando um inesperado coelho da cartola, Biden revela ao mundo uma nova formula estratégica para os Estados Unidos, o auto-proclamado garantidor da segurança internacional apesar das inúmeras guerras de sua autoria. Neste novo quadro a prioridade  norte-americana passa da Europa para o Pacífico. O título de "maior hostis" passa da Rússia para China; o Urso russo é substituído pelo Dragão Chinês.

Com um simples "léger de main", um submarino nuclear, tal qual peça do xadrez antecipando movimentos futuros, altera o tabuleiro geopolítico, impondo aos jogadores urgente revisão de suas prioridades.

A implementação desta nova estratégia, embora tomada anteriormente, só agora foi divulgada aos parceiros. Assim, lícito dizer-se que houve um elemento não só de desrespeito protocolar aos aliados europeus como, também, gerou-se substancial e inesperada mudança na extensão das responsabilidades político-militares comuns até hoje existentes. Tal alteração impõe a estes aliados profunda revisão estratégica.  

A defasada divulgação da formação da Aukus revela uma nova aliança militar que se sobrepõe à aliança já existente e turva a relação entre os membros da OTAN e suas obrigações neste novo contexto. Confrontados os europeus com o novo e substancial desafio assumido pelos Estados Unidos, altera-se, de forma relevante, o equilíbrio na alocação de prioridades politico-militares, recursos monetários e bélicos aos demais componentes da OTAN, sobretudo no que toca aos Estados Unidos.

Hoje, os parceiros da OTAN se propõem, conforme seus termos, a socorrer militarmente qualquer de seus membros quando atacados. Estariam as nações europeias dispostas a participar de conflito militar com a China iniciado ou provocado por ações da Aukus? 

Confrontados com este novo tratado, os membros da OTAN  assumem indiretamente e sem sua anuência prévia,  um risco potencializado além dos limites politicos e militares do continente. Não mais se trata de participar em missões na Bosnia, no Iraque, no Afeganistão; mas, sim, correr o risco de confrontação com a China, hoje a segunda potência mundial. e seus eventuais aliados, vide  Rússia.

Hoje, a OTAN, após o retorno à  insularidade da Grã Bretanha,  tem na França e na Alemanha, seus  principais representantes europeus continentais. Face à atual indefinição política  Alemã devido às eleições iminentes, coube à Emanuel Macron demonstrar a preocupação da França e da Europa quanto à forma e a substância da decisão norte-americana.  A retirada de embaixadores indica o alto grau de repúdio, o qual não deveria ser desprezado pelas partes envolvidas.

Ainda mais relevante, à sombra destes recém celebrado tratado, se desenha um crescente perigo para a humanidade face à uma aliança militar que coloca o Ocidente contra a China. Os Estados Unidos, tanto no longínquo passado quanto no presente, já evidenciaram em diversas oportunidades quão pouco sabem prever as reações de adversários asiáticos. 

Nos idos do Século passado, Washington não soube estimar a reação do Japão após o bloquear seu acesso ao petróleo, desdenhando a reação nipônica. Ainda, subestimaram a reação da China quando da guerra da Coréia. Novamente, foram surpreendidos pela reação do Vietnam do Norte que lhes levou à derrota. Faz um mês concederam a vitória aos Talibãs após uma guerra de vinte anos.

E até onde irá a expansão desta recém criada aliança? Apesar de engendrada dentro dos limites dos "English speaking people", mais provável será que aliados potenciais como a India, o Japão e a Coréia do Sul sejam, no tempo, cooptados, assim ampliando a ameaça sobre a China bem como o risco de  reação armada. 

O "casus belli" ora sendo arquitetado pelos Estados Unidos carece de credibilidade. Esta hostilidade vinda de Washington não tem por base ameaças vindo de Pequim contra a integridade de outras nações, mas, sim, pela recusa, que se revela obsessiva, de aceitarem os Estados Unidos a expansão econômica de um estado soberano até hoje respeitador das "regras internacionais". 

A  prevalecer o que licitamente se pode definir como "histeria competitiva americana", o clima "beligerandi" progredirá gradativamente, acentuando a probabilidade de conflito armado de escala nunca vista.  

Prudente lembrar-se que esta nova aliança nasce sob o signo de um Submarino Nuclear.

P.S.  Vale lembrar o conflito infindável entre o Ocidente e a Ásia descrito no livro de George Orwell, 1984.

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Um novo Bolsonaro?




Seguindo um roteiro adrede planejado, Jair Bolsonaro testou a temperatura política e a encontrando propícia face as grandes manifestações de apoio no dia 7 do mês, lançou seu apelo: enquadrar o STF à sua vontade. Ou por bem, ou por mal. Como bom pupilo de seu mentor, Donald Trump, procurou desestabilizar o ordenado processo republicano. Atacou o cerne da Nação: a Justiça.   

E porque tal oposição ao magno tribunal? Porque será ele o único obstáculo intransponível em sua caminhada para o governo autoritário que o Capitão almeja. Contando com a cumplicidade do Centrão no Congresso, Jair pretende governar através de Medidas Provisórias engendradas nos gabinetes no Planalto. Parte do projeto, obtendo anuência de ambas as Casas, a custa de concessões do agrado de seus apoiadores, tanto na Câmara quanto no Senado, alcançaria o Presidente um regime de Fato totalitário, senão de Direito.  

Face a este pano de fundo, reforçado ainda, pelas grandes manifestações populares onde o conspurcado Verde e Amarelo revelava uma intensidade ideológica, lançou-se El Supremo, em fiel exemplo  encontradiço nas repúblicas bananeiras da América Central, nas águas turvas da imposição política. Expeliu um rosário de ameaças enquanto se declarava vítima. Ao final do dia sentia-se seguro, quase vitorioso; missão cumprida, Daí em diante o caminho se abria...     

Na sua diatribe não deu-se conta, Jair Bolsonaro, do obstáculo dentre os demais Poderes da República que se lhe antepunha. Tanto o Legislativo quanto o Judiciário reagiram à agressão. Tanto a Câmara sob  Lira,  seguindo a máxima que rege o Centrão, "bom malandro não chia.", quanto  o mais sóbrio Senado, sob Pacheco, exigiram respeito à Democracia e repúdio à violência tanto verbal quanto  implícita do Planalto. Já o Judiciário, alvo da agressão, mostrou suas garras. O Ministro Luiz Fux respondeu com vigor, fazendo antever o perigo de persistir o Presidente na direção até hoje delineada.

Ficam as Forças Armadas (leia-se Exército) em situação de extrema delicadeza, Seja qual direção tome, encontrará forte oposição, oque recomendará ao Alto Comando, um low profile. Porém, pode-se dar por certo que nas intimidades do poder militar agrava-se o debate político ideológico, quanto aos próximos passos. Ou melhor, qual o tom a tomar perante o público. 

Reeditando a história, onde um Cabo do exército mobilizou os apoiadores vestidos  de Suástica pretendendo tomar o poder na Alemanha, o Capitão Jair tentou imitá-lo.  A  expectativa do Capitão, aparentemente bem urdida, contando com o apoio de suas hostes fantasiadas de "Brasil", dos caminhoneiros e dos policiais infiltradas e disfarçadas, não tiveram por consequência o fator catalizador que seria o da violência. Assim esvaziou-se o conflito planejado, o pretexto necessário  para a tomada do poder... Faltou o detonador para a explosão planejada.

Já, hoje, o país tranquilizado pela neutralização do radicalismo, da paz política,  e confrontado com o fracasso de sua tentativa de ruptura constitucional, Bolsonaro "enfia a viola no saco" a espera de nova oportunidade. Promete que, doravante, será "bonzinho". 

Contudo, o custo ao Brasil deste 7 de setembro foi alto. Internamente reduziu-se a confiança do setor econômico de forma relevante no governo Bolsonaro. Os mercados internos, financeiro, bursátil e cambial, expressaram seu grande incômodo. No exterior, tanto no político quanto no econômico constata-se relevante desconforto. Até que ponto promessas de bom comportamento trarão a necessária confiança?

Torna-se essencial que se tenha razões para desconsiderar o que parece ser o perfil psicológico do líder da Nação. Para tal, tanto Bolsonaro quanto sua equipe e, ainda, os diversos "0"s que o cercam, terão que pautar seu comportamento dentro das "quatro linhas" do amplo interesse nacional e do diálogo civilizado.. Qual a probabilidade para que assim seja?  À ver...